‘Normal People’ é romance atual sem sensacionalismo
O cantor e compositor Milton Nascimento uma vez disse: “Tem gente que chega pra ficar, tem gente que vai pra nunca mais”. A composição completa caberia muito bem como sinopse de “Normal People”, minissérie da Hulu indicada ao Emmy nas categorias de Melhor Ator (Paul Mescal), Melhor Roteiro (episódio 3) e Melhor Direção (Lenny Abrahamson). No Brasil a produção é exibida pela Starzplay.
Geralmente, a sinopse é o elemento-chave que faz o público decidir se deve ou não investir tempo naquilo. Neste caso, convido você, leitor, a conhecer a história de Marianne (Daisy Edgar-Jones) e Connell (Paul Mescal) sem levar os resumos em consideração, pois qualquer tentativa de síntese para a minissérie será como tentar explanar sobre o amor, improvável de conseguir.
“Normal People”, baseada no livro de Sally Rooney, está classificada no gênero de romance, mas vai muito além do clichê em torno de dois jovens apaixonados. O enredo abre as portas para camadas densas sobre relações humanas e o amor como elemento de transformação. É lindo e triste ao mesmo tempo, mas não significa dizer que é uma tragédia, muito menos que será um final infeliz – depende da leitura do telespectador. Uma coisa é certa: se você não chorar em algum momento, procure um médico.
Inicialmente, a minissérie apresenta os alunos em seus momentos finais do ensino médio, em uma pequena cidade da Irlanda. Mas antes que pensemos nos estereótipos que esse ambiente oferece, já adianto que, aqui, há uma inversão de papeis interessante e que será um dos principais dilemas do casal na fase adolescente.
Marianne vem de uma família de classe média alta, com um irmão abusivo e extremamente agressivo, e uma mãe omissa que parece ser tão telespectadora de sua realidade quanto nós que, de fato, somos. Já Connel é o garoto popular, de beleza padrão e admirado por todos, mas é um dos estudantes com menos recursos do colégio, sua mãe é responsável pela limpeza na casa de Marianne.
Essa inversão de papeis é cenário para uma paixão complicada. Na escola, Marianne e Connell fingem que são conhecidos, atitude reprovável principalmente do ponto de vista do rapaz, que assiste aos amigos serem hostis com Marianne, ainda que esteja visivelmente angustiado com a situação e procure apoiar a garota longe dos olhos de todos. Em casa, os dois se despem – física e emocionalmente – dando espaço para sentimentos reprimidos em horário de aula. O início desse amor e como ele atua no crescimento pessoal de cada um é o principal ingrediente de “Normal People”.
O que faz a minissérie ser singular é a extensão da trama para fases da vida adulta dos protagonistas, levando o público por uma jornada de amadurecimento e redenção como se fizéssemos parte da experiência. Em certa altura da história, não fica claro onde a trajetória de um começa e a do outro termina, porque a vida acontece e, como diria Milton Nascimento, o trem que chega é o mesmo trem da partida, a hora do encontro é também despedida.
“Normal People” é o romance mais real da ficção. Sem fantasias ou sonhos impossíveis, sem corrida no aeroporto e frases de efeito. E ressoa a mensagem de que é possível trilhar caminhos diferentes, mas estar aberto aos reencontros da vida, porque hoje já não somos quem fomos há uma semana e toda relação é também um ato de revolução.
*Fernando começou a assistir a séries de TV e streaming em 2009 e nunca mais parou. Atualmente ele já maratonou mais de 300 produções, totalizando aproximadamente 7 mil episódios. A série mais assistida - a favorita - é 'Grey's Anatomy', à qual ele reassiste com qualquer pessoa que esteja disposta a começar uma maratona. Acesse o Portal, Podcast e redes sociais do Uma Série de Coisas neste link.
*A Folha de Pernambuco não se responsabiliza pelo conteúdo das colunas.