O compromisso social do capital e a obsessão racional no investimento educacional
A tática 2 P, que reúne potência e paciência, representa uma espécie de exercício dogmático comum em certos esportes, especialmente, para os tenistas. Nesse sentido, trago à evidência um exemplo ímpar, de um empreendedor que foi bem além do que reproduzir simplesmente o capital.
Explico: esse princípio contribuiu para transformar o atleta suíço-brasileiro Jorge Paulo Lemann - que chegou até a disputar a Cópia Davis de 62 pela Suiça - nesse exemplo empresarial tão meritório. Vale aqui antecipar que sua trajetória de sucesso não só dignifica a imagem de um "capital" muitas vezes tão desgastada no país. Digo isso porque à essa condição, Lemann também agregou um outro valor, em doses comprometidas com a responsabilidade social e sustentabilidade, que hoje fazem a diferença para os que enxergam a cidadania como fenômeno universal.
Da sua formação acadêmica no curso de economia de Harvard, passando pelas experiências em finanças no Credit Suisse e no seu Banco Garantia, o dogma 2P de Lemann muito lhe serviu para o arrojo de suas decisões de empreender. Ao lado de Sicupira e Telles, é sabido que seus investimentos se iniciaram lá atrás com as Lojas Americanas, fizeram uma brilhante travessia em torno da indústria cervejeira (da Brahma, à AmBev/InBev) até atingir o ápice através do 3 G Capital (controlador de gigantes como a Burger King e a Kraft-Hainz). Por tantas conquistas, não foi à toa que a revista Forbes concedeu a esse cidadão brasileiro, de fortuna estimada em U$ 20 bilhões, um justo título: o "Conquistador da América".
É certo que, em cada passo dessa conquista, toda uma vida profissional foi marcada pelos exemplos que garantem a crença nos valores do capital. O sucesso como consequência da liberdade de inciativa e da disposição de se arriscar no empreender. Tudo dentro das regras normais do jogo capitalista. Contudo, numa outra perspectiva, também é válido mostrar que o "capital pode não ser tão frio e selvagem", como costumam expô-lo. Uma postura que ainda decorre dos ranços ideológicos extremos. Seja para alimentar, por um lado, a supremacia do próprio capital. Ou mesmo, por outro lado, para refutá-lo como um modelo econômico desumano e socialmente injusto.
Diante desse embate e na intenção de focar num reluzente espectro de "capitalismo social", invoco aqui o nome da coluna e já respondo: Nem 8, nem 80. Afinal, na dinâmica econômica atual há muitos exemplos de empresas ou empresários absolutamente afinados com os preceitos atuais de valorização de sustentabilidade e diversidade. São novos agentes econômicos que não toleram serem vistos pela sociedade como desconectados das duras realidades que o cercam. Enfim, uma espécie de "humanização do capital" virou um mantra defensável e necessário.
É dentro desse segmento que julgo importante reconhecer em Lemann, enquanto sucesso empresarial, alguém que também exerceu sua racionalidade por outra forma de obsessão, no sentido de encarar o desafio de contribuir para um mundo menos desigual. Daí surge sua aposta na educação, como vetor principal dessa mudança.
De fato, entre discursos políticos fáceis e tantas prioridades não executadas, é absolutamente defensável o papel da educação como um agente transformador da sociedade. E esse argumento ganha ainda maior expressão num país historicamente claudicante em termos de politicas públicas e efetividade nos resultados alcançados. Por Isso, quando alguns poucos líderes se mostram obsessivos pela defesa intransigente da educação, suas convicções e ações devem ser sempre bem-vindas.
Particularmente, já tinha conhecimento dessa aposta de Lemann em ações voltadas em favor da educação, mormente, na concessão de bolsas para estudantes que fazem pós-graduação no exterior. Mas, o que me chamou mais a atenção foi a decisão tomada anos atrás em também direcionar seus investimentos do fundo educacional para as faixas de ensino infantil, fundamental e médio. Esse "olhar para a base" revela uma disposição em contribuir para a essência do processo de formação da cidadania. As verdadeiras lideranças podem e devem ser construídas na origem de um modelo aprendizado que se mostre em perfeita sintonia com o mundo.
Foi diante de tal contexto que tive acesso dias atrás à proposta da Escola Eleva, a marca desse novo projeto assinado por Lemann. No propósito duplo de testemunhar de perto o conceito praticado pela escola e diante da possibilidade de tê-la como extensão da formação cidadã de minhas netas, aprovei tanto o modelo que aqui estou por enaltecer as iniciativas do empreendimento: por ratificar seu compromisso com a educação de qualidade e por acreditar no potencial local.
Em suma, fazer uso da dinâmica do capital para contribuir com o futuro, através de uma perspectiva educacional inovadora é uma aposta acertadíssima. Com os pés na comunidade e o olhar para o mundo, acreditar no desenvolvimento sustentável, nas ciências e no respeito às diversidades é inserir no cotidiano a maior das lições atuais: formar cidadãos livres, preparados e responsáveis que façam sua parte para um mundo melhor.
Lemann segue sua determinação de transformar visão em realidade, ciente de que qualquer liderança não se faz sozinha. Por isso, foi preciso assumir responsabilidades para até servir de inspiração. Com a obsessão racional de crer na educação.