Romper o Velho Discurso
Galípolo e a Autonomia do Banco Central
Em tempos esquisitos, onde até a natureza reage pelos extremos, o embate convencional entre decisões técnicas e políticas, também ganha proporção similar. Virou moda se posicionar, no embalo de qualquer polêmica, de forma polarizada. O equilíbrio e a busca por consensos, instrumentos tão saudáveis para o rito democrático, foram esquecidos e se tornaram descartáveis.
Na esfera econômica, o que poderia ser tratado como alinhamento mais convergente entre o monetário e o fiscal, por mais que haja uma autonomia entre as partes devido às próprias razões conceituais, revelaram-se como experimentos de forte contágio político. De fato, ao longo do tempo, assistiu-se ao escancaramento do poder governamental, num desmesurado exercício político, no qual o monetário e o fiscal têm atuado no mesmo modo: tudo junto e misturado. À vontade dos ânimos partidários, muitas vezes com tons populistas.
Antes de me inspirar naquele velho esforço de seguir no mote do "nem 8, nem 80", cabem mais algumas reflexões, que permitam entender o quanto é preciso romper com discursos já desgastados, na visão de se desconsiderar uma certa homogeneidade entre o fiscal e o monetario. Nesse sentido, as decisões que consolidaram a autonomia dos bancos centrais mundo afora, derivaram do mérito de se fortalecer o papel de Autoridade Monetária. Ou seja, da importância de descontaminar o zelo pela moeda, a partir de um ponto onde o descontrole fiscal toma proporções perigosas.
Bem, para uma sociedade que já conviveu com a inflação galopante e que costuma se render a políticas de gastos excessivos e estruturas públicas de baixa efetividade, não há como dispensar a autoridade monetária. Diante desse contexto, a independência política do Banco Central, enquanto agente importante no cumprimento das metas inflacionarias e sinalizador do controle fiscal, passou a ser indispensável.
Claro que uma desvantagem dessa missão institucional, pode ser entendida como uma atuação insensível diante da urgência das políticas sociais, num país de brutais desigualdades. Talvez até, no sentido ideológico, de que a consequência do rigor monetário possa ser capaz de alimentar interesses especulativos, pela inevitável elevação dos juros, quando o controle da inflação é prioridade. No entanto, na validade desses pontos conflitantes precisa estar no pódio a capacidade técnica, que atue com elevado espírito público. E equilíbrio.
Nesse cenário do "puxa e estica" da polarização, eis que surge aprovado o nome de Gabriel Galípolo como o próximo presidente do Banco Central. O nervosismo que o "mercado" costuma aflorar, quando algo se insinua próximo de algum sinal "fiscalista", voltou a ser considerado. Afinal, por maior que seja o perfil de Galípolo, sua proximidade com o Presidente extrapola o simples ato da sua escolha. Pelos impulsos que vêm do Planalto, nas eventualidades de se questionar o rigor da política monetária, o nome de Galípolo suscitou desconfianças entre agentes do mercado.
O fato é que Galípolo parece ter assumido uma postura isenta, na intenção de não perder de vista seus compromissos como autoridade monetária. Parece também saber como "mirar na lua e acertar nas estrelas", justo quando entender que o efeito da sua política pública tem também que considerar os limites do social. Resumo: a partir de janeiro saberemos do prumo tomado.