Logo Folha de Pernambuco

Lutero e Pernambuco – Jubileu 500 Reforma Protestante

Martin Lutero (1483-1546) “pregou” as 95 teses na porta da igreja do castelo de Wittenberg - Reprodução/Internet

Quando Martin Lutero (1483-1546) “pregou” as 95 teses na porta da igreja do castelo de Wittenberg, não imaginava a “revolução” que estaria iniciando em diversas áreas do conhecimento humano, com grandes reverberações e rupturas além no campo teológico, em todo o mundo.

Traduzindo a Bíblia para sua língua nativa, o alemão, criou uma disrupção única, até então, no desenvolvimento e disseminação de um pensamento crítico e contraditório. Com este movimento disruptivo possibilitou o acesso à informação para todos e não mais apenas para alguns. Até hoje, fruto de diversos estudos, o impacto causado por Lutero quebrou barreiras, liberando as artes – pintura, música, inclusive compondo mais de trinte e sete hinos, entre eles a música e letra do famoso “Castelo Forte” (Ein feste Burg ist unser Gott), composto em 1529, sendo o texto baseado no Salmo 46: "Deus é nosso refúgio e fortaleza...". Heinrich Heine referiu-se a esse hino como a "Marselhesa" da Reforma Protestante. A influencia deste hino pode ser notada quando Johann Sebastian Bach utilizou sua melodia como tema da Cantata BWV 80 e Felix Mendelssohn-Bartholdy empregou-a no último movimento da sua 5ª sinfonia (Sinfonia da Reforma).

Afinal, qual terá sido a influência da Reforma no desenvolvimento de Pernambuco e do Brasil, de suas instituições e da economia? Como o legado da reforma celebrada este ano, pelo Jubileu de 500 anos, influenciou diretamente Pernambuco? Como isto poderia ser útil para o presente e futuro?

Enquanto os Estados Unidos se formaram no espírito da Reforma Protestante, o Brasil – e com ele toda a América Latina – formou-se, em grande parte no espírito da Contra-Reforma.

A Companhia de Jesus, dentro do contexto da Contra-Reforma, tornou-se a principal ordem religiosa que se encarregou de disseminar as conclusões do Concílio de Trento (1545 a 1563), que fundamentou a reação da Igreja. E foi com esse espírito que os jesuítas trazidos ao Brasil por Martim Afonso de Sousa, em 1531, e chefiados por Manoel da Nóbrega se atiraram à catequização dos indígenas. Mas, praticamente, não obtiveram nenhum sucesso nas tentativas de erradicar duas práticas dos indígenas que os horrorizaram: a antropofagia e a naturalidade com que praticavam o sexo gay.

E foi essa última característica que levou os portugueses a chamar os índios brasileiros de bugres. O termo provém da designação dada à heresia que prosperou no século 13, na região depois conhecida como Bulgária. E foi assim que os portugueses passaram a chamar os índios de “búlgaros”, termo que, por corruptela, derivou para “bugres”. Tachá-los de hereges serviu de justificativa para preá-los e escravizá-los. (Sobre o assunto bugre, ler Gilberto Freyre, em Casa Grande e Senzala, cap 2.)

Jacques Barzun observa que a Contra-Reforma produziu alguma reforma na Igreja, mas ao mesmo tempo, contribuiu para enrijecer seu controle. Foi a responsável, também, pela disseminação da Inquisição no Brasil nos séculos 16 e 17, que prevaleceu sobretudo na Bahia e em Pernambuco, muito mais com objetivo de reprimir “cristãos novos” (judeus) do que para combater os protestantes, ainda raros no Brasil.

“A Reforma eliminou a suntuosidade das igrejas e do culto e aboliu as imagens dos santos. A Igreja respondeu com o oposto e ajudou a propagar o barroco. O barroco mineiro, nas suas três principais manifestações (arquitetura, escultura e música), foi um dos mais importantes movimentos culturais propiciados pela Contra-Reforma.

Aleijadinho e a exuberante composição de música sacra em Minas são consequência disso. E aí, paradoxalmente, um dos compositores europeus que mais influenciaram a música brasileira, tanto a barroca quanto certos gêneros posteriores, foi Johann Sebastian Bach, um luterano. Não foram apenas as bachianas de Villa-Lobos que saíram daí, mas também o chorinho”. Celso Ming - economista

Como podemos ver, a influência da Reforma tem diversos desdobramentos importantes e significativos para Pernambuco, pois muito antes da colonização oficial de alemães protestantes, que vieram sob a benção de PII se estabelecendo nos estados do sul, Pernambuco sentiria os ventos da reforma sob o “domínio Holandês” nas mãos do Conde João Maurício de Nassau-Siegen, este de origem alemã e protestante.
A história do Brasil holandês seria completamente diferente sem a presença de Nassau que chegou ao Brasil em 1637, contratado pela Companhia das Índia Ocidentais para administrar as províncias brasileiras sob dominação holandesa.

