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Acordos de leniência e empresas

Contratações públicas devem ser meio de concreção dos direitos fundamentais dos cidadãos

Por Felipe de Moraes Andrade*

Em discussão pelo Governo Federal, através de proposta ventilada na imprensa pelo Ministro da Casa Civil a possibilidade de pagamento parcelas de acordos de leniência firmados com base na Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013) através da realização de obras públicas.

Empresas sancionadas pelo Poder Público em razão de atos de corrupção autodeclarados poderão ser responsáveis pela realização de novas obras públicas em todo o País através da redução do pagamento de parcelas dos acordos firmados.

Nos termos do acordo de leniência firmado pela ODEBRECHT com o MPF , a pessoa jurídica se comprometeu a pagar o valor global de R$ 3.828.000.000,00 (três bilhões e oitocentos e vinte e oito milhões de reais) para arcar com prejuízo de ilegalidades no âmbito das jurisdições brasileira, estadunidense e suíça. 

Assim sendo, o acordo de leniência possibilita que a pessoa jurídica, colaborando com as investigações e processos administrativos, tenham minoradas as punições aplicáveis em razão de prática de atos de corrupção. Destarte, o valor do acordo gigantesco formulado pode representar apenas 2/3 do valor das multas que deveriam ser aplicadas, tendo em vista o previsto no art. 16, §6, da Lei Anticorrupção, destacando a aplicação da multa decorreu de danos vultosos ao erário.

Curiosamente, após a definição das bases legais do acordo, surge a acusação espetacularização judicial das investigações à época da formalização do acordo para devolução de recursos à União Federal. Desta feita, pretendem as pessoas jurídicas sancionadas rediscutir os termos dos acordos firmados.

No contexto da Lei Federal nº 14.133/2021, Nova Lei de Licitações e Contratos, o objetivo da realização de um processo licitatório: assegurar a seleção da proposta apta a gerar a contratação com resultado mais vantajoso para Administração Pública; assegurar tratamento isonômico entre os licitantes; evitar contratações com sobrepreço ou com preços manifestamente inexequíveis e superfaturamento na execaução contratual; e, por fim, incentivar a inovação e o desenvolvimento nacional sustentável.

Entendemos que permitir a realização de obras públicas, sem observância do devido processo legal licitatório, para atender a interesses patrimoniais de pessoas jurídicas empresariais não é o caminho para evitar a repetição dos mesmos erros que impactaram negativamente no setor de infraestrutura no Brasil nas últimas décadas.

Além de violar a isonomia, tendo em vista que obras serão realizadas de forma direta, sem a realização do adequado planejamento e controle das condições previstas para execução. Como podemos garantir um ambiente competitivo para as empresas de engenharia, se teremos empresas executando obras apenas por terem sido penalizadas anteriormente? Não devemos olvidar que ao transigir sobre os valores das multas haverá renúncia de receita pública, que poderia garantir contratações mais eficientes e probas para coletividade.

Adotar o regime cogitado pelo Governo Federal é premiar o erro, bem como excepcionar o regime administrativo de penalização previsto pela Lei Anticorrupção para prestigiar o interesse privado, em detrimento do interesse público. Contratações públicas devem ser efetuadas não como moeda de troca de punição, mas sim como meio de concreção dos direitos fundamentais dos cidadãos.

*Felipe de Moraes Andrade é advogado e consultor jurídico em licitações e contratos

*A Folha de Pernambuco não se responsabiliza pelo conteúdo das colunas.  

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