Arthur Lira: um aliado que pode dar trabalho ao Governo Bolsonaro
Um aliado do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), mas que cobrará um preço alto e, quando preciso, fará jogo duro para tomar as rédeas da agenda do governo e beneficiar o Centrão. Esse é um resumo de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados eleito na última segunda-feira, na opinião de cientistas políticos ouvidos pela Folha de Pernambuco. “Tudo vai ter que ser na base da barganha. O tão criticado ‘toma lá, da cá’ voltou com força agora”, afirma o cientista político e professor da Universidade Católica de Pernambuco, Antônio Lucena.
A reformatação da Mesa Diretora da Casa já é um recado nesse sentido, e ocorreu mediante a anulação da última decisão do ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em torno da composição do comando do parlamento. “Tudo vai depender de como os partidos estão dispostos a barganhar com Lira. Deu pra deixar bem claro que ele é uma versão turbinada de Eduardo Cunha, se vai ter o mesmo poder, ainda não sabemos”.
Lucena considera que as ações de Lira servem como exemplo de como o Centrão age. “Bolsonaro ganhou, mas ao mesmo tempo perdeu. O Centrão vai querer cargos, ministérios. A tendência é de Lira se reunir primeiro com aliados para tomar as decisões e depois ir ao Planalto e a outros partidos. Esse movimento é essencial para manter a sua fortaleza de negociação. Na prática, podemos dizer que seremos governados pelo Centrão. E como o governo Bolsonaro está bastante vulnerável, apostou fichas nisso”, sublinha.
Na balança de prós e contras, o governo ganha em articulação política, na opinião de Priscila Lapa, cientista política e professora da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda. “A articulação tende a fluir melhor pela postura de Arthur Lira de negociar com o governo e também pelo ‘colchão de amortecimento’ que o Centrão representa hoje, dando maior chance de aprovação às propostas de Bolsonaro”, avalia.
Para tirar proveito desse caminho pavimentado, porém, é necessário que o governo tenha uma agenda assertiva, capaz de ser emplacada no Parlamento, isso em um momento agravado por crises sanitária e econômica. “Ter apoio no Congresso sem uma agenda bem construída não adianta. Nos dois primeiros anos de Bolsonaro faltou agenda e articulação. Agora a articulação melhorou, mas e a agenda? Há uma pressão muito maior da opinião pública por respostas e soluções. Quem provou da política do auxílio emergencial, por exemplo, não quer perder, quem foi beneficiado agora se sente prejudicado e reverter isso não é simples, ainda mais quando há teto de gastos e déficit público”, enfatiza Priscila.
Agendas conflitantes
A relação do Governo Bolsonaro com Lira já apresenta alguns desafios claros. Um deles é conciliar a pauta econômica defendida pelo ministro Paulo Guedes, com privatizações de grandes estatais e a reforma administrativa. “Para acomodar indicações do Centrão, o governo precisa dispor de empresas estatais, autarquias, fundações, agências, tudo que pode ser usado como moeda de troca para ter esse apoio”, resume o cientista político e professor da Faculdade Damas, Élton Gomes.
Ele frisa que o presidente, enquanto “líder de uma aliança heterogênea de partidos” e “deputados com interesses locais” precisa dispor de cargos públicos de indicação, portanto, “enxugar muito a máquina pública não seria interessante”. Élton, no entanto, crê que pode haver uma articulação para que haja ao menos a desestatização de algo simbólico, a exemplo dos Correios, para que “Bolsonaro não ‘perca’ o ministro Paulo Guedes, que dá lastro ao seu governo”.