Cultura em terra arrasada: os valores ideológicos extrapolam os econômicos
A saga da sobrevivência é uma consequência de negar em 3D a economia da cultura
Não bastassem os equívocos sobre as falhas gritantes que puseram a vilipendiada Lei Rouanet, em mais uma linha absurda de massacre, o setor cultural se vê desafiado agora com o veto presidencial em torno da Lei Paulo Gustavo. Não importa saber se o setor tem uma extensa cadeia produtiva, que gera um volume de empregos tal, que não se limita às figuras de artistas tratadas como imimigas. Muito menos há a menor sensibilidade com o quadro de terra arrasada, que além do fiasco das políticas públicas, contou ainda com os fortes impactos da pandemia. Afinal, o setor foi um dos primeiros a sofrer a pancada e um dos últimos a retomar sua trilha natural.
Por essa condição de penúria, que a cultura foi submetida, nunca é demais insistir na tecla: o setor tem a mesma relevância econômica, quanto outros tantos que contribuem para a formação do PIB. Ignorar isso já passa a ser ato de má fé, onde os valores ideológicos de uma "guerra cultural" idiota, superam à extrapolação toda e qualquer iniciativa do mérito econômico de quem produz cultura. Se assim era antes da pandemia, com ela tudo piorou. Assim, a saga que passou a ser a sobrevivência diária, tem-se revelado como consequência de se negar tal valor. É a percepção 3 D: desconhecimento conceitual, desinformação geral e desinteresse proposital.
Para piorar, vive-se um tempo de irracionalidades. Em pleno século XXI, quando as inovações científico-tecnológicas puseram o mundo ao alcance das mãos, pares em forma de párias consagram atos irracionais via agressões e atitudes discricionárias. É por ocasiões assim que o ideário resultante desses comportamentos deságua nessa estupidez chamada de "guerra cultural". Neste "ofício bélico" supremacismos e negacionismos são os nutrientes de tanto ódio destilado e, por extensão, outros tantos desejos de extermínio. Assim, a vítima maior dessa falta de discernimento que irreleva e desrespeita o vigor democrático do contraditório, estão as atividades culturais. Alvos naturais de um massacre promovido por imunições letais.
Foi-se o tempo de gente mais racional, no qual a exacerbação de velhos maniqueísmos, sempre pôs em linha de confronto posturas alinhadas aos extremos políticos, muito embora que de modo bem mais civilizado. A práxis, por maior que seja a distância entre esses pensamento, era marcada por uma convivência conflituosa, mas educada e respeitosa. Hoje, o que se pode extrair desse caldo é um ódio inconveniente. Incapaz de compreender que produção cultural mobiliza recursos e gera fluxos de empregos e rendas. Atacar um setor estimado em 4% do PIB, que gera entre 4 a 5 milhões de postos de trabalho e se reflete como a identidade nacional é algo próximo de ser reconhecido como um crime de lesa-pátria.
Pelo exposto, confesso que não consigo conviver em ambientes de obscurantismo tão latente. Até que respeito quem possa fazer da "desnutrição cultural" uma opção de vida. Ou mesmo, os insensíveis que não se emocionam, não se arrepiam e nem choram com a arte. Mas, ir além disso, através do desrespeito e até da violência representa a restauração do troglodismo.
É isso. A consagração recente por tamanho desinteresse está aí, agora representado pelo veto presidencial integral à proposta inerente à proteção prevista na Lei Paulo Gustavo. São os R$ 3,8 bilhões que estão alinhados previamente por um Fundo Nacional de Cultura, que na sua velha trajetória e em tempos de certa normslidade econômica sempre foi submetido a contingenciamentos. Numa situação de crise, dada a extensão da cadeia produtiva, a importância da lei está também em poder espalhar recursos por todos os municípios brasileiros, dentro de critérios técnicos já definidos. Ou seja, um impacto considerável sob o ponto de vista econômico, nesses tempos de péssima previsão para o crescimento do PIB.
Mas, como repetiria agora o genial Nélson Rodrigues, "nada mais cretino e cretinizante que a paixão política, pois rpor não ter grandeza, é capaz de imbecilizar o homem". É preciso remover os sinais de obtusidade que fazem tão pouco para o relevante papel da cultura.