O Controle da Obstinação na Rota entre o Impulso e a Ponderação
Os Filtros Econômicos Ditam Escolhas e Limites para as Políticas Sociais
Há uma frase de Chaplin que se traduz no seguinte: "a obstinação é o caminho mais curto para se atingir o sucesso". Por mais que me renda à genialidade chapliniana, prefiro aqui qualificar esse enredo, pois julgo haver aferições impostas pelas trajetórias de vida, como se uma régua atribuísse escalas entre o impulso e a ponderação.
Nesse juízo, sinto-me mais próximo da força magistral e telúrica da poeta goiana: ninguém menos que Cora Coralina. Em dada ocasião, na simplicidade com a qual lidava com as palavras, ela transmitiu seu sentimento de que "a melhor validação da vida não deveria ser o ponto de partida, pois o mais importante a considerar seria mesmo a caminhada". Assim, com base na sutileza da sabedoria da água, que sempre consegue driblar com destreza seus obstáculos, penso que nessa minha simples parábola, o impulso da consciência social num país injusto com a maioria do seu povo, carece também de uma
racionalidade econômica. Algo bem diligenciado, que meça com competência os recursos gerados e aplicados.
Meu esforço descritivo até aqui é justamente para tratar das recentes disposições do governo. Mais precisamente, na sua ideia de manter e ampliar seus compromissos com as políticas sociais. As manifestações mais recentes foram dirigidas para o lançamento do programa "Desenrola", bem como, a proposição de uma política específica para retomada das vendas de certos produtos do setor de eletrodomésticos.
No primeiro caso, por meio de um plano de recuperação do poder aquisitivo dos mais pobres. Nesse sentido, como reação à elevada situação de inadimplência, aqui traduzida pela recuperação do crédito direto ao consumidor. No outro caso, seria mais uma aposta dentro do padrão do incentivo fiscal, consideradas as intenções de reaproximar o consumidor daqueles produtos e, por conseguinte, de aquecer o própria indústria. Ambas são medidas defensáveis, sobretudo, quando esse impulso favoravel não invalida as ponderações.
De fato, a proposição dessas políticas cria um impulso favorável. Na defesa do "Desenrola", se aqui forem usadas as estimativas mais recentes de inadimplência, seja da CNC ou do Serasa, a ordem de grandeza assusta porque atinge entre 60 a 70 milhões de brasileiros endividados. Tal dimensão de consumidores que está fora do mercado, somente por conta da falta de acesso ao crédito, também proporciona uma demanda reprimida pelos produtos básicos da indústria de eletrodomésticos. Evidente que isso tem lá seu impacto na cadeia produtiva do setor.
O fato é que essas escolhas pelo resgate dos consumidores de baixa renda aos seus mercados convencionais têm custos a assimilar. É por isso mesmo que as réguas de medição precisam ser consideradas e aplicadas. Aqui farei uma breve consideração técnica, em algumas direções.
Para levar em conta a primeira delas, confesso que, desde os meus tempos de academia, acostumei-me a exercer a ponderação pelo respeito aos conceitos de políticas sociais. Nesse campo, o principal atributo é poder fazê-las prioritárias numa escala gradual, na qual a prioridade maior é focar nos mais vulneráveis, exatamente aqueles que mais precisam da atenção do setor público.
Além do conceitual, outra direção a considerar é comportamental. Como o crédito no Brasil sempre foi uma escolha cara, pela inércia do perfil elevado das taxas de juros praticadas pelos mercados, entendo que campanhas gerais de esclarecimentos sobre educação financeira, precisariam ser levadas mais a sério.
Outra direção importante é a compreensão da conjuntura política. É preciso por na ordem do dia que, apesar das carências sociais, o país precisa reafirmar o compromisso recente com os controles fiscal e monetário. Parece-me que, finalmente, alcançamos o plano de poder sustentar o equilíbrio, a harmonia e a sinergia, elementos vitais para uma política econômica que necessita engrenar.
Nada de acirramentos. A ponte entre o impulso e a ponderação está construída para encurtar os caminhos. Toda obstinação parece vital, mas carece também de ser controlada.