Dependência tecnológica e saúde mental
Sair de casa e no meio do caminho constatar que esqueceu o telefone celular … Ansiedade, desespero, o que você sente ? Essa sensação não necessariamente significa dependência tecnológica , mas reflete o impacto profundo da tecnologia em nossas vidas.
A dependência tecnológica é um fenômeno crescente na sociedade moderna diante do papel central que a tecnologia tem em inúmeras atividades cotidianas, facilitando a comunicação, aumentando a produtividade e permitindo o acesso a uma vasta quantidade de informações. Aplicativos de conversa, como WhatsApp, Telegram e e-mail, por exemplo, tornaram-se ferramentas indispensáveis para o trabalho, ajudando na troca rápida de informações e na realização de reuniões a distância, além de possibilitarem o trabalho remoto e colaborativo. Esse lado positivo da tecnologia trouxe, sem dúvidas, melhorias consideráveis para a eficiência e flexibilidade no trabalho.
Entretanto, ao mesmo tempo que a tecnologia facilita e impulsiona a vida profissional e pessoal, ela também gera desafios relacionados à dependência. A dependência tecnológica, definida como o uso excessivo e compulsivo de dispositivos digitais e aplicativos, surgiu em parte pelo acesso constante e quase ilimitado que temos a esses recursos. A disponibilidade de tecnologia 24 horas por dia nos torna vulneráveis ao uso excessivo, promovendo hábitos como a checagem constante de notificações, o medo de “perder” alguma atualização (o que chamamos de FOMO, “Fear of Missing Out”) e a sensação de estarmos sempre conectados.
Existem várias formas de dependência tecnológica, incluindo a adição a redes sociais, a necessidade constante de ver notificações e atualizações, e o uso excessivo de jogos e entretenimento online. Essa dependência pode levar a uma série de impactos na saúde mental. Pesquisas indicam que o uso excessivo de dispositivos digitais está relacionado a altos níveis de estresse, ansiedade, insônia e até depressão. Isso ocorre, em parte, porque a conexão constante pode gerar um estado de hiperalerta e dificultar o relaxamento. A necessidade de estar “sempre presente” em plataformas digitais, especialmente no contexto de trabalho remoto, pode gerar um desequilíbrio entre vida profissional e pessoal, resultando em esgotamento e fadiga mental.
Assim, embora a dependência tecnológica e seus impactos na saúde mental sejam questões recentes, já exigem atenção do sistema de saúde. Para que essas pessoas sejam adequadamente atendidas, é necessário que o sistema de saúde, incluindo o SUS e os planos de saúde, esteja preparado para reconhecer e tratar esses novos transtornos. Isso demanda uma adaptação tanto em termos de profissionais capacitados quanto de recursos específicos para atender às necessidades dessa população.
Atualmente, os tratamentos disponíveis para a dependência tecnológica envolvem principalmente abordagens psicológicas e terapias comportamentais. A terapia cognitivo-comportamental (TCC), por exemplo, é uma das mais eficazes para auxiliar na modificação de hábitos, ajudando a pessoa a reconhecer os gatilhos que levam ao uso excessivo da tecnologia e a desenvolver estratégias para reduzir esse uso. Além disso, há a possibilidade de terapias em grupo, programas de desintoxicação digital e práticas de mindfulness, que ajudam a pessoa a lidar melhor com a ansiedade e a compulsão em relação à tecnologia.
A preparação do SUS para atender a essa demanda ainda está em desenvolvimento. A rede pública de saúde oferece serviços de atenção psicossocial, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que podem ajudar no atendimento de casos mais graves, mas nem sempre estão capacitados especificamente para questões de dependência digital. A capacitação de profissionais para lidar com esse novo tipo de dependência e o desenvolvimento de programas de saúde mental voltados ao uso de tecnologia são passos importantes.
Já nos planos de saúde privados, observa-se uma maior oferta de apoio psicológico e psiquiátrico, mas ainda são poucos os que oferecem tratamentos especializados para dependência digital. Muitos planos cobrem consultas com psicólogos e psiquiatras, mas seria ideal que investissem em programas específicos de prevenção e tratamento dessa dependência. Para que o atendimento seja realmente efetivo, é necessário que haja conscientização e protocolos específicos para o diagnóstico e manejo da dependência tecnológica.
Diante desse cenário, é essencial que tanto o sistema público quanto o privado estejam atentos a esse fenômeno, adaptando-se para atender essa nova demanda. Com a integração de tratamentos específicos e a capacitação de profissionais, será possível lidar de forma mais eficaz com os impactos da dependência tecnológica na saúde mental e oferecer um suporte adequado para quem sofre com esse transtorno.
Dessa forma, embora a tecnologia traga inegáveis benefícios, o desafio é usá-la de maneira equilibrada. Promover a conscientização sobre o uso saudável da tecnologia, adotar práticas de “desconexão”, estabelecer limites para o uso de dispositivos e valorizar momentos offline são medidas que podem ajudar a preservar a saúde mental. Assim, o equilíbrio entre aproveitar as facilidades que a tecnologia proporciona e manter-se consciente de seus efeitos psicológicos é fundamental para que a tecnologia continue sendo uma aliada, e não uma fonte de problemas.
Desconectar-se é tão essencial quanto estar conectado; é nesse equilíbrio que encontramos saúde, bem-estar e verdadeira qualidade de vida.