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O brownie de Nicolás Maduro e o brioche de Maria Antonieta

Lecticia Cavalcanti - Cortesia

 

Nicolás Maduro mandou pren­der mais quatro padeiros. O país se acabando e o presidente da Venezuela gastando seu tempo na perseguição de modestos padeiros, pelo crime de fazer brownies - um delicioso bolinho de chocolate. A desculpa dada é que “violaram a ordem de usar farinha apenas para fazer pão”, segundo o jornal Público (18 de março), de Portugal. Achando pouco, já começou a “expropriar padarias, em uma verdadeira guerra do pão”. O Superintendente para Defesa dos Direitos Socioeconômicos, William Contreras, informa que os estabelecimentos deverão passar às mãos de Comitês Locais de Abastecimento e Produção (CLAP). Formados para distribuir alimentos em zonas populares. Em troca de votos, claro.

Só para lembrar, brownie é um “bolo tradicional da América do Norte”, segundo o Larousse Gastronomique. Vai ver foi isso. Brownies são perigosos por serem americanos. Um perigo para o bolivarianismo. E ele veio mesmo de lá. Embora sem registros seguros de quando surgiu, de quem o criou, e de por que recebeu esse estranho nome - brownie. Para uns, teria vin­do de um biscoito de melaço registrado (em 1896) por Fannie Merritt, no seu Cooking-school cook book. Curioso é que, na edição seguinte do livro (1906), a autora já dá receita diferente. Semelhante ao brownie como o conhecemos hoje.

Difícil, para manter essa versão, é que já havia sido servido bolo muito parecido (com calda açucarada de damasco e nozes) bem antes disso, em Chicago, durante a feira mundial Columbia Exposition (em 1893), por ocasião da celebração dos 400 anos da descoberta do Novo Mundo. Para outros, surgiu ainda mais tarde. Ao tempo da Primeira Grande Guerra.

E, por fim, John Mariani atribui essa invenção a uma dona de casa de Bangor (Maine) - que teria simplesmente esquecido de acrescentar fermento à mistura (em The Encyclopaedia of American food and drink). Depois, mesmo percebendo não haver ela crescido, a retirou do forno, cortou em quadradinhos e serviu. Só então se vendo que acabou sendo uma maravilha. Seja como tenha sido, a popularidade foi imediata. Por ser fácil de preparar e por ser econômico. Com ingredientes (apenas cinco) que qualquer pessoa tem em ca­sa - açúcar, chocolate, farinha, mantei­ga e ovos. Aos poucos, a receita foi se sofisticando com o acréscimo de novos ingredientes - café, casta­nha, frutas secas, nozes, mais licor ou uísque. Para Randi Danforth, “trata-se de uma receita que não deu certo” (em The United States - a culinary descovery). E parece mes­mo. Como se o bolo não tivesse terminado de assar. Por ser muito mole por dentro e não crescer (consequência de não levar fermento).

Com relação ao próprio nome, a confusão é também grande. Teria vindo de sua cor escura, brown (mar­rom) - por levar, na massa, muito chocolate. Ou seria homenagem a Mildred Brown Schrumpf, que tinha o apelido de Brownie, e que sempre o lembrava em sua coluna semanal no Bangor Daily News. Ou, ainda, deveria esse nome a Palmer Cox - que publicou, em 1887, o livro The brownies, their book. Brownies, nesse último caso, seria não o bolo; mas homenzinhos (bem pequenos mesmo) conhecidos como brownies que, juntos, resolviam qualquer dificuldade. E tanto sucesso fez o livro, entre crianças, que as agências de publicidade aproveitaram e batizaram vários produtos com esse nome. De brinquedos a uma câmera fotográfica da Kodak. Sem contar doces e biscoitos de chocolate da empresa Sears, Roebuck and Company.

Voltando a Maduro, esse episódio lembra Maria Antonieta (1755-1793). Durante uma grave crise em Paris, onde faltava tudo aos pobres (como agora na Venezuela), sobretudo pão, ela sugeriu que comessem brioche (um pãozinho de origem francesa feito com muita manteiga e ovo). Não foi uma boa ideia. Que logo veio a Revolução Francesa (em 1789). E Maria Antonieta acabou na guilhotina. Para sorte de Maduro, um instrumento já em desuso. Esse risco, ao menos, ele não corre. Boa sorte a todos. Para venezuelanos e leitores do Caderno Sabores. Com pão ou com brownie, uma feliz Páscoa.

* Escreve toda semana neste espaço.

 

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