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Vinhos míticos: Solaia

Murilo Guimarães - Alfeu Tavares/Folha de Pernambuco

Dias atrás resolvi fazer um “estrago” na minha adega. Afinal, com a filha morando fora e o filho muito atarefado com os eventos de fim de semana de meus netos - será que eu vou sofrer policiamento ideológico por esse comentário, leitor? - é muito difícil reunir toda a família. Ainda que esse “toda” sejam só sete pessoas. Assim, diante de uma rara oportunidade, não foi difícil decidir por esse saboroso “estrago”. Tomamos excelentes vinhos, quase todos garimpados em viagem ao exterior, que compra-los no Brasil, com seus elevadíssimos impostos, é tarefa pra os Joesley da vida. E seu “rebanho”, claro! Entre as garrafas, uma se destacava por seu prestígio e até relativa raridade: o Solaia safra 2000. Que motivou esse artigo da minha série “vinhos míticos”, tema meio abandonado, visto que constatei ter escrito o último em novembro de 2015.

A família Antinori é uma das mais antigas produtoras de vinho da Itália, desde que Giovanni di Piero Antinori se incorporou à Arte Fiorentina dei Vinatierri, em 1385. São 26 gerações da família a frente dos negócios, sempre respeitando as tradições locais, mas também inovando, como a criação, em 1904, da variedade CLASSICO do Chianti. O Chianti, cuja versão original, uma Denominação de Origem Controlada (DOC), há muito tempo é produzido em área definida da Toscana. Com seu atual corte - Sangiovese 70%, Canaiolo 15% e Malvasia bianca 15% - tendo sido estabelecido em meados do século XIX pelo Barão Ricasoli. Célebre nome italiano que não deve lhe soar estranho. O emprego da uva Sangiovese sempre foi localmente mandatório. Porém, nos idos de 1940, Mario Incisa della Rochetta, por se encantar com os tintos de Bordeaux, plantou cepas de Cabernet Sauvignon (Cab S) na sua Tenuta San Guido, em Bolgheri, na costa toscana. Dessa casta elaborando vinho para consumo exclusivo de sua família. Duas décadas depois, em 1968, já com adição de 15% de Cabernet Franc (Cab F), Mario atendeu sugestão de seus sobrinhos Ludovico e Piero Antinori - olhe eles aí de novo - e comercializou esse tinto com o nome de Sassicaia. Rotulado como um vino da tavola (vinho de mesa), pois, ao utilizar cepas francesas em vez da Sangiovese, não poderia ser DOC. Coisas de regulação que se obedece (lá na Europa, né?). Foi um estrondoso sucesso. Ultrapassando fronteiras. De tal forma que hoje é uma DOC própria. Não demorou muito e o Marchesi Antinori seguiu o exemplo, usando Cab S e Cab F misturados à Sangiovese. Lançaram o Tignanello (1970) e depois o Solaia (1978), que foram os primeiros assim denominados vinhos supertoscanos. Produzido a partir de uvas plantadas em vinhedos de maior altitude, com privilegiada exposição solar, de onde pega emprestado seu nome, o Solaia, nas primeiras duas safras, era um corte de Cab S (80%) e Cab F (20%). Imitando mesmo o Sassicaia! Mas logo foi agregado Sangiovese (20%), mantendo-se o predomínio do Cab S (75%), com uma pequena proporção de Cab F (5%). Demonstrando que fórmulas de sucesso devem ser repensadas e aperfeiçoadas, amigo. Ele passa 18 a 24 meses envelhecendo em barris de carvalho e depois mais um ano na garrafa. O resultado é um tinto robusto, elegante e austero. Concluo lhe fazendo inveja, leitor. A garrafa de Solaia que bebi estava deliciosa. Mas quer saber? O mais gostoso mesmo foi a infrequente reunião familiar. A ela, o meu tim, tim, brinde à vida.

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