Nunca a economia dependeu tanto de uma mera injeção
No final do ano passado, o jornal "El Pais", numa das suas manchetes, desejou que 2021 tivesse "uma injeção de esperança para a economia mundial". Havia um duplo sentido. No jargão dos mercados, a "injeção econômica" se traduz por novos investimentos e a consequente geração de empregos. Claro que para esse intento há que se condiderar outros aspectos da "injeção": condicionantes e instrumentos adequados.
Em tempos de uma pandemia, que pôs o mundo numa dura recessão, a clareza maior dessa expressão deve ser encarada pelo seu sinônimo trissilabo: va-ci-na. Afinal, para a imensa maioria que compõe o mundo civilizado, não houve escapatória que não fosse a rendição. Menos incauto, até o vírus sabe da potência dessa arma.
É evidente que a primeira injeção é um recurso condicionado, independente do quadro econômico hoje ditado pela crise sanitária. Não há magia que permita uma animada e esperançosa recuperação sem que o ambiente socioeconômico esteja preparado para tal. Isso sem falar que, seja qual for a circunstância, há que se apostar no uso dos instrumentos políticos certos.
Dada a extensão da pandemia no mundo, onde os números têm revelado um elevado comprometimento da saúde pública, a conclusão que se extrai é que o dinamismo econômico está dependente da vacina. Ou seja, sem programas rápidos de imunização o processo de recuperação econômica virou um vetor nulo. A lição da nova cartilha política está dada: sem saúde pública sob controle não há economia que se sustente. Vidas sempre falarão mais alto que qualquer retórica discursivo-populista em favor da economia. Ainda mais quando esta já se encontrava à deriva.
O que há de se lamentar é que o Brasil volta a repetir o velho erro de não aprender com as experiências alheias e, por conseguinte, desperdiçar oportunidades. Faça-se aqui jus ao título, pois nunca se viu a economia brasileira depender tanto de outro modo de injeção: uma vacina. A resistência por negar a grandeza do mal sanitário e a demora por assimilar a imunização da população, além de ato falho de planejamento, representa uma decisão política suicida. Afinal, o mal enfrentamento da crise sanitária vai de encontro à própria tese de usar a economia como pretexto de não enfrentá-la com o devido rigor humanitário e civilizatório. Não há dilema entre a salvaguarda social (enfrentar o caos da saúde pública) e a sustentação do ritmo econômico (diante da tese de que o isolamento é adversário da economia). No fundo, o inimigo é outro, invisível e poderoso, que se esconde na forma de um vírus biológico destruidor e até mortal. Primeiro, para os seres humanos. Depois, para os sistemas econômicos.
Enquanto o Brasil chega ao último mês deste primeiro trimestre, patinando em pista escorregadia e enxugando gelo, o resto do mundo assimilou bem o papel central da saúde pública. Agora, com meses de atraso, foi que o Ministério da Economia fez as contas e chegou a uma conclusão. Ou seja, gastar com "injeções" em forma de vacinas representa a melhor "injeção" de fôlego, diante da asfixia econômica e social a qual foi sumbetida a sociedade. Uma vez que houve lá atrás um brutal erro de planejamento e que o repique da pandemia tornou inevitável a retomada do gasto com a renda emergencial, se não houver firmeza na agilização dos imunizantes, nem o deficit fiscal e nem o caixa corrente terá como respirar.
O planejamento que faltou no pretérito surge como uma bomba de efeito retardado no presente. Não bastasse o risco de oxigênio nas unidades de saúde, agora sua falta se mostra iminente na economia.
Não há mais como o oxigênio escapar em dois prédios da esplanada: nos da Saúde e Economia. O danado é que falta o Planalto se convencer disso.