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Com quebra de estereótipos, ‘Sex Education’ não é mais um besteirol adolescente

"Sex Education" levanta discussões importantes sobre aborto e homossexualidade na adolescência - Divulgação/Netflix

Educação sexual. O debate sobre esse tema ainda é uma questão turva nas escolas e, sutilmente, a série “Sex Education” lança luz sobre a necessidade de se ter uma presença experiente que leve conhecimento para adolescentes em formação. Necessidade esta, na história, identificada pela personagem da atriz Emma Mackey, que interpreta uma aluna rebelde e que se aproxima do protagonista Otis (Asa Butterfield), lançando para ele a proposta de abrir uma clínica clandestina de terapia sexual, sendo, o jovem, filho de uma terapeuta especialista no assunto. Otis, embora virgem, tem uma bagagem teórica herdada do convívio com sua mãe e funciona na série como uma enfermeira neonatal em um berçário: presta assistência aos “bebês” e suas descobertas.

A série, criada por Laurie Nunn, abre uma janela para que se possa observar aquela fase pela qual todos passaram ou que um dia vão passar, quando insegurança e medo predominam nos jovens nos mais diversos assuntos. Em “Sex Education”, pode-se contemplar a jornada deles desde o início, quando a apreensão domina, até o enfrentamento dos fantasmas que os perseguem. As incertezas alcançam desde o mais frágil da escola até o aluno mais popular, constatando-se que a falsa coragem, na verdade, pode ser mais um sintoma do temor de se mostrar imperfeito em um mundo onde a aparência é tudo.

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Se distanciando da vulgaridade comum, a comédia, original Netflix, justifica as cenas de sexo no contexto de cada episódio, desenvolvendo a narrativa com o intuito de transformar o tema – antes um tabu – em algo banal, porém relevante para a idade das descobertas. Com roteiro denso que, porém, não foge de velhos clichês, o público dificilmente irá encontrar um personagem raso na trama. A representatividade é um dos pontos mais agradáveis de ver na tela. O aluno popular que pratica esporte não é loiro de olhos claros, pelo contrário, é um jovem negro que foi criado por duas mães e sofre de ansiedade desde os 11 anos. Ele também não é um babaca opressor, mas, como de praxe, esse tipo de comportamento fica a cargo de Adam Groff (Connor Swindells), um ‘bullynador’ que ameaça diariamente o melhor amigo do protagonista, Eric (Ncuti Gatwa), um adolescente homossexual.

Cada personagem já citado aqui passa por questões muito específicas, o que faz a série, que, inicialmente, tinha a comédia como fator determinante, se tornar um drama emocionante, do meio para o final da temporada. A Maeve (Emma Mackey) e o Adam estampam em seus rostos um ceticismo traduzido em ações rebeldes e desleixadas com uma vida não escolhida por eles. Já o Eric é o tipo de figura que conquista o público logo de cara, brilhando de tal forma que, em alguns momentos, pode-se tirá-lo do papel de coadjuvante e considerá-lo quase um protagonista. De fato, todos se tornam os protagonistas das suas próprias histórias.



Se temos personagens bem desenvolvidos, o mérito é do elenco. Asa Butterfield é o típico magricela em fase de crescimento e sua química com a atriz Gillian Anderson – mãe de Otis – é bastante convincente. Consagrada em dramas, Anderson fez carreira na série “Arquivo X” interpretando uma agente do FBI por nove anos. Ainda nesse gênero, continuou caçando serial killers na série “The Fall”, mas ressalta seu talento e mostra versatilidade na nova produção da Netflix. O bom-humor, já muito bem utilizado em “Grace and Frankie” e “The Good Place”, por exemplo, também se faz presente em “Sex Education”, ao se excluir piadas de cunho preconceituoso ou que possam ser interpretadas de maneira negativa, ao mesmo tempo em que dá espaço para temas como aborto, bullying e drogas, de maneira mais inteligente e consistente do que em séries teens como “Skins”.

O conjunto da obra é praticamente uma experiência cinematográfica em termos de qualidade. As locações, as paletas de cores vibrantes, que remetem aos anos noventa, com o acréscimo da trilha sonora oitentista (que você pode ouvir aqui), levam a experiência audiovisual para outro nível. É verdade que o uso eletrônicos mais atuais, como iPhones e computadores, pode causar estranhamento nesse contexto. Mas isso não impede o encantamento em um dos momentos mais tocantes da série: Eric, vestido livremente, banhado em brilhos e paetês, quando a revolta da luta contra a homofobia era maior que seu sorriso. Aliás, nesse arco, a série faz um bom trabalho quando coloca a Igreja como fonte de renovação do amor entre pai e filho, ao abraçar as diferenças. 

Sex Education” não te faz esquecer o tema central, colocando quase sempre duas pessoas se beijando no background, enquanto o diálogo entre outros personagens acontece no plano-sequência. Mas, ao final da temporada, em uma dança libertadora no baile entre o protagonista e seu amigo gay (choquem-se: Otis continua heterossexual após dançar com o melhor amigo sem tornar isso um problema) é que a série atinge seu ápice e salienta que haverá abismos entre as pessoas que só a conversa pode destruir.

SEX EDUCATION
Número de temporadas
: 1.
Episódios: 08.
Média de duração: 50min/ep.
Cotação: 4,5/5.

Fernando começou a assistir a séries de TV e streaming em 2009 e nunca mais parou. Atualmente ele acompanha mais de 200 produções e já assistiu mais de 6 mil episódios. A série mais assistida - a favorita - é 'Grey's Anatomy', à qual ele reassiste com qualquer pessoa que esteja disposta a começar uma maratona. Facebook: Uma série de Coisas. Instagram: @umaseriedecoisas. Twitter: @seriedecoisas_ Blog: Uma Série de Coisas.

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