Logo Folha de Pernambuco

Faca, colher e garfo

Faca, colher e garfo - Editoria de Arte

Primeiro nasceu a faca - do árabe “farha”. Ela e um machado rústico são os mais antigos objetos feitos pelas mãos do homem. No início, essas facas eram apenas lascas de pedra com bordas afiadas. Em seguida, evoluíram para lâminas de bronze e ferro; e, a partir de 1921, aço inoxidável. Ganharam cabos também, em uma das extremidades da lâmina - para serem, nos campos de batalha, mais fáceis de manusear. Essas primeiras facas funcionavam apenas como ferramenta ou instrumento de matar. Só bem depois começaram a ter serventia nas mesas. Pedaços de carne ou outros alimentos eram espetados nessas facas e levados à boca. A ponta mudou só quando o Cardeal Richelieu (1585-1642) se irritou por ter o chanceler Pierre Séguier (1588-1672) usado uma para palitar os dentes; razão pela qual mandou arredondar todo o seu estoque de facas, logo sendo imitado pela nobreza. Sem contar que, por essa época, já não eram mesmo necessárias essas pontas, por já exercerem os garfos a função de prender os alimentos.

Depois veio a colher - do grego “kokhliárion”. O homem primitivo usava conchas de moluscos para mexer os alimentos, durante sua preparação. Ou para servi-los à mesa. Assim nasceram os primeiros ancestrais das colheres de hoje. Mais tarde, passaram a ser fabricadas com osso, pedra e madeira. Há registro delas em mesas egípcias, 7.000 anos atrás. Os romanos usavam colheres para caldos, ovos e guisados. Aos poucos foram se sofisticando, no material e na forma. Maiores para a sopa, menores para a sobremesa. Os ingleses ainda inventaram a “mote spoon” - uma bem pequena, de prata, usada apenas para pescar folhas de chá no fundo da xícara. Vindo só mais recentemente as de café. Câmara Cascudo (“História da Alimentação no Brasil”) descreve esses utensílios quase como um jogo de sedução: “Na hierarquia do talher, a faca é presença agressiva; enquanto a colher, para o povo, é a mão com os dedos unidos, assegurando a concavidade receptora e natural”.

Por fim o garfo, do árabe “gárfa” - que significa punhado; ou do latim “graphium” - instrumento usado pelos romanos para escrever em tábuas. Assim escreveu Camilo Castelo Branco: “Os garfos primitivos foram de ferro, de uma só ponta, à semelhança de ponteiros em estilos com que se escrevia nas tábuas enceradas”. Os primeiros garfos surgiram em Veneza, no séc. XI, com Theodora - que veio de Bizâncio para casar com o Doge Domenico Salvo. Mas não fizeram então muito sucesso, sobretudo por conta da Igreja. São Pedro Damião (1007-1072) chegou a proibir terminantemente seu uso. João Boaventura (1218-1274) - filósofo, cardeal, doutor seráfico e depois Santo, a considerava “castigo de Deus” um “objeto do pecado”. O historiador francês Fernand Braudel cita pregador medieval alemão que condenava esse “luxo do diabo”, sob alegação de que Deus não teria dado dedos ao homem se quisesse que ele usasse “tal instrumento”. Sua popularidade começou verdadeiramente na França, ao tempo de Catarina de Médici. No início, tinha dois dentes apenas. Depois foi ganhando, aqui e ali, mais um - por funcionar melhor, no ajuntamento de alimentos. Até que finalmente, no reinado de Fernando IV da Sicília, passou a ter o formato definitivo de 4 dentes - graças a Germano Spadaccinni, seu “despenseiro real”. Faltando só dizer que facas e garfos especiais para peixe vieram ainda mais tarde, com a revolução industrial. E chegaram ao Brasil bem depois, razão pela qual não faziam parte dos requintados faqueiros da época do Império.

Por tudo, então, apenas no século XVIII se formou o talher - juntando faca, colher e garfo. Eram considerados objetos de uso pessoal. Cada convidado trazia o seu próprio estojo, com talheres simples ou trabalhados - dependendo, claro, do bolso de cada um. Em todo canto. Menos na China, que desde 1200 a.C. usava uns pauzinhos - segundo “Alimentação na Cultura Chinesa”, de K.C. Chang, diretor do departamento de Antropologia da Universidade de Harvard. “Não tocam com a mão o que comem, usam umas tenazes de prata ou de pau, para meter, mui à miúde, a comida na boca” - a cena é descrita no “Livro de Duarte Barbosa” (1517). Ainda hoje é assim. Mas só nas residências. Sendo cada vez mais frequente ver talheres, nos restaurantes de Beijin e outras cidades grandes, a globalização rasgando velhas tradições.

RECEITA: BOLO DE COLHER
INGREDIENTES:
4 colheres de sopa de leite
4 colheres de sopa de chocolate em pó
4 colheres de sopa de açúcar
4 colheres de sopa de trigo
3 colheres de sopa de óleo
2 ovos
1 colher de café de fermento
PREPARO:
· Misture ovos, leite, chocolate, açúcar, trigo, óleo e, só então, o fermento. Coloque a massa em tigela de porcelana individual e asse no forno. Sirva quente, com uma bola de sorvete de creme.

*É especialista em Gastronomia e escreve toda semana neste espaço



Veja também

Céu ou inferno: 37ª rodada pode deixar Sport na vice-liderança ou sem chances de acesso
Futebol

Céu ou inferno: 37ª rodada pode deixar Sport na vice-liderança ou sem chances de acesso

Mike Tyson dá tapa na cara de Jake Paul, que responde: "É pessoal agora. Ele deve morrer"
LUTA

Mike Tyson dá tapa na cara de Jake Paul, que responde: "É pessoal agora. Ele deve morrer"

Newsletter