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Os economistas também são das letras

Uma Breve História Sobre os Imortais do Pensamento Econômico

No clima de amenidades que se estabelece a cada final de ano, deixo de lado qualquer senso crítico e trago à tona um aspecto pouco tratado no contexto da economia. Refiro-me ao reconhecimento intelectual de alguns economistas, que trouxeram uma enorme contribuição para o universo das letras, aqui no país. Na torcida pela recente eleição de Eduardo Giannetti para a Academia Brasileira de Letras (ABL), foi que dei conta da presença e importância da imortalidade no pensamento econômico do nosso país. Como disse o sociólogo e ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (imortal) sobre o economista Edmar Bacha (outro imortal), quando prefaciou o livro deste: "o texto claro mostra que não há contradição entre ser bom técnico e saber escrever, pois parece sair da pena de um literato".

Por isso, sem medo de errar e longe de qualquer presunção de classe, são imortalidades alcançadas por mérito, que  fizeraram desses economistas reconhecidos acadêmicos. Das ciências econômicas e das letras.

Esse destaque que aqui trago, reforça ainda meu discreto compromisso de escrever essa coluna de uma forma mais palatável. Nesse sentido, pela frequência do recurso de se buscar em frases ou contextos de certas obras literarias, algumas referências que ajudem a tornar a linguagem da economia mais leve para o leitor. 

Quatro nomes, pelos quais reservo o respeito intelectual e assimilo doses de influências (por distintas que sejam as ideologias), fazem parte dessa história na ABL: Celso Furtado, Roberto Campos, Edmar Bacha e agora Eduardo Giannetti. Nomes que dispensam dúvidas sobre o apreço de cada um deles pela boa escrita.

Furtado tinha seu dom de literato. Qual de nós, entre economistas, que não se envolveu com a maneira didática e límpida de textos como "Formação Econômica do Brasil", a "bíblia" da economia nacional? Neste e em tantos outros textos de sensibilidade e humanismo aguçados, Furtado conquistou seu espaço para exercer funções públicas  exponenciais, não só na SUDENE e no Ministério do Planejamento, como também, no pluralíssimo Ministério da Cultura. No ato da posse de Furtado na ABL, o discurso de recepção proferido pelo acadêmico e ex-ministro Eduardo Portela, ouviu-se o seguinte sobre o novo imortal:

"Um intelectual enraizado, nem messiânico, nem profético, mas tão-somente e, sobretudo, um servidor público, cidadão alistado, mobilizado, segundo as vicissitudes e as exigências da nossa modernidade insubmissa". Furtado soube exercer sua intelectualidade com competência, naquelas missões públicas.

O contraponto da ideologia econômica veio com a posse de outro literato, de textos instigantes e sarcásticos: o "pregador" Roberto Campos, nossa maior referência do pensanento econômico liberal. Assume citando Drumond, que "achava triste as pessoas sem ênfase", justo para reforçar seu jeito enfático de assumir posições ideológicas que, de tão liberais para os padrões nacionais,  foram um convite ao debate e aos embates. Nisso, destaco aqui o que outro acadêmico, Edmar Bacha, acostumado às controvérsias com Campos, disse dele no seu último livro: "Roberto faz falta, mas o consolo é que, em parte por sua pregação, o país é hoje um pouco menos nacional-eatatista que no passado". Salve a inteligência pungente de Roberto Campos. 

Já que falei de Bacha por  duas vezes no texto, não há como deixar de reverenciá-lo como imortal que é. O mérito da pena de um literato que lhe foi  conferida por Fernando Henrique está no seu DNA (tios escritores), certamente uma qualidade que explica a maneira fluida e assertiva com a qual tratou de temas áridos, como a desigualdade de renda e o sudesenvolvimento. Como também disse Fernando Henrique no seu discurso de recepção ao imortal na ABL: "um intelectual público que escreve, predica e não se esconde". Bacha é o economista escritor que, pela criatividade de suas fábulas, mostrou que o texto econômico pode ser aprazível.

Por fim, nada mais justo que incluir nesse time estrelar o mais novo reforço: Eduardo Giannetti. Do alto de quem já conquistou dois prêmios jabutis, arrisco-me a dizer que Giannetri nas letras parece ser dois em um - economista e escritor de penas bem definidas. Afinal, misturam-se no currículo mais de uma dezena de obras de ficção com muitas outras tantas dignas das ciências econômicas. Embora sejam distintas na proposta, afinam-se na excelência da escrita. Uma raridade intelectual.

Para encerrar e me mostrar com a cabeça no mundo, mas sem tirar os pés da cidade, cabe-me também saudar a eleição de Jacques Ribemboim para a Academia Pernambucana de Letras. Um fato que reforça essa tese sobre o papel do pensamento econômico para as letras.

E sobre estas, de forma maiúscula na intenção, desejo aos leitores um Natal de luz. Na semana que vem, tratarei de transmitir meus desejos para o ano que chega.

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