Bolsonaro e Marçal: troca de alfinetadas revela disputa por espaço na direita
Para cientista, principal preocupação de Bolsonaro é a ameaça que Marçal representa à sua liderança
As trocas de farpas públicas entre o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o candidato a prefeito de São Paulo Pablo Marçal (PRTB) revelam um cenário turbulento e multifacetado na direita brasileira.
De acordo com Elton Gomes, cientista político e professor na Universidade Federal do Piauí, o confronto entre esses dois personagens não é apenas uma questão de carisma ou estratégia eleitoral, mas reflete uma série de dinâmicas internas e externas que moldam o futuro político do país.
“Bolsonaro teme, e é razoável que tema, como todo líder carismático, perder espaço na direita”, explica.
Para o cientista, a ascensão de Marçal, embora ainda não equiparada à de Bolsonaro em termos de influência nacional, indica uma insatisfação crescente com a liderança bolsonarista, especialmente no contexto de São Paulo.
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A ascensão de Pablo Marçal e a insatisfação
Para Gomes, Pablo Marçal tem se destacado por sua habilidade em adaptar seu discurso e engajar eleitores por meio das redes sociais.
“Não que Marçal seja um arquétipo do conservadorismo, longe disso, mas ele é muito habilidoso em moldar o seu discurso à percepção do público em geral. Ele usa essa estratégia de segmentação das redes sociais para poder criar um discurso com muita capacidade de reverberação”, observa Gomes.
Essa capacidade de "furar bolhas" e atrair eleitores de diferentes segmentos reflete uma insatisfação com o status quo bolsonarista, exacerbada pela escolha de candidatos mais centristas, como Ricardo Nunes, em detrimento de figuras mais alinhadas com a direita conservadora, como o ex-ministro Ricardo Salles.
Desconfiança mútua e repressão a novas lideranças
Gomes destaca que Marçal já deu várias declarações que podem servir como críticas ao ex-presidente, o que alimenta essa desconfiança.
Além disso, o bolsonarismo, como outros movimentos populistas, tende a reprimir lideranças fora de seu núcleo para evitar a ascensão de rivais.
“Em movimentos populistas, personalistas, guiados pela figura do líder carismático, é natural que você procure podar qualquer liderança que possa vir a eclipsar a figura do Messias político”, ressalta Gomes.
A dificuldade de renovação de quadros na direita é um problema persistente. Gomes observa que a falta de novos rostos e novas vozes pode levar a uma estagnação da política, onde as velhas práticas e alianças tendem a prevalecer.
O bolsonarismo, com sua forte centralização em torno de Bolsonaro, tem mostrado resistência a novas lideranças que não estejam alinhadas com seu núcleo, limitando a capacidade do movimento de se adaptar às novas demandas do eleitorado.
A política tradicional e o bolsonarismo
A necessidade de Bolsonaro de conciliar seus interesses com a política tradicional é evidente em sua escolha de apoiar Ricardo Nunes em vez de um candidato mais alinhado ideologicamente como Ricardo Salles.
“Bolsonaro, ao se normalizar na política brasileira, teve que conciliar seus interesses com a política tradicional, exemplificado no seu apoio a Ricardo Nunes”, explica.
Para o professor, essa estratégia reflete um pragmatismo necessário para manter relevância política e apoio em um sistema de presidencialismo de coalizão, mas também gera tensões internas dentro do movimento.
O futuro da direita brasileira
O futuro da direita brasileira pode seguir dois caminhos principais. O primeiro é a ascensão de um novo líder, como Pablo Marçal, que, embora tenha mostrado um desempenho notável, ainda não é uma ameaça concreta à liderança de Bolsonaro.
“Marçal tem um bom prognóstico na política brasileira,” afirma Gomes, destacando que ele ainda precisa consolidar sua posição em nível nacional.
O segundo caminho é uma transição mais suave, com Bolsonaro endossando um sucessor. Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, é visto como o herdeiro natural. Gomes sugere que “a figura com mais probabilidade de alcançar a condição de sucessor oficial seria Tarcísio de Freitas,” especialmente se Bolsonaro decidir apoiar um candidato para manter a coesão da direita.