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Baião de Dois, o hino do Nordeste

Luiz Gonzaga - Arte/Folha de Pernambuco

Semana passada celebramos os 70 anos de Asa Branca, gravada em 3 de março de 1947. Letra do advogado cearense Humberto Teixeira, e música do sanfoneiro pernambucano Luiz Gonzaga - maior nome da música nordestina. Ele é conhecido por muitos nomes - Rei do Baião, Velho Lua, Bico de Aço, Gonzagão. Um homem que viveu sem nunca esquecer sua terra, em um compromisso que se via no seu jeito de vestir, de falar e, mesmo, no rosto curtido pelo sol.

“Minha vida é andar por esse país” com um jeito de tocar que inventou e, depois, virou moda - com sanfona, triângulo e zabumba. “Pra ver se um dia descanso feliz”. E tanto fez que acabou inscrevendo o Nordeste no mapa do mundo. Nas músicas, falava de seus pais - Januário (dos 8 baixos) e Santana. De seus amores - Nazarena, Odaleia (mãe de Gonzaquinha, que não era seu filho biológico) e Helena (com quem viveu até morrer). De sua terra - “Quando oiei a terra ardendo/ Qual a fogueira de São João/ Eu perguntei a Deus do Céu, ai/ Porque tamanha judiação”. Dos seus pássaros - sabiá, assum-preto, rolinha, acauã, carimbamba, vim-vim, carão. Além, claro, de Asa branca - que deu nome à música que se tornou hino. O hino do Nordeste.

Presentes, em sua vida, sempre estiveram também os sabores. “Gonzaga adorava comer”, escreveu Dominique Dreyfus (em Vida de Viajante: a Saga de Luis Gonzaga). Gostava de “ceia nordestina (canjica, cuscuz, pamonha, tapioca, bode, charque). Das comidas dos mercados públicos (baião de dois, cozido, paçoca de carne de sol, rabada). Mas seu prato preferido, por estranho que pareça, era macarronada - segundo testemunho de José Mario Austregésilo (em Luiz Gonzaga - o homem, sua terra e sua luta).

Talvez por isso esses pratos estejam presentes em tantos de seus sucessos. Como, por exemplo, em Feijão com côve (Carnaval de 1947): “Ai seu generá,/ feijão com côve que talento pode dar?/ Cadê a banha pra panela refogá?/ Cadê açúcar pro café açucará?/ Cadê o lombo, cadê carne de jabá?/ Que sem comida ninguém pode trabaiá”. Ou Baião de Dois (também parceria com Humberto Teixeira): “Capitão que moda é essa, deixe a tripa e a cuié/ Home não vai na cozinha, que é lugá só de mulé/ Vô juntá feijão de corda, numa panela de arroz/ Capitão vai já pra sala, que hoje tem baião de dois/ Ai, ai ai, ó baião que bom tu sois/ Se o baião é bom sozinho, que dirá baião de dois”.

Também Eu Vou Pro Crato (1963, parceria com José Jataí): “Eu vou pro Crato/ Comer arroz com pequi/ Feijão com rapadura/ Farinha do Cariri”. Mas escolho, para prestar homenagem a esse gênio, Linforme instravagante - onde ele imagina uma roupa, para colocar na noite de São João, feita só com comidas típicas da região.

Mandei fazer um liforme,
como toda a preparação
para botar no arraiá
na noite de São João

Chapéu de arroz doce
forrado com tapioca
As fitas de alfinim
e as fivelas de paçoca
a camisa de nata
e os botões de pipoca

A ceroula de soro
e as calça de coalhada
o cinturão de manteiga
e o buquê de carne assada
sapato de pirão
e a zenfilhon de cocada

As meias de angu
presilhas de amendoim
charuto de biscoito
e os anelões de bolim
os óculos de ovos fritos
e as luvas de toucin

O colete de banana
e a gravata de tripa
o paletó de ensopado
e o lenço de canjica
carteira de pamonha
e a bengala de lingüiça

Vai ser um grande sucesso
no baile da prefeitura
a pulseira de queijo
e o relógio de rapadura
quem tem um liforme deste
pode contar em fartura

RECEITA>

Baião de Dois

Ingredientes

3 dentes de alho picados
50g de manteiga de garrafa
½ kg de arroz
1 litro de caldo de galinha
2 folhas de louro
100g de toucinho defumado
½ kg de feijão fradinho cozido e escorrido
100g de linguiça defumada
100g de charque cozida e desfiada
100g de queijo de coalho cortado em cubos
1 cebola roxa picada
½ pimentão verde picado
2 tomates picados
Coentro e cebolinho picados
Sal a gosto

Preparo:

· Em uma panela, refogue o alho na manteiga de garrafa. Junte o arroz e mexa bem. Acrescente o caldo fervendo, o louro, e deixe cozinhar até que o arroz esteja no ponto. Reserve

· Em outra panela, frite o toucinho e, quando começar a dourar, junte os grãos de feijão, a linguiça, a charque e o queijo de coalho. Mexa e junte a cebola, o pimentão, os tomates e o coentro. Coloque arroz e misture delicadamente

· Coloque sal (se necessário), manteiga de garrafa, coentro, cebolinho, e sirva logo

* É especialista em Gastronomia. Escreve toda semana neste espaço.

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