A Educação no Brasil: entre erros sistemáticos e desafios instigantes
Enquanto a Realidade Educacional Fica a Remoer, a Boiada Populista Ultrapassa a Porteira
Nunca deixo de renomear a educação como a questão crucial deste Brasil de tantas leniências e comodismos, que chegam até a inconveniência. Já fui à exaustão na tese repetitiva da prioridade política, em nome da importância da educação, tamanha a quantidade de promessas, planos e gestões que pouco fizeram por um sistema educacional que fosse transformador. Os erros sistemáticos parecem impregnados a ponto de poderem ser considerados como um parâmetro, em quaisquer avaliações quantitativas ou qualitativas.
Esqueço aqui tudo que está por ocorrer agora, em termos de indicadores de instabilidade econômica, que faz por merecer minha crítica racional sobre a situação atial e futura da nossa Economia. Também considero o fato de que se têm 3/4 de uma governo que não contribuiu para guiar alguma mínima mudança no sistema educacional. Neste particular, agregou-se algo pior: uma pandemia que já consagrou alguns impactos preocupantes. A destacar, inicialmente, o baixo aprendizado, para os que se mantiveram no sistema, via modelo EaD. Em seguida, a evasão justificada, para os que não quiseram ou desistiram do aprendizado proposto, dentro de um leque amplo, que vai do ideológico às condições de renda. Qual, então, o vetor resultante desse contexto? É mesmo a infeliz constatação de que não faltam motivos para se expor aquela velha percepção sobre a falência do sistema educacional brasileiro.
Embora não creia em mudanças efetivas no curto prazo, o clima de efeméride ensejado pelas festas natalinas renova as esperanças. Se não para o agir, quem sabe para o pensar. Nessa perspectiva, sempre trago à mente dois desafios, sobre os quais faço aqui breves e firmes comentários.
Não obstante o fato de se levar em conta que a educação é a essência de um modelo novo e sustentável para o desenvolvimento socioeconômico, não há como se despreocupar com as questões que agora trago à baila. Primeiro, o desafio da melhoria na concentração de renda, que precisa relevar o papel da educação. Em seguida, outro desafio não menos complexo, que trata da inadequação temporal do conteúdo de formação, que não privilegia a expressão da cidadania.
No caso da concentração de renda, quando já se evidencia uma piora no padrão distributivo, é evidente que a condição de iniquidade, onde 90% da população está na faixa dos que ganham menos que R$ 3.500/mês (conforme dados recentes da PNAD Contínua de 2019) é fruto de uma formação educacional que deixou a desejar há muito tempo. Naturalmente, isso implica considerar o desafio de uma inversão sistêmica e gradual, no qual o aprendizado na estrutura de formação e o treinamento nas etapas profissionais precisam dar sentido ao que alguns economistas tratam como "capital humano".
Sobre o conteúdo dessa formação, a questão vai além que uma simples reforma na grade curricular e valorização da docência. Além disso, é preciso ousar no comportamento e na cultura de um sistema que poderia ser o ideal para uma outra realidade de mundo. Quando se assistem hoje cenas explícitas de negação científica, de desrespeito à diversidade cultural, de preconceitos estruturais e agressões "consentidas" ao meio ambiente, tudo isso é o corolário de um sistema incapaz de formar cidadãos. Livres para pensarem, criarem, empreenderem e fazerem escolhas conscientes. No entanto, capazes de viverem em sociedades, nas quais o respeito à pluralidade e a consideração ao interesse público sejam regrados, valorizados e exercidos.
Pois é, enquanto a realidade sistêmica da educação fica remoendo no pasto, a boiada populista ultrapassa a porteira. A campanha política pode ser até antecipada com a fleuma de uma decisão inoportuna, dada a extensão da crise. Mas, continuar com ela sem proposições para os problemas e diante de um mundo diferente, parece-me com aquela máxima cazuziana, de ver nosso país insistir na tese "do futuro repetir o passado".