Logo Folha de Pernambuco

Elenco adulto que interpreta adolescentes: por quê?

Joe Locke, o Charlie em "Heartstopper", trouxe a reflexão em entrevista recente à GQ britânica

Na série "Glee", o elenco que interpretava os alunos do colégio eram todos maiores de idade. - Reprodução

Se você já assistiu alguma série teen deve ter percebido que alguns personagens inseridos no ambiente escolar têm aparência de mais velho que não condiz tanto com a idade na ficção. Na maioria das vezes, é verdade. Atores e atrizes de 30 anos ou mais são, frequentemente, escalados para interpretar personagens por volta dos 16 anos de idade. Recentemente, em entrevista à GQ britânica, o astro de “Heartstopper”, Joe Locke, comentou esse fato e gerou reflexão entre seus seguidores.

Os exemplos são intermináveis. A atriz Ashleigh Murray, de 33 anos, como Josie em "Riverdale". Ncuti Gatwa, que vive o Eric em "Sex Education", também já bateu a casa dos 30, além da maioria do elenco de “Elite” que também são adultos interpretando adolescentes. Em “Glee”, nenhum dos “adolescentes” era menor de idade. Mas é tão difícil assim escalar atores e atrizes que correspondem à idade na ficção? A coluna Uma Série de Coisas desta sexta-feira (11), traz alguns pontos.

Leis de trabalho 
Quando falamos das séries americanas, Hollywood, na Califórnia, é o lugar onde muitas dessas produções são concebidas. Lá, as leis limitam o tempo de trabalho para quem não é maior de idade, isso dificultas as longas jornadas de gravações. Já adultos podem trabalhar livremente e esse acaba sendo um dos argumentos mais lógicos para a escolha de pessoas mais velhas no elenco

Sem falar que atores adolescentes precisam concluir os estudos e a escolha de investir na carreira tão cedo é um dilema. O ator Freddy Higmore (Bates Motel) é um dos poucos exemplos que conseguiu transitar entre os estudos e o ritmo de gravação, assim como o elenco infantil de “Modern Family”, que passou toda a infância e adolescência precisando administrar o tempo de trabalho com a escola.

Liberdade criativa x Fidelidade do enredo

Algumas produções optam por uma visão da época da faculdade um pouco mais dramática e violenta. Nas séries “Elite” e “Euphoria”, por exemplo, vemos adolescentes usando drogas, cometendo assassinato e tendo relações sexuais. Muitas dessas cenas são gráficas demais para menos de idade e escalar adultos dá mais liberdade criativa.

Em contraponto, retratar vivências juvenis com um elenco adulto pode fugir da proposta estabelecida pela própria produção. Se a escolha é desenvolver a trama em um ambiente escolar, usar “alunos de 30 anos” não poderia beirar a artificialidade? E de que adolescência estamos falando onde crimes são cometidos anualmente na escola?

Talvez esse seja um dos pontos positivos em “Heartstopper”. Ainda que o ator Joe Locke tenha 19 anos, ele tinha 18 quando gravou a série da Netflix. Seu personagem, Charlie, mesmo estando na faixa dos 14 e 15 anos, ainda consegue estar em sincronia com a história. O mesmo não aconteceria se Charlie tivesse a barriga trincada apenas porque “a câmera gosta”. 

Ainda sobre Joe Locke e sua recente entrevista, ele comenta:

“crescemos com os personagens, mas também estamos crescendo enquanto pessoas. As visões de mundo vão mudando e essas mudanças aconteceram rapidamente quando você é adolescente, porque os hormônios e a escola são horríveis. Parte disso é que a maioria dos programas para adolescentes têm atores de 30 anos fazendo personagens de 17. Eles têm corpos de adulto. Adolescentes de 17 não se parecem assim”.

*Fernando Martins é jornalista e grande entusiasta de produções televisivas. Criador do Uma Série de Coisas, escreve semanalmente neste espaço. Instagram: @umaseriedecoisas.

*A Folha de Pernambuco não se responsabiliza pelo conteúdo das colunas.

Veja também

Newsletter