Sabedoria dos provérbios populares (2ª parte)
Alguns provérbios populares têm forte influência dos locais de onde vêm. Faz sentido, sobretudo, para aqueles que têm os códigos para compreender seu significado. Ocorre que, a outros, muitas vezes simplesmente parecerão incompreensíveis. À força de repetições, continuam a ser ditos fora de seu contexto. Segue relação de alguns deles:
“Da ostra sai a pérola”. Só lembrar que, por aqui nunca se encontrará pérolas em ostras. Nem as naturais (de melhor qualidade e mais caras), encontradas em Sri Lanka, Austrália e Golfo Pérsico. Nem as cultivadas, produzidas sobretudo no Japão – entre elas Akaya Gai, South Seas, Mabe, Blister, Barroca. Que as espécies brasileiras – encontradas no litoral de Santa Catarina, no litoral sul de São Paulo e nos mangues do Nordeste – jamais produziram uma única pérola.
“Dar uma canja” – Nada tem a ver com galinhas. E remonta aos anos 60, no Clube dos Amigos do Jazz – conhecido pela sigla CAMJA. Lá os instrumentos eram deixados à disposição dos frequentadores do clube, que se aventuravam em improvisos. Assim, “dar uma canja” é tocar de improviso, sem planejamento, de graça.
“Macaco velho não mete a mão em cumbuca” – A origem do provérbio vem da África. Lá, para apanhar macacos vivos (destinados à zoológicos ou circo), usa-se colocar pedaços de açúcar em uma cumbuca (cabaça), presa por cordas a uma árvore. Na cabaça faz-se um pequeno orifício, suficiente apenas para passar uma mão (de macaco) aberta. O macaco, sentindo cheiro do açúcar, põe a mão na cumbuca, pega o tablete, mas quando puxa ela já não passa pelo pequeno buraco. Por não renunciar ao açúcar, não abre a mão. E é preso, em seguida.
“Não confunda alhos com bugalhos” – Bugalho é saliência arredondada que se forma em algumas árvores – carvalhos, sobreiros, azinheiras. Nele as vespas depositam seus ovos. Em Portugal, crianças usam esses bugalhos como bolas de gude. Parecidos nos nomes, alhos e bugalhos são muito diferentes na forma.
“O boi é que sobe, o carro é que geme” – Esse carro que geme é o “de boi”, surgido no Brasil com os primeiros engenhos de açúcar. Para transportar cana, açúcar, lenha e gente. São, ainda hoje, feitos com madeiras forte – pau d’arco, aroeira, sucupira, carnaubeira; e formados por duas rodas, uma grade e um eixo. A grade se apoia sobre o eixo. O ponto de apoio são duas peças chamadas cocão. Rudimentares, quase nunca usam graxa ou óleo. Sendo o gemido (ou cantiga) do carro de boi produzido pelo atrito do cocão, sobre o eixo.
“O caso eu conto como o caso foi, porque homem é homem e boi é boi” – Foi na primeira parte desse provérbio que se inspirou o grande pernambucano Paulo Cavalcanti, para dar título a seu mais conhecido livro.
“Quem não trabuca, não manduca” – Trabucar é trabalhar. E manducare, em latim, é comer com as mãos – num tempo em que não se usava talher. Traduzindo, quem não trabalha não come.
“Quem tem boca vai a Roma” – A frase, com o tempo, foi trocando de sentido. Que primeiro, essa boca se referia a “comer” – quando, no tempo do Império Romano, Roma era centro gastronômico. Lá estavam as melhores e mais requintadas iguarias. E os melhores cozinheiros. Aos poucos, passou essa boca a referir apenas pessoas que conseguem tudo com uma boa conversa.
(Continua daqui a quinze dias, no próximo artigo)