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Costume de celebrar namorados vem da mais remota antiguidade

Lecticia Cavalcanti - Cortesia

 

Segunda-feira próxima, comemoraremos o Dia dos Namorados. E esse costume, de celebrar o sentimento mágico que une duas pessoas, vem da mais remota antiguidade. Na Roma antiga, todos os anos, em 15 de fevereiro (XV Kalendae Martius, ou seja, quinze dias antes do primeiro dia de março), ocorria a Lupercália - um festival de pastores na gruta de Lupercal, no monte Palatino (uma das sete colinas de Roma). A festa era homenagem a Juno, esposa de Júpiter, deusa da fertilidade e do casamento. Sempre em volta de mesa farta, com alimentos que, segundo eles, “estimulasse o amor” - aipo, azeite, azeitona, leite, mel, nozes, óleos vegetais, ostras, peixes, vísceras e vinho. Na véspera desse dia, pedaços de papel com o nome das moças da região eram colocados em uma grande caixa. Cada rapaz retirava um nome, que passava a ser sua namorada, durante o festival. Ou para sempre, “o coração tem razões que a própria razão desconhece”, disse Baise Palcal (em Pensées), sendo a frase aproveitada em marchinha imortalizada por Orlando Silva (Aos pés da cruz). Passa o tempo e esse ritual profano, como tantos outros, acabou incorporado à tradição cristã; com o Papa Gelásio I, o “Pai dos Pobres”, sagrando 14 de fevereiro como dia de São Valentim.

Certo é que ficou a dúvida sobre qual dos santos homenageava, neste dia. Para alguns tratava-se de um padre que desafiou as ordens do imperador romano Marco Aurélio Valério Claudio (Claudio II, 214 a 270). É que esse imperador, por entender que rapazes solteiros (e sem família), seriam melhores soldados, proibiu casamentos em seu império. Só que Valentim ignorou essas ordens e continuou a fazer casamentos, em segredo, de jovens que lhe procuravam; sendo então preso e executado, em 14 de fevereiro (por volta do ano de 270). Acontece que existiu um outro padre, igualmente Valentim, que viveu na mesma época, também preso pelo mesmo imperador. Por se rebelar contra a imposição ao culto do deus Sol. Segundo a lenda, acabou se apaixonando, na prisão, pela filha cega de um dos carcereiros, que milagrosamente voltou a enxergar. Podendo ler, ela própria, bilhete que o futuro santo lhe deixou, antes de ser executado, assinado “do seu Valentim”. Seja como for, 14 de fevereiro passou a ser celebrado, em todo o mundo, como “Valentine’s Day”. E, nele, se celebra o dia dos namorados. É assim até hoje. Shakespeare (1564-1616), em uma fala de Ofélia (em Hamlet), se refere a esse dia: “Tomorrow is Saint Valentine’s Day”.

Ao Brasil, a celebração chegou bem mais tarde. Em 1949. Quando os proprietários da loja de departamento Clipper (no Largo Santa Cecília, 39), em São Paulo, pediram ao publicitário João Dória (pai do atual prefeito de São Paulo) para imaginar uma campanha que aquecesse as vendas durante o mês de junho - um dos menos lucrativos para o comércio. O publicitário, inspirado no Dia de São Valentim, apresentou então a ideia de celebrar por aqui um “Dia dos Namorados”. Como data escolheu 12 de junho, véspera de Santo Antônio - um santo que é de Lisboa (onde nasceu) e de Pádua (onde morreu). Dado, segundo a tradição, ser um santo casamenteiro. “Santo Antônio, Santo Antoninho, arranja-me um maridinho”, diz antigo pregão popular do além-mar.

O publicitário colocou em frente a loja uma grande faixa “Não é só com beijos que se prova o amor”. A data demorou até que fosse aceita. Mas acabou dando certo. Tanto que é hoje a terceira data mais importante para o comércio - depois do Natal e do Dia das Mães. Seja como for, com ou sem apelo comercial, segunda próxima vamos celebrar esse dia. Eu também vou. Com José Paulo, meu namorado há 50 anos. Com refeição preparada com muito carinho, com pratos leves e bem escolhidos, em uma mesa bem posta. E a coluna de hoje, diferentemente do habitual, vai ter duas receitas. Uma tradicional, que segue mais abaixo, “Coração de chocolate’. Outra, são versos (“Soneto 11”) de Luís Vaz de Camões.

Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente:
É dor que desatina sem doer;

É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder;
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

* Especialista em Gastronomia. Escreve toda semana neste espaço.

 

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