Durante os sete anos que governou o Nordeste (1637-1644), Nassau através de sua “visão Protestante e humanista”, conseguiu organizar, disciplinar a população, criar um ambiente único de liberdade religiosa (algo até então inexistente nas Américas), defender e ampliar os territórios conquistados e, principalmente, garantir e ampliar a produção e a comercialização do açúcar, que era o principal objetivo.

Bia Correa do Lago diz: “Entre os membros de sua comitiva, trouxe os artistas Frans Post, Albert Eckout e os cientistas Willem Piso e George Marcgraf com o intuito de registrar e pesquisar a natureza exuberante do Novo Mundo”. O trabalho desta comitiva de artistas e cientistas resultou em uma grande e importante quantidade de mapas, livros e quadros apresentando e retratando pela primeira vez e de forma ímpar: Pernambuco e o Brasil.

Leia também:
Iperid– Make(de) in Pernambuco!
De Pernambuco para mundo e vice-versa


Inúmeras frentes e pontes de estudo e diálogo poderiam ser construídas com este grandioso legado nas diversas áreas do conhecimento, inclusive fortalecendo as pontes e relações com países como Alemanha, Holanda, Inglaterra entre outros.
O “legado protestante” de Nassau foi base importante para o MOU – Memorando de Entendimento em economia criativa, assinado pelo ex-governador Eduardo Campos, com o Governo de Brandenbrugo, na Alemanha, em encontro realizado no castelo de Oranienburg. Castelo este que tem mobiliário feito em Pernambuco e quadros de Frans Post retratando Recife/Olinda.

Ao longo de 2018, em diversos países e comunidades, inclusive de maioria católica, organizaram celebrações, seminários e estudos lembrando os 500 anos da reforma Protestante, como na Eslovênia, onde o reformador Primoz Trubar, pioneiro protestante, é lembrado e celebrado até hoje por ter escrito os primeiros livros na língua eslovena: o Catecismo e Abecedário, fundamentais para a criação da unidade e identidade do povo esloveno.

Na Alemanha, temos o exemplo do médico e humanista Gregorius Mättig (1585-1650) sobrinho de Caspar Peucer, também médico. Caspar Peucer casou-se com uma das filhas do humanista e teólogo reformador Phillip Melanchton, amigo pessoal de Martin Lutero.

Por este “legado protestante”, a Fundação Gregorius Mättig, www.maettig-stiftung.de registrada em seu testamento, teve o seu início após a sua morte em 30 de março de 1650. Hoje, sua história ultrapassa 350 anos e é considerada uma das mais antigas Fundações históricas da Alemanha.

Voltando a Pernambuco, durante o período holandês, pessoas vindas das mais diferentes partes do mundo transferiram-se para Pernambuco: mercenários, predicantes, comerciantes e os funcionários da Companhia das Índias Ocidentais. No governo de Nassau (1637-1644) tivemos, pela primeira vez, a experiência de um “Estado” com tolerância religiosa.
Não tenho o objetivo de tratar de todos os aspectos e desdobramentos possíveis da Reforma Protestante em Pernambuco mas deixar um desafio para a academia, para que seja melhor e mais estudada em aspectos não teológicos puramente, mas a influência que este importante movimento teve para nós pernambucanos e brasileiros.

A pouca influência protestante no Brasil impediu, durante muito tempo, o florescimento do empreendedorismo. Chegou por aqui, cerca de cem anos depois, o que empresários ingleses e americanos produziram nas terras deles: a Revolução Industrial, segundo o economista Celso Ming.

 Empresário há 35 anos, Rainier Michael tem ampla experiência em trocas internacionais. O trabalho realizado por ele junto ao consulado esloveno, e designado “Diplomacia Econômica”, interpreta sob uma visão humana o desenvolvimento e o crescimento do Nordeste. Paulista de nascença, Michael se mudou para Pernambuco há dez anos, quando seus negócios no Estado cresceram de forma a tornar indispensável sua presença aqui. Seu comparecimento nos mercados pernambucanos, entretanto, é mais antigo do que isso. Antes de assumir o consulado, já era representante da Sociedade Brasil-Alemanha no Nordeste. É destacável, também, sua atuação enquanto presidente do Rotary Club Recife.

A Folha de Pernambuco não se responsabiliza pelo conteúdo das colunas.

Veja também

Clube Português disputa Final Four da Liga Nacional de Handebol
Handebol

Clube Português disputa Final Four da Liga Nacional de Handebol

TERRA TRANSPORTE E PARTICIPAÇÕES S.A. - Ata AGE

TERRA TRANSPORTE E PARTICIPAÇÕES S.A. - Ata AGE

Newsletter