Sempre tive medo de dragão
Os efeitos da inflação rondam o mundo dos vinhos
Desde criancinha. Aquela história de São Jorge contra o dragão, que cuspia fogo, me aterrorizou durante toda a infância (acho que todos nós, não é companheiro?). Passei um pedaço dela olhando a lua à procura da imagem dessa luta, cuja lenda conta que teria ocorrido na Turquia, nos primórdios da era cristã. Para salvamento de uma princesa, a ser engolida pelo dragão. Lembrando, jovem leitor, que na nossa infância os psicólogos não propalavam que histórias atemorizantes deixavam traumas. No máximo, algumas noites sem sono. Saudade desse tempo sem trololó. Bem, lorotas a parte, no meu caso deixou um trauma: certamente é por isso que me assombro tanto com inflação!
Mudei de residência recentemente. Sou um incorrigível guardador de pequenas (só pequenas?) lembranças. Para desespero de minha mulher e meus filhos. Certamente estressados que ficam ao vislumbrar a enorme e difícil tarefa de descartar todo esse “entulho”, após minha partida final. Pensando nisso, aproveitei a mudança para tentar enxugar minha memória física (nunca gostei de dar trabalho; mesmo no post-mortem). Reencontrei coisas fantásticas! Com mais calma, um dia lhe conto. Mas hoje, nesse breve texto, vou falar de uma publicação, encarte do Le Figaro, jornal francês. O “Guide du Vin” era uma bela revista - disse era pois, com aquele gabarito, acredito que só persista em mídia digital - contendo ótimos artigos sobre vinho. Claro, tinha propagandas também. Nessa arrumação me deparei com uma edição de junho de 2004. A parte os textos cativantes, chamou particularmente minha atenção as ofertas de algumas lojas. Dispensável dizer, de lojas francesas, com valores em Euro. Para meu desgosto, constatei que os preços do mercado atual subiram, no mínimo, três vezes em comparação com aquela época. Mesmo com toda alegada escassez financeira pós-pandêmica! Se considerarmos que o câmbio Euro-Real subiu descontroladamente nesse tempo... Vôtes! Acho que vou me converter ao absenteísmo! Ou ao cafezinho. Mas até esse, quando bom, está caro. Talvez, em breve só nos reste água. De chuva!
Pois é, amigo, quando a maturidade tinha deixado a lenda do dragão cuspindo fogo pra trás, eis que volta a antiga assombração. Pior, o danado parece só gostar de princesa e não dar a mínima para vinhos. Cadê tu, São Jorge? Tim, tim, brinde à vida.