Mendoza (3)
Hoje eu termino minha viagem pela província de Mendoza. Nosso último dia por lá foi dedicado a conhecer uma diferente região. Se você leu minhas colunas anteriores, sabe que passei dois dias visitando bodegas em Luján de Cuyo.
Faltava o outro grande destino vinífero mendocino: o Valle del Uco. Que fica a maior distância da cidade de Mendoza - nosso abrigo - com um acesso mais complexo. Quatro horas entre ida e volta nos fizeram optar por apenas uma vinícola (em vez de visitar duas, como nos outros dias). A escolha foi uma das bodegas do Clos de los Siete. Você já deve ter ouvido falar desse empreendimento, que empresta seu nome a um vinho bem conhecido no Brasil. Que nasceu da ideia de um dos mais famosos enólogos do mundo, o francês Michel Rolland. Tão bom quanto controverso.
Se você assistiu ao filme Mondovino - se não viu, veja! - sabe do que estou falando. Mas deixa a controvérsia pra lá. Voltemos ao projeto de Rolland. Que ao conhecer a Argentina em 1988, enxergou um “terroir” ideal para elaborar um grande vinho. Aqui entre nós, a despeito das inegáveis qualidades geográficas, de solo e de clima, penso que ele ponderou também o baixo custo das terras argentinas, comparado a Europa e Estados Unidos.
Rolland associou-se a seu amigo e vinhateiro em Pomerol, Jean-Michel Arcaute, para adquir uma planície no Valle del Uco. Em princípio, os vastos 850 hectares, a 1.100 metros de altitude e aos pés da Cordilheira dos Andes, em um de seus trechos mais altos, foram divididos em sete parcelas - por isso Clos de los Siete.
Os outros cinco investidores logo apareceram, mas apenas quatro vinícolas foram implantadas: Cuvelier de los Andes, Bodegas Rolland, DiamAndes e Monteviejo. Essa última foi a nossa escolhida. A estrutura impressiona pela modernidade e pela imponência.
O conjunto arquitetônico, incorporado às terras planas, aqui e ali cravejadas por grandes pedras pré-históricas e emolduradas pela bela cordilheira, compõe um cenário de sonho. Após visita à área de produção e armazenamento, partimos para a melhor parte do programa: a degustação. Provamos um Torrontés, um Malbec e um blend da linha Petite Fleur.
Depois veio um Lindaflor blend. Foi quando chegou a hora do almoço, servido em uma linda mesa de madeira. Brindados pela vista estonteante dos Andes e por outros vinhos de linhas mais altas da Monteviejo (Octava e Página 1), comemos a típica e boa comida argentina. Leitor, você quer saber o que achei dos vinhos, não é?
Enfatizando que todos são muito conceituados pela crítica, gostei do conjunto da obra. Mas existe um porém. Trabalhados com muita madeira, são feitos para amadurecer em garrafa e devem ser guardados por alguns anos antes do consumo. O que nem sempre é compatível com a oferta do mercado. Triste realidade, onde só encontramos garrafas de safras recentes. Concluo essa série mendocina lhe estimulando a fazer uma visita à região. Valeu muito a pena. Tim, tim, brinde à vida. E à... Opa, ao Papa Francisco!
EM DESTAQUE
Vinhas da princesa
É o nome que estampa a garrafa do Quinta Maria Izabel Vinhas Velhas. Charmoso, né? Vinho há tão pouco lançado no mercado e já elogiado pelos consumidores e pela crítica. Entre eles o Dirceu Vianna Junior, único brasileiro titulado com o Master of Wine, radicado em Londres, que colocou o branco dessa linha da QMI no rol “das escolhas do mestre”. Uma distinção que nos deixa orgulhosos desse produto português com sangue pernambucano.
*É médico e enólogo. Escreve quinzenalmente neste espaço.