Pouco se Fez e Nada Mudou
É Insustentável: Ainda se Faz Turismo com Nostalgia e sem Cultura
Duas viagens recentes pelo Nordeste. Dois destinos com distintas particularidades turísticas. No entanto, em ambas situações, uma maneira de conduzir a oferta e a demanda por serviços turísticos de forma desalinhada com uma identidade cultural que, conceitualmente, é comum às duas diferenças. Cabe-me, agora, explicar melhor o que danado quero dizer.
É que, num lastro de 10 dias, retomei o fluxo de viagens regionais que até tive antes da pandemia, para destinos como Fortaleza/CE e o Sertão pernambucano (Arcoverde). Os compromissos de trabalho não me impediram um olhar técnico e criterioso, que refizesse uma varredura no que havia de sincronismos entre o turismo e a cultura. Na medida do possível, gosto de testar esse desafio, justo para entender até onde se resiste a essa dissociação, mesmo que se perceba uma clara evidência, na qual o óbvio não é assim tão palpável.
Foi muito positiva a minha experiência de rever Fortaleza numa outra perspectiva urbana, mais arrojada e moderna. Por maiores que sejam os problemas sociais decorrentes do nível de metrópole conquistado, é inequívoco que os esforços públicos por melhorias no plano urbanístico, compuseram uma decisão política de se olhar para a cidade pelas lentes dos turistas que chegam. E isso não é bom? Sim. Mas, com uma boa dose de análise econômica direta, não resta dúvida de que tais iniciativas passaram pelo crivo da informação e observação, que mostraram um dado peso do turismo na economia da cidade. Só que essa opção não esgota outras possibilidades, sobretudo, que garantam padrões conceituais mais sustentáveis.
De fato, a insistência numa política viesada de só se vender "sol e praia", nos 365 dias do ano, não poderia trazer uma aposta urbanística que não fosse diferente àquelas transformações feitas entre a Praia de Iracema e a proximidade do Porto de Mucuripe. As mudanças trouxeram diferentes impactos e tudo parece ter sido feito para atender à disposição do turista, que lá chega para desfrutar do sol e das praias. Assim, mantêm-se as estratégias de pouca valorização de uma diversidade cultural própria (de lá e, por extensão, da região Nordeste). Um tipo de oferta que não parece atrair o consumo do tipo de turista que por lá chega.
No caso de Arcoverde e, certamente, da maioria dos destinos sertanejos de referência, o apelo cultural sequer foi trabalhado na grandeza que lhe cabe, até porque as políticas públicas e o próprio mercado também não providenciaram uma oferta adequada. É aquela velha história de que o potencial existe. Faltam planejamento e disposição para que algo aconteça e mude a realidade.
O curioso desse contexto é que essa "capacidade ociosa", que geraria outra forma de criar oferta e daí diversificar o consumo, seria a melhor aposta para transformar o setor numa real expressão econômica. Só que nos contentamos por comemorar algo como 6 milhões de turistas estrangeiros neste ano. Esquecem que esse número já foi referencial há quase 3 décadas. Justo quando exerci minha primeira experiência pública com o setor.
Segue-se no plano insustentável. Ainda se faz turismo com nostalgia e sem cultura.