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"A UPE está mais que homenageando pessoas. Está se posicionando sobre o país", diz filha de um ex-preso político

Patrícia Pessoa é filha do engenheiro civil Enildo Galvão que ensinou na antiga Fesp e foi torturado durante a ditadura

Enildo Galvão Pessoa, entre a filha Patrícia e a mulher Graciete, foi perseguido pela ditadura e será homenageado pela UPE - Foto: Acervo de família

"Além de honrar tudo o que ele fez, a homenagem da Universidade de Pernambuco serve para relembrar às pessoas e ao país tudo o que aconteceu e tudo o que está acontecendo no Brasil ", registra a médica Patrícia Pessoa, filha do engenheiro civil Enildo Galvão Carneiro Pessoa, ex-professor da UPE

Preso e torturado durante 106 dias na antiga casa de detenção, hoje a Casa da Cultura do Recife, Enildo Pessoa está entre as 12 pessoas que estiveram vinculadas à instituição e tiveram seus direitos violados durante a ditadura militar brasileira (1964-1985). A solenidade será nesta segunda-feira (25), a partir das 9h, no Auditório Clélio Lemos da Faculdade de Administração e Direito da UPE, na Madalena, bairro da Zona Oeste do Recife.

O evento marca os 59 anos da unidade de ensino e estava programado antes de a Polícia Federal anunciar ter descoberto nova tentativa de golpe no Brasil, orquestrada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e que culminaria na morte por envenenamento do presidente que havia sido reeleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), e o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes.

"Tenho certeza de que ele ficaria muito feliz ao saber que a universidade que ele tanto amou está se posicionando e sendo um exemplo para o país. Esse ato não é só homenagear os que lutaram pela democracia. É algo muito maior do que homenagear pessoas. É um posicionamento em relação ao momento que o país atravessa e que tanta gente se pergunta o que pode estar acontecendo. A universidade faz isso no momento ideal", exalta.

Patrícia Pessoa é pernambucana, mas mora em Campinas, interior de São Paulo, cidade para onde a família fugiu depois que o pai saiu da prisão, em 1964. Pouco tempo depois a avó paterna morreu no Recife, mas Enildo Galvão não veio para o enterro porque o cemitério estava cercado de militares querendo prendê-lo. Patrícia está de volta ao Recife agora para participar do evento da UPE.

"Os militares expulsaram meu pai do Recife, mas o Recife nunca saiu do coração dele", conta, lembrando que o pai levantava ainda de madrugada para ler e fazia isso ouvindo marchinhas de Carnaval. "Não foi fácil. A gente acordava quase todas as noites, com o papai tendo pesadelo e gritando, provavelmente ele teve um transtorno pós-traumático", afirma a doutora em saúde mental pela Faculdade de Medicina da Unicamp. 

Também não é fácil participar de uma solenidade como a desta segunda-feira (25). "É uma honra, mas traz à memória várias coisas difíceis pelas quais a gente passou, um monte de coisa que a gente não apaga e que foi muito dolorida. Foi um terror para a família, foi um terror para ele. Alguns tiveram de sacrificar sua vida", destaca.

Ainda assim, a filha de Enildo e a esposa, Graciete Pessoa, hoje com 104 anos, lúcida, e também morando em Campinas, consideram que tudo tenha valido a pena. "Ele nunca baixou a guarda em relação a lutar contra a desigualdade social e em favor de ideias para vencer a pobreza, e pensar nos menos favorecidos. Dedicou a vida dele a esse país e nunca se arrependeu disso", assegura.

Enildo Galvão Carneiro Pessoa foi superintendente do Porto do Recife, durante o Governo de Miguel Arraes de Alencar. Morreu há oito anos, no Recife, vítima de câncer. Escreveu 11 livros, foi secretário de Educação em Campinas e sempre deu suporte a vereadores e prefeitos da região. "Nunca desistiu e sempre estimulou a gente à primazia do ser humano, dizendo que a gente estava nesse mundo para servir às pessoas e lutar pela igualdade. Foi uma jornada bonita", orgulha-se.

 

Lista dos homenageados

Enildo Galvão Carneiro Pessoa (In memoriam), docente da Escola Politécnica de Pernambuco;   
Francisco de Sales Gadelha de Oliveira (In memoriam), estudante da Faculdade de Ciências Médicas;   
Ilmar Pontual Peres (In memoriam), estudante da Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco;   
Javan Seixas de Paiva (In memoriam), docente da Faculdade de Odontologia de Pernambuco;   
José Almino Arraes de Alencar Pinheiro, estudante da Escola Politécnica de Pernambuco;   
José Luiz Oliveira (In memoriam), estudante Faculdade de Ciências Médicas;   
José Romualdo Filho, estudante da Faculdade de Ciências Médicas;   
Maria Zélia de Sousa Levy, estudante da Faculdade de Odontologia de Pernambuco;   
Paulo Santos Carneiro, estudante da Faculdade de Ciências Médicas;   
Rildege de Acioli Cavalcanti (In memoriam), estudante da Faculdade de Odontologia de Pernambuco;  
Rosane Alves Rodrigues (In memoriam), estudante da Faculdade de Medicina de Pernambuco;
Severino Vitorino de Lima, servidor técnico-administrativo da Faculdade de Odontologia de Pernambuco.   

O evento é aberto ao público e pode ser acompanhado pelo YouTube da UPE. Clique aqui 

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