Pandemia e violência policial são temas das novas temporadas de ‘Grey’s’ e ‘Station 19’
Depois que a pandemia do coronavírus se instalou ao redor do mundo, muitas séries decidiram adaptar seus roteiros dentro da nova realidade. Pessoas usando máscaras e evitando aglomerações foram colocadas em cena, quase um reflexo do que ainda vivemos do outro lado da tela. Dentre as séries médicas que abordaram o tema, uma se destacou: “Grey’s Anatomy” dedicou sua 17ª temporada inteira (17 episódios ao todo) à pandemia. No Brasil ela foi exibida pela Sony, que agora reprisa os episódios toda terça, às 21h.
Em paralelo, “Station 19” também estreou a quarta temporada abordando o tema pandêmico, mas com uma profundidade maior na questão racial. O derivado que se passa no mesmo universo de “Grey’s” apresenta a vida do corpo de bombeiros de Seattle salvando vidas, tal quais os médicos no Grey Sloan Memorial. Atenção, spoilers à frente.
Depois de uma discreta mesclagem de cenas com os episódios anteriores, “Grey’s” e “Station 19” rapidamente ajustaram seus horizontes para o que estava por vir: o enfrentamento na linha de frente durante a pandemia. Enquanto os médicos lidam com a escassez de suprimentos, o número de infectados e mortes aumenta. Já no derivado, a rotina dos bombeiros não está melhor. Além da pandemia, a série cresce ao colocar os personagens reagindo a noticia que revoltou muitos na vida real, a morte de George Floyd, um homem negro que foi morto quando um policial branco ajoelhou em seu pescoço.
Racismo e violência policial
“Station 19” deixa de ser uma série “mais do mesmo” e entrega sua melhor temporada até agora. O clima entre bombeiros e policiais está delicado, pouco antes do caso Floyd, a equipe enfrentou um caso de tráfico de crianças seguido de incêndio. Os policiais que chegam ao local não dão credibilidade às vítimas, que resulta em um embate com os bombeiros