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O Miguel da Realidade e o "Migué" das Políticas

A Vergonha da Fome é o Próprio Desastre das Políticas Sociais

Na diversidade dos rótulos, validados ou não, o Brasil continua a ser visto como o país que bem exemplifica muitos contrastes. E os raros esforços que são  registrados para mimimizá-los, terminam por dar essência àquela conclusão de que não conseguimos ser completos. Que em quase tudo nos revelamos como exemplo de tantas obras inacabadas.

Pelo tamanho da minha indignação, não menor do que uma notória vergonha cidadã, volto ao tema da miséria e da fome. Embora desprovido de um mínimo de formação filosófica que, infelizmente, faltou-me na formação de economista, encontrei uma dose considerável de humanismo, que costuma aflorar em mim, por mais comprometido que esteja com a frieza dos números e das teorias que dão suporte à economia.

Ver ressurgir a dimensão da miséria num país que desse mal se afastava, mesmo com sua desigualde estrutural de renda, parecia algo inimaginável na virada do século. Aos poucos, aquele sintoma que nutria um certo orgulho de ser brasileiro, passou a se esvair, de tal sorte que hoje o sentimento de se ter regredido é uma percepção onipresente. 

A triste reconquista dos parâmetros da miséria e da fome está representada por uma parte dos milhões de pobres e famintos. De fato, jogados à dura realidade, subsistem ou moram pelas ruas, sem alcançar ou ter o que comer. A considerar ainda outros tantos milhões que, nas suas precárias habitações, também enfrentam a  insegurança alimentar. Pior; a fome extrema chegou a tal gravidade, que virou caso de polícia. O que evidencia um viés de mão única, que bem exprime a contradição da presença do poder público, justo onde ele precisa ser diverso e atuante. 

O inusitado foi que essa demanda por mais política pública terminou por chegar à polícia, através do comovido apelo de uma criança. Ao se manifestar perante a autoridade publica, o menino Miguel extrapolou sua fome orgânica, devido à situação da falta de renda familiar suficiente para suprir à sua família com alimentos. No entanto, na recorrência desse seu insólito gesto, Miguel também exerceu uma certa "fome cidadã". Atitude de quem cobra do poder compromissos com políticas públicas, enquanto respostas precisas e urgentes, que possam enfrentar os desafios dessa onda de insegurança alimentar. Diante desse fato, cabe a pergunta: o que se tem feito a respeito?

Bem, se a visagem populista sempre ronda as decisões políticas, a experiência nacional assegura que o "canto dessa sereia" parece encantador. De fato, o alvo eleitoral expõe tentações, até certo ponto exploradoras, porque o retorno de tantas "bondades" costuma ser contabilizado em votos nas urnas. Vale dizer, porém, que como o "buraco é bem mais em baixo, o que se precisa destacar são dois pontos seríssimos: 1) a ausência de planejamento governamental desde o início da gestão, que ignorou qualquer ensaio de política social, conceitualmente definida e responsavelmente estabelecida; e, 2) o pleno descontrole do futuro dos gastos públicos, por conta dessa voracidade populista. 

Por essa e outras, a vergonha da fome é um dos vetores resultantes desse desastre que tem sido as políticas sociais. O grito do pequeno Miguel, que bem interpreta a realidade social que hoje aflige o Brasil, apenas contrasta com o "Migué" de tantas políticas públicas sem a menor efetividade. 

Nesses novos nuances da fome que se espalha pelo país, minha vergonha só não é menor que o peso da indignação. Certamente,  Cazuza tinha razão quanto cantava: "Brasil, mostra tua cara, quero ver quem paga pra gente ficar assim".

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