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Jair Bolsonaro tenta conquistar o Nordeste

Apesar do negacionismo relacionado aos efeitos da pandemia e dos mais de 110 mil mortos pela Covid-19 no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) surfa no seu patamar mais alto de popularidade já aferido no País. No Nordeste, segundo pesquisa Datafolha realizada neste mês, sua rejeição caiu dos 52% registrados no final de junho para 35% em agosto. Aproveitando o patamar elevado, o presidente tem acumulado viagens à região. Em menos de um mês, visitou a Bahia, o Sergipe e, ontem, esteve no Rio Grande do Norte para entrega de habitacionais e dessalinizadores, em dois municípios potiguares. Tudo isso ocorre em um ano de eleições municipais, apesar de o presidente sequer ter um partido e já ter declarado que vai se manter distante do pleito. 

No entendimento da professora e cientista política da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda (Facho), Priscila Lapa, o cenário positivo para Bolsonaro no Nordeste vem no rastro de uma "conjuntura favorável propiciada por dois fatores". "Quando os problemas de acesso ao auxílio emergencial passaram a ser resolvidos, de junho para cá, coincidiu com o momento de reabertura da economia, quando o dinheiro volta a circular e as pessoas passam a se sentir mais esperançosas de novo. Há entusiasmo na conjuntura, que causa impacto positivo na avaliação", interpreta Priscila. 

Ela, entretanto, é cautelosa em relação à manutenção do pico de popularidade. "A pesquisa reflete o momento e, como é a primeira vez que ele atingiu uma popularidade alta, temos que analisar os elementos desse contexto", pontua. O professor e cientista político da Faculdade Damas, Elton Gomes, corrobora. "Pesquisa é fotografia, é análise política contextual. Após implementar o auxílio emergencial, ele percebe efeitos positivos de popularidade e benefícios políticos e eleitorais que podem vir a partir disso", opina Elton, acrescentando que o retorno positivo do Nordeste para Bolsonaro passa ainda pela melhora na sua relação com o Legislativo, sobretudo com os deputados federais da Região "conseguido por meio da negociação de verbas, cargos e emendas". 

Priscila frisa que o apoio adquirida por meio do "populismo" de Bolsonaro que constrói "discursos com aquilo que as pessoas querem ouvir" pode trazer a ele de volta a vertente de líder carismático, que estava em baixa, além de compensar um apoio que vem perdendo de um segmento que dava respaldo ao seu governo até agora. "No tecido empresarial, nas classes mais altas, há muitas desconfiança no governo, uma preocupação com o teto de gastos e com o discurso de austeridade fiscal que se perdeu".

Lula

Élton destaca que, com o auxílio emergencial, Bolsonaro faz algo similar com o que Lula fez com o Bolsa Família. "Lula juntou diversos benefícios criados pelo governo FHC, como o Vale Gás e o Bolsa Escola, aumentou o valor e trouxe o Bolsa Família. O auxílio emergencial também faz isso, injetando R$ 50 bilhões por mês na economia, valor equivalente a um ano de Bolsa Família. Ele elevou a renda média das pessoas mais pobres enormemente", destaca.

Para que chegue ao patamar de aderência social do auge do governo Lula, entretanto, Bolsonaro precisa de muito mais, na avaliação de Priscila Lapa. "A robustez social de Lula foi construída ao longo de dois mandatos inteiros e é fato que o dinheiro (do auxílio emergencial) vai acabar, ainda que o programa seja mantido, não será o mesmo valor, o entusiasmo das pessoas tende a passar. É preciso entender que a conta econômica da pandemia ainda não foi sentida. A conjuntura internacional não é favorável e a onda de recessão ainda vai chegar aqui com muita força. É muito precipitada a comparação com Lula, o Brasil, hoje, está muito distante de viver uma prosperidade econômica", afirma.

O próprio Lula comentou sobre o assunto em entrevista ao jornalista Edmar Lyra, na última quarta. "Foi um conjunto de políticas públicas que nós fizemos. E tudo isso gerou uma melhoria na qualidade de vida das pessoas. Lógico que eu acho que se Bolsonaro quiser dar R$ 300, R$ 400, R$ 500 é bom, mas é preciso que não seja só isso. É preciso que seja um conjunto de outras coisas", disse o ex-presidente.

Impacto nas urnas

A saída "da agenda liberal para a agenda de investimento público" fez o governo assimilar possíveis benefícios eleitorais, enfatiza Élton. Ele crê que a popularidade do presidente deve prosseguir em alta até as eleições municipais e pode ter algum impacto nas urnas, sobretudo nas capitais e grandes municípios.

É apostando na influência de Bolsonaro, que, em Pernambuco, pré-candidatos tentam se associar ao presidente e apostam em seu nome como principal cabo eleitoral. Na corrida pela Prefeitura do Recife, por exemplo, os deputados estaduais Alberto Feitosa (PSC) e Marco Aurélio (PRTB) disputam para serem reconhecidos como "o candidato de Bolsonaro."

"Se eu tiver o apoio de Bolsonaro eu sou o prefeito do Recife", garante Marco Aurélio. Para ele, "várias pessoas que não votaram em Bolsonaro na eleição", hoje o escolheriam nas urnas. "(A popularidade) é fruto do trabalho dele. O povo está começando a entender que o presidente está desenvolvendo o País, está tentando resolver os problemas", complementa.

Já Feitosa, reforça que ele é o candidato que mais se identifica com Bolsonaro e que, "sobretudo agora com esse crescimento que ele está tendo a nível nacional e no Nordeste" o seu apoio é fundamental vencer o pleito na Capital.  "Acho que o candidato que tiver a identificação como eu tenho ao presidente Bolsonaro estará no segundo turno. E vamos ganhar as eleições. Nós vamos para o segundo turno e vamos ganhar as eleições", analisa.

Outro exemplo vem de Petrolina, no Sertão do Estado, base do líder do Governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (DEM), e do seu grupo político, do qual faz parte o prefeito da cidade e seu filho, Miguel Coelho (DEM). O alinhamento com o Planalto e os investimentos destinados à Região pelo Governo Federal podem atrair mais votos dos eleitores ligados ao presidente.

No entanto, Elton Gomes ressalta que "no chamado Brasil profundo, há pouca influência nacional. Lá, os senhores locais, prefeitos e deputados da região, que controlam a dinâmica."

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