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A importância do valor da humanização nas atividades econômicas (II)

Desigualdade e pobreza na rota da morte: a violência da cultura dos preconceitos

Sigo no tema da humanização como foco, ao tratar de questões estruturais bastante aguçadas, em virtude dessa perigosa via em "mão dupla", decorrente do vigor desmesurado das redes sociais. Tinha razão o extraordinário Albert Camus: "Não espere o juízo final, pois ele se realiza todos os dias". Quero crer que, infelizmente, chegou-se a tal ponto. Afinal, em pleno século XXI, a trilha do martírio que consagrou o mal pela incitação frequente do ódio, ao ser disseminada e proclamada pelas redes, jogou no ralo o mínimo de humanização que restava. 

Bem, já havia escrito aqui sobre o apogeu da falta de humanização, que associada à barbárie da miséria e da fome, levaram juntos o país a reconfigurar uma página da sua trágica história de desigualdade. Esse tipo de associação tem-me permitido aceitar uma revisão ainda mais decepcionante, porque agora ela "saiu do armário" para expor os contextos dos preconceitos estruturais, traduzidos para um prática covarde de agressões, inclusive, físicas. Parece-me que Einstein - o outro extraordinário Albert - tinha toda razão ao afirmar que "era mais fácil desintegrar um átomo do que o preconceito". De fato, as questões de gênero, raça e renda tomaram conta do cotidiano e estão contribuindo, direta ou indiretamente, para que os custos sociais consequentes das tragédias cotidianas comecem a se tornar quase que impagáveis. Vejamos alguns episódios recentes.

No âmbito do preconceito de gênero, o que chama mais a atenção são as cenas frequentes de demonstração de misoginia e homofobia. Os números que manifestam os inúmeros  casos de violência física  e morte confirmam o desrespeito humano, aqui traduzido em vítimas, sejam mulheres ou pessoas integrantes do público LGBTI+. Não bastassem as lutas pelo direito individual de serem reconhecidos pela plena cidadania, atos explícitos e escancarados de misoginia e homofobia vitimizam quem também tem relevância nos seus papéis de agentes econômicos. Os esforços que negam espaços para que esses agentes componham com sucesso a população economicamente ativa, ou gera subutilização (pela discriminação profissional) ou eliminação (como vítimas fatais, com onerações para os sistemas públicos de saúde e/ou previdência).

No que tange à questão racial, as demonstrações diárias de preconceito impregnado, violência gratuita e morticínios escandalosos, levam-me a crer na reponsabilidade do Estado e da sociedade, por essa outra face da nossa tragédia cotidiana. O primeiro, por uma postura imprevidente no trato da humanização. A segunda, por uma "cultura" de atuar como um agente mitigante e tolerante, diante da história sofrida dos afrodescendentes que aqui estiveram e dos que ainda resistem. Muitos percebem hoje que o episódio histórico da Abolição está incompleto. No ponto extremo do problema, que o digam tantos exemplos do nosso cotidiano, que bem caracterizam o cobertor curto de uma democracia racial hipócrita.

Pela percepção  do nível renda, a tragédia  cotidiana se expressa na sua magnitude, pois ao revelar o contexto da pobreza, a inclusão do apartheid de gênero e de raça se potencializa. Tragédias naturais (como as adversidades climáticas que vitimizaram inúmeros pernambucanos) e espontaneamente agressivas (como as clássicas intervenções mortais nos morros do Rio de Janeiro e outras metrópoles), bem expressam a dimensão da concentração de renda e a aporofobia subjetiva (uma tímida demonstração de aversão à  pobreza), que estão por trás de políticas sociais inefetivas. Historicamente, faltam políticas de tudo: ocupação urbana, habitação, saneamento e associados. Só não faltam políticos que se mantém nos velhos discursos, incapazes de perceberem que a melhoria da qualidade de vida dessa população é também minimizar preconceitos.

O Brasil é mesmo um caso peculiar. E como disse o poeta Pessoa: "quanto mais fundamente penso, mas profundamente me descompreendo". 

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