Os Números Falam Por Si
O Fluxo de Turistas Estrangeiros para o Brasil Está Muito Aquém da Realidade
O título acima até pode sugerir, mas é claro que não irei tratar aqui dos aspectos relacionados à numerologia. Quando exponho que os "números falam por si", sigo a linguagem abstrata da própria matemática, no sentido de quantificar, ordenar ou medir. Precisão é mesmo meu foco, por mais que possa qualificar ou interpretar os números. Exponho agora uma velha situação, que retrata o histórico do fluxo de turistas estrangeiros que se dirige ao Brasil.
O cerne da questão é a recente comemoração, por parte de todos envolvidos com o turismo, do marco de quase 7 milhões de visitantes estrangeiros. Evidente que qualquer registro de recordes é sempre um fato positivo. No entanto, a barreira dos 6 milhões já foi conquista consumada há cerca de 30 anos. Lembro bem disso porque participei de movimento comemorativo semelhante, quando exerci funções públicas na área. Com tal informação em mente e dada a dimensão desse intervalo de tempo, o resultado recente pode ser visto como algo frustrante. Não apenas pelo potencial turístico que tem sido ofertado. Afinal, muitos esforços de marketing foram ativados nesse período, inclusive, eventos gigantescos, que expuseram a "marca Brasil" em plena evidência. Que o digam os Jogos Olímpicos e a Copa do Mundo. Portanto, foram expressivos os investimentos públicos e privados, para que os resultados alcançados correspondam a fluxos ainda insignificantes. É preciso, então, fazer outra leitura dos números.
Mesmo que não mais esteja diretamente envolvido com o ofício, há anos que trato desse mistério. E minhas velhas proposições não contaram com o devido retorno, naquela boa intenção de ampliar esses números. E com padrão de qualidade superior.
De fato, do jeito que o comportamento se deu, parece até que existiu uma certa acomodação, algo como uma "zona de conforto", que absorveu uma tolerância quantitativa e qualitativa. Quero dizer com isso, que, ao longo de todo esse tempo, o setor pouco ou nada se empenhou para melhorar as condições de infraestrutura e prestação de serviços. E ainda mais: qualificar seu "ecossistema", para conquistar uma demanda determinada por níveis de renda maiores.
Em linhas gerais, penso que há um modelo por se construir, quando parto da premissa de que o Brasil tem uma oferta turística diferenciada, rica e plural nos seus valores. Essa situação impõe o descompasso de um mercado, no qual os atrativos da oferta justificam a grandeza de uma demanda reprimida.
Reconhecido tal potencial, o passo seguinte do modelo pode ser expresso por uma palavra mágica: qualidade. Em primeiro plano, isso se traduz numa infraestrutura pública e privada que seja decente e consistente. Investimentos públicos e privados em novos projetos e em manutenção/preservação são vitais. Em complemento, num plano seguinte, é primordial que haja melhorias na qualidade dos serviços diretos prestados aos turistas. Nesse ponto, progranas permanentes de treinamentos para a mao de obra empregada no setor precisam ser tratados como prioridade. Para ser alcançado com o êxito esperado, o novo vetor resultante desses esforços garantiria melhores respostas àsestrategias de marketing, em termos de aumento do fluxo, agora acompanhado por outro nível de fluxo. E com outro padrão de renda.
A conclusão disso tudo segue, de modo simples, indiferente ao que tem sido conquistado. Não adianta a manutenção de estratégias repetidas de marketing, se o país se mantém refém da falta de investimentos na infraestrutura e na qualidade dos serviços prestados. Manter-se nessa pegada é reforçar a aposta em conquistas tímidas, incondizentes com o potencial turístico brasileiro. A fórmula de venda unilateral da natureza (sem agregar valores culturais), apoiada por falta de investimentos em serviços públicos e privados com qualidade, não se mostra capaz de mover a demanda num outro padrão de nível de renda. Esse modelo está esgotado há, pelo menos, três décadas.
Os números costumam expressar a realidade. Mas, para interpretá-los na intenção de vê-los ainda maiores e melhores com o passar do tempo, exigem-se escolhas e decisões firmes e apropriadas.