Minha utopia antecipada por sugestão
Um colega economista, que prefere que omita seu nome, fez-me um comentário sugestivo com base nos textos das duas colunas da semana passada. Esclareço, a seguir, sobre tal observação, que me balizou no conteúdo de hoje.
Na semana passada, tratei de propor a preferência pelo ócio criativo de Domenico de Masi, por conta do desperdício que chamei de "teoria da energia estéril". Esta, mais do que escancarada, pela sucessão de erros e omissões do governo, dadas as quatro dimensões da crise. Portanto, diante dos negacionismos e dos besteiróis que me fazem reviver a lucidez das crônicas do velho Stanislaw, a opção é mesmo operar o máximo de criatividade no ócio, para dele se extrair as colunas que poderão sustentar uma agenda de desenvolvimento revisada.
A citação do colega evidenciou que fiquei em falta, no compromisso de abordar mais a fundo o futuro. A preocupação foi sutil da minha parte, quando apenas encerrei o segundo texto com a aposta que fiz numa provável utopia realista, ao estilo do que propõe o historiador holandês Rutger Bregman.
Diante disso, para atender a demanda do colega e enfatizar todo meu otimismo, mesmo nesse momento histórico de crise sem precedentes, quero aqui ensaiar os passos que julgo críveis, para repor o país no eixo e modelar outro padrão de desenvolvimento.
Em pouco mais de um ano de coluna, até que traduzi, mesmo que de modo disperso, algumas inspirações para tal. Aqui ou acolá tratei de evidenciar a importância de se restaurar o planejamento no país, de tal maneira que se iniciasse um processo de vê-lo comprometido com algum modelo sustentável de desenvolvimento. Nessa conjectura, o quarteto educação, cultura, preservação ambiental e ciência & tecnologia dariam a nutrição para o que se espera em termos de um crescimento econômico equilibrado e com justiça social. Tudo numa configuração política comprometida com a democracia e em harmonia sistêmica com quaisquer diferenças.
Assim, entendo que não há satisfação maior para um autor que exercer seu pensamento livremente, com a humildade de revelar suas fontes de referência ou inspiração. Nesse sentido, se minha esperança por ver este país revisado ainda é palpável, não me vale à pena somente recorrer àquela utopia realista rutgeriana. Vou além disso, quando aposto também as fichas no pensamento estratégico do economista e filósofo Eduardo Giannetti.
Mesmo que diante do realismo do auto-engano, que forja uma ética contestável em larga parcela da nossa sociedade, é possível sim construir uma solução à brasileira, que retrate essa amálgama de tanta diversidade e que, por assim ser, faz deste país um exemplo peculiar. É nesse princípio filosófico que Giannetti ergue os pilares necessários para exercer, como economista de boa cepa que é, sua contribuição para simular o desenvolvimento que o país ainda carece.
Nessa ideia propositiva onde se projeta um Brasil diferente, vistas as questões conjunturais, que passam pela recuperação da estabilidade macroeconômica com recuperação e adequação do papel do Estado, o olhar do sustentável reforça aquele compromisso com o quarteto anteriormente citado. No entanto, tão ou mais importante que essas prévias é poder efetivá-las sob novas versões e métricas, absolutamente traduzidas para algo com a "cara realista" do Brasil. Nisso, creio que Giannetti tem sido inovador na contribuição intelectual e no seu modo de "pensar o Brasil", uma razão a mais para que não só concordasse com seu ideário, como aqui pudesse assumir que, aquele seu pensamento, serve-me também de fonte inspiradora.
Num reforço realista que agrego ao sonho brasileiro que Giannetti projeta, compartilho da ideia de construir um país que, na sua mínima reorganização enquanto sociedade, respeite a diversidade cultural. Nossa formação social sempre foi pautada por um espontaneidade própria, que pouco ou nada condiz com outras realidades que inspiram o mundo.
Tal originalidade tão brasileira, muitas vezes refratária no assimilar regras estrangeiras que chocam com tanta espontaneidade, impõe-se como condição para a mudança desse já desfigurado padrão de desenvolvimento. Taí o ponto de ruptura do atual processo civilizatório, hoje massacrado pelo maniqueísmo político.
Tem razão Giannetti, quando apoiado em Rousseau, afirma que "o brasileiro precisa ainda consagrar o doce sentimento da sua existência". Taí a essência da fome de futuro que ainda nos incomoda.