Câmara do Recife aprova projeto de lei que proíbe uso de linguagem neutra em escolas
Projeto foi aprovado em primeira discussão e vai retornar ao plenário da Casa na próxima semana
A Câmara de Vereadores do Recife aprovou, por 15 votos a 13, projeto de lei que proíbe o uso de linguagem neutra nas escolas da rede municipal da Capital. O resultado ainda contou com três abstenções e uma ausência. A matéria foi aprovada em primeira votação e deve ir para segunda análise na próxima semana. A iniciativa é de autoria do vereador Fred Ferreira (PSC). Como se trara de um projeto antigo, não passou pela Comissão de Legislação e Justiça.
Em seu discurso antes da votação, o vereador Samuel Salazar (MDB), líder do governo, disse que não concorda com a linguagem neutra, mas advertiu que o projeto de lei de Fred Ferreira não está claro e abre brechas para interpretações errôneas. Segundo Salazar, em nenhum momento o documento diz que é proibido lecionar sobre a linguagem neutra, mas proíbe, por exemplo, as pessoa de falarem errado.
“Da forma como está posto, esse projeto é inconstitucional, porque proíbe as pessoas de falarem e não simplesmente, o que acredito que é intensão de vossa excelência, que é não ser lecionado (a linguagem neutra) nas escolas municipais”, reclamou Salazar. Ainda segundo o vereador emedebista, pelo projeto de lei, se, por ventura, um aluno, no recreio, usar a linguagem neutra ao se referir ao colega, a escola pode, inclusive, ser penalizada e perder o alvará.
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Em sua fala, também antes da votação, Ferreira disse que a língua portuguesa deve sofrer modificações ao longo do tempo, mas isso não pode ser imposto por uma minoria. Para ele, no Brasil, só 1% da população “quer isso (uso da linguagem neutra), que são os não-binários”.
“Através de pesquisa, a gente sabe que mais de 96% da nossa população não quer essa linguagem neutra. O país está votando para que não entre a linguagem neutra no nosso Brasil. Não é só aqui”, lembrou. O vereador ainda acrescento que não está levando a discussão para o lado político ou religioso. “Só quero levar para o lado de proteger as nossas crianças”, justificou.
O vereador Ivan Moraes (PSOL) disse que a intenção do projeto de lei de Ferreira não tem nada a ver com gramática, com linguística. "Nós estamos discutindo esse projeto hoje porque existe um grupo político no nosso País que insiste em forçar uma discussão que é inócua, que não faz o menor sentido, sobre a qual não temos competência. Não temos como dizer como cada pessoa vai se expressar no país que a gente vive. Nossa língua se expressa de formas muito diversas", alertou.
Moraes, então, tentou mostrar a fragilidade e ineficiência do projeto, centrando-se no discurso de Ferreira. "O carinho pela língua portuguesa não é o forte do autor da proposição. Em cinco minutos defendendo o projeto ele disse 'públicos presente'. Depois o problema não foi nem de português, quando ele juntou 96% com 1% e aparentemente deu 100%. Se 96% é a favor e 1% é contra, fico imaginando onde ficam os outros 3%. Depois, ele ousa dizer que é um legislador de lei. Não conheço legislador de outra coisa que não seja de lei. A palavra legis quer dizer lei", ironizou.
Para Ivan Moraes, o projeto de lei se equivoca já na sua origem. "Ele não fala de currículo escolar, até porque não temos competência para inferir sobre o currículo escolar. Ele diz que nas escolas não se pode falar de determinada forma. Imagino o que vai ser depois. As pessoas não vão poder usar mais gírias, não vão poder falar de maneira informal? Isso me preocupa", acrescentou.
A vereadora Aline Mariano (PP) disse que querer proibir, por exemplo, o uso do termo todes é cercear a liberdade de quem quer falar. "Agora, incluir todes nas regras gramaticais é uma discussão ampla e é aí aonde eu quero chegar. É uma discussão que cabe ao MEC, aos linguistas, aos professores de português, à comunidade LGBTQIA+ e especialmente ao Congresso Nacional. Não temos competência para legislar sobre essa matéria". afirmou.
A vereadora disse que a imprensa iria divulgar quem votou contra e a favor de um projeto que não existe. "Esse projeto já nasce morto. Era para ter sido barrado na Comissão de Legislação e Justiça, não foi, é regimental, passou o prazo. Hoje, nós votaremos uma matéria que nada adiantaria, porque se votarmos pela proibição e o MEC, junto com o Congresso Nacional, decidir pela mudança da llíngua, não adianta a gente barrar aqui. A Câmara do Recife pode ser ridicularizada por algo que estamos votando e que não existe na prática", alertou.
O vereador afirmuo que a intensão do projeto, o que faz ele existir, é equivocado, porque propõe amarras à língua portuguesa e por isso não tem sentido. “Esse projeto é inconstitucional, ele não tem nenhuma forma de se constitucionalizar, porque não tem objeto que seja digno da competência dessa Casa", finalizou. Ela chegou a fazer um apelo a Fred Ferreira para que ele retirasse o projeto. "Esse projeto é inócuo, que não deveriamos estar perdendo tempo com tantos problemas que a cidade do Recife tem", afirmou.