Assombrações, Tubarões e Culturas: Como Inovar na Política de Turismo do Recife (I)
A Importância de Rever Estratégias, em Nome de um Marketing Criativo
Na minha trajetória profissional, tive a oportunidade de ocupar as funções de secretário na área de turismo, tanto no estado, como na capital. Em ambas experiências, esforcei-me em focar minhas intenções estratégicas na melhoria da qualidade dos serviços e na capacidade de estimular a inovação e a criatividade, como contraponto às iniciativas convencionais de marketing.
Perceba o leitor que, nas duas situações, a serventia das políticas públicas estava direcionada para quem de fato exerce a primazia do consumo - o turista. Nesse olhar para a demanda, a essência que estava por trás da ação governamental foi de estimular os meios para seduzir e cativar um cliente muito especial. Afinal, o turista satisfeito reproduz o real e melhor protagonismo de uma cadeia produtiva de enorme expressão econômica. Pena que assim como a da cultura, pouco relevada.
Quero aqui dar apenas evidência às proposições que nortearam minhas ações para o Recife. Antes, porém, destaco que a oportunidade que tive no ofício da política econômica de PE (em 1993/94), no que tange ao setor turístico, foi bem mais limitada. De qualquer modo, pude propor à epoca um breve ensaio sobre a melhoria da qualidade na prestação de serviços, que aquém do que imaginsva, ficou restrito a uma breve campanha de comunicação e uma ação muito pontual de apoio ao treinamento da mão de obra engajada em certa área do setor. Vale o registro, porque a qualidade nos serviços turísticos está longe do desejado até hoje. Aliás, um problema nacional, com raríssimas exceções.
Por sua vez, na ação planejada para o Recife, a amplitude do que pude executar não só teve mais expressão, como trouxe algumas reverberações. Em adição ao assunto da qualidade, apoiei-me também no esforço por iniciativas criativas e inovadoras, tomando como referência alguns problemas clássicos e valores culturais inusitados. Tudo isso trabalhado numa forma de marketing que estava fora dos padrões tradicionais.
Assim, diante da perda de competitividade do chamado "destino Recife", entendia que era preciso mudar e ousar, apostando em direções contrárias ao que comumente era feito. Como o papel público não poderia ser diferente a um exercício de mera indução para animar o senso empreendedor do"trade", algumas resistências surgiram. Precisaria encará-las como o mesmo impeto para enfrentar os velhos problemas e daí impor proposições fora da padrão.
De pronto, um problema que esteve comigo, mesmo que também à epoca da gestão estadual: os ataques de tubarões na orla recifense (alguns deles originalmente pontuados na região metropolitana). A gravidade da situação criou para o Recife um simbolismo de antimarketing, uma imagem desgastante e até impeditiva, para efeito de "vender o destino". Por ser algo tão marcante, que chegava a causar espanto a reação nas feiras internacionsis, seja por operadores e até mesmos potenciais turistas, percebi que o contraponto seria "tolerar" a adversidade e extrair dela o máximo. Isso numa percepção contrarreativa, que propusesse um marketing criativo. Quem sabe um simpático mascote, que se assumisse como um tubarão? Ou mesmo, por que não se gerar estímulos para atrair investimentos, do tipo aquários com as espécies? Foram ideias que consumaram os primeiros esboços de um plano, que revisasse o papel da política pública de turismo.
Além desse conceito e da tese do turismo de qualidade, juntaram-se duas outras ideias. Ambas, inspiradas pela boa referência de obras grandiosas de Gilberto Freyre. A primeira, revelaria um mote inusitado, de se vender o Recife como um destino assombrado. O outro, no bojo da pluralidade cultural da cidade, seria disseminar a força da boa gastronomia. Duas visoes distintas, mas vocacionadas e bem amparadas pelas incursões sociológicas do mestre de Apipucos. Seja pela visão turístico-cultural presente no "Guia Prático, Histórico e Sentimental da Cidade do Recife, 1934" e "Açúcar, 1939". Ou mesmo, através de "Assombrações do Recife Velho, 1955".
Sobre as obras e suas inspirações que, no meu modesto entendimento, ainda contribuem para o desenvolvimento turístico do Recife, tratarei no próximo texto.