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As incertezas da economia e a engenharia política - Parte 2

As incertezas da economia e a engenharia política - Parte 2 - Hugo Carvalho/Folha de Pernambuco

Na coluna anterior, evidenciei a relevância da política para assumir os pareceres técnicos dos impasses econômicos que têm afligido o país. Parti da instabilidade estrutural das finanças públicas e tomei como referencial o período pós-constituinte. 

O histórico desse desequilíbrio possui aspectos temporais, embora traga na sua essência uma engenharia política mal construída, com raros momentos em que a macroeconomia tenha apontado para alguma estabilidade. Neste particular, relevem-se os agentes públicos dos três poderes que, mesmo diante dos conflitos de interesses, conseguiram sustentar o que a racionalidade técnica definia.

No prosseguimento dessa análise, considero agora a investidura do atual executivo como objeto (2019). Iniciada a gestão, nenhum sinal de dessintonia entre a equipe econômica e os demais entes do governo. Na agenda de trabalho, um discurso de alto viés liberal. Existiu daí um certo ânimo no mercado, não só pelos excessos teóricos destilados por Guedes e sua equipe. Certamente que, por uma compreensão mais pragmática de outros pressupostos circunstanciais da cartilha liberal. Enfim, algo que pudesse ser conquistado com equilíbrio, racionalidade e negociação, em grau suficiente para dinamizar a economia. 

Com tamanha fragilidade financeira, bastaria dotar o país de um controle mais efetivo dos gastos públicos, além de simplificar e aperfeiçoar o sistema tributário. Na minha modesta perspectiva, um exercício de sobrevivência, cuja intenção seria restaurar uma mínima capacidade de planejar, por mais que o termo soasse como um "palavrão" para os ouvidos ultraliberais.

Dito isso, é importante lembrar que o ambiente econômico, dado pela mudança de governo, era compatível para se avançar. Já existia um teto para a execução dos gastos. Também estava encaminhada uma negociação política, pelo embate que se dava sobre a previdência. Nessa perspectiva, caberia ao novo governo prosseguir nas reformas, por meio de um olhar mais incisivo sobre os gastos, sem perder de vista ações mais concretas sobre as receitas.

Mesmo com tais condicionantes, o tempo confirmou fatos e resultados contrários às expectativas desejadas. Aos primeiros sinais de uma crise econômica anunciada foram inseridos elementos inflamáveis de uma instabilidade política renitente. Aquela sintonia entre a equipe econômica e os demais pares de governo perdeu consistência. Ademais, a crise sanitária ganhou a dimensão de uma pandemia e criou a emergência irreversível da ampliação dos gastos. O pior ficou bem desenhado.

2021se projeta com incertezas. Os principais indicadores já apontam para isso. Pior tem sido o "pastelão" do orçamento, que voltou a assumir o papel de peça de ficção. Assumiu-se o ápice de uma engenharia política fracassada.

O resultado do imbróglio orçamentário precisa ter fim na próxima semana, prazo fatal para sancionar ou vetar a lei. Do jeito que se mostra, dos R$ 1,518 trilhão propostos, R$ 32,7 bi estão acima do limite constitucional. Num ensaio sobre a composição desses números, tem-se R$ 49 bi de emendas, muitas dispensáveis. Só que R$ 17 bi delas, também por força constitucional, precisam ser executadas. Os R$ 32 bi desse saldo são o valor aproximado das despesas obrigatórias que urgem pela execução, independente dos truques. Isso sem falar de outros R$ 4,5 bi dessas despesas que sumiram como mágica e que também carecem de execução. Os números não fecham.

Na ausência de um planejamento que soubesse fazer contas e na desarticulação entre o governo e o parlamento, o resultado é um orçamento ilegal e inexequível. Ajustá-lo em uma semana, sem ferir a Constituição, exigirá coragem para cortar. Nas despesas ordinárias, com sangria na esplanada dos ministérios. Nas emendas parlamentares, com sangria nos corredores do Congresso. 

Esse dilema orçamentário parece levar o Planalto a fazer uma opção de efeito bombástico: ou Guedes ou Centrão?

Seja qualquer opção, a economia segue sua marcha da insegurança.

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