“Grotesquerie” mistura simbolismo religioso e assassinatos em uma trama típica de Ryan Murphy
Niecy Nash lidera um ótimo elenco nos 10 episódios da minissérie da Disney+
Ryan Murphy entrega, em “Grotesquerie”, uma produção de horror psicológico que mistura crimes perturbadores e simbolismos bíblicos em uma narrativa fácil de reconhecer para quem acompanha o trabalho do showrunner. Estreando na Disney+ em outubro, a minissérie mergulha o público em um mistério conduzido pela detetive Lois Tryon, vivida com intensidade por Niecy Nash. A atriz, que já ganhou um Emmy em “Dahmer: Um Canibal Americano”, também assinada por Murphy, brilha em cada cena, especialmente ao explorar a relação conflituosa entre sua fé e os macabros assassinatos que investiga.
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Desde o início, “Grotesquerie” não economiza em choques visuais. A morte da família Burnside, forçada a cometer canibalismo em uma grotesca referência ao pecado da gula, é apenas o começo de uma sequência de crimes que remetem às passagens bíblicas com um nível de brutalidade típico das primeiras temporadas de “American Horror Story”.
No episódio seguinte, um altar macabro recria A Última Ceia, com as vítimas dispostas em posições da pintura. Esses e outros momentos bíblicos, aliados à direção precisa e cortes inteligentes, criam um ritmo que prende o espectador, embora algumas dinâmicas periféricas soem desconexas, como o arco da enfermeira Redd (Lesley Manville), que abusa do marido em coma da detetive Lois enquanto tenta constantemente humilhar a oficial, sem acrescentar profundidade à trama.
Além de Nash, o elenco de apoio se destaca. Nicholas Alexander Chavez, popular por interpretar Lyle Menendez em "Monstros: Irmãos Menendez", surpreende novamente com sua performance. Travis Kelce, em sua estreia, mostra potencial, embora seu papel ainda careça de desenvolvimento. A direção de Murphy mantém a assinatura estética que os fãs conhecem, com tons sombrios e uma trilha sonora opressiva que intensifica cada cena.
Porém, nem tudo é harmonioso em “Grotesquerie”. A relação entre a detetive e a freira que a auxilia poderia ser melhor explorada, oferecendo uma justificativa melhor sobre a parceria entre elas. É um pouco improvável que a responsável por solucionar um crime repasse informações sigilosas para uma freira que não conhece ou permita o acesso da religiosa nas cenas dos crimes brutais apenas pelo fato de precisar de um novo ponto de vista.
Ainda assim, o conjunto final é um resultado visual e narrativo muito promissor, mostrando que Murphy continua a saber como capturar o público com histórias carregadas de intensidade e provocações. “Grotesquerie” é um prato cheio para quem aprecia terror com complexidade psicológica.
*Fernando Martins é jornalista e grande entusiasta de produções televisivas. Criador do Uma Série de Coisas, escreve semanalmente neste espaço. Instagram: @umaseriedecoisas.
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