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Classificação 1855 dos brancos de Bordeaux

A região Bordeaux é muito mais famosa pelos tintos, mas produz excelentes brancos

Grandes vinhos dividem território com bebida mais acessível - Divulgação

Semanas atrás conversei com você sobre a famosa classificação de 1855 dos vinhos de Bordeaux, sob a batuta de Napoleão III. Falei só dos tintos e fiquei devendo escrever sobre os brancos. Hoje concluo a tarefa. Bordeaux é muito mais famosa pelos tintos, embora também produza brancos secos de ótima qualidade. Mas isso é coisa mais recente. No século XIX, só se destacavam os brancos adocicados, por vezes conhecidos como “vinhos de sobremesa”.  Termo inadequado, leitor. Sim, geralmente é servido ao final de uma refeição, em lugar de vinhos fortificados, como o Porto e o Jerez. Mas é também considerada a melhor harmonização do foie gras, tantas vezes servido como entrada, ou canapé.

Por isso prefiro falar em vinho naturalmente adocicado (ou licoroso). Como isso acontece? Antes, vamos falar de geografia. Quarenta quilômetros ao sul da cidade de Bordeaux, rodeadas pelos vinhedos de Graves, se localizam as subregiões de Sauternes e Barsac. Cujas condições climáticas – um misto de alta umidade com boa exposição solar – na virada do verão para o outono, provocam o aparecimento do Botrytis cinerea, esporo fúngico que perfura a casca das uvas.

Que perde água, concentrando sabores e o açúcar. Esse bichinho faz um serviço completo, amigo. Ele também quebra os ácidos mais “duros”, preservando uma suave acidez que contrabalança o doce. O resultado é um vinho de sabor intenso, suculento, naturalmente adocicado e bem balanceado, elaborado com as uvas Sémillon e Sauvignon Blanc (raramente Muscadelle). Entre as celebridades da época que eram fãs do Sauternes, se destaca Thomas Jefferson. Que adquiriu algumas caixas do vinho para ele e George Washington. Esses ianques tinham bom gosto! O que será que Biden bebe hoje em dia, hein?

Mas voltemos a Sauternes e Barsac. Essa última frequentemente toma emprestado o nome mais famoso da vizinha. Mas legalmente, viu. Nada a ver com as trapaças jurídicas do Brasil de hoje. Eita, perdi o juízo! Quiçá, a liberdade. Pois bem, foram esses deliciosos vinhos brancos que foram incluídos na Classificação de 1855. No topo da lista, isolado, único Premier Cru Supérieur, o mítico Château d’Yquem. 

Abaixo dele, 11 Premiers Crus e 15 Deuxièmes Crus. Dos quais destaco Rieussec, Climens, Suduiraut, Guiraud, Doisy-Daëne, Coutet e Lafaurie-Peyraguey. Porém, dependendo da safra, outros produtores podem se equiparar ou suplantar essas marcas. Já que falei em safra, vale lembrar que esses são vinhos de excepcional longevidade. Podem permanecer vivos e ótimos em garrafas por décadas ou século. Diria até que o tempo os deixa ainda melhores. Ah, companheiro, como eu folgo em constatar que velhos podem suplantar os jovens! E para comemorar esse fato alvissareiro, com um bom Sauternes, tim, tim, brinde à vida.

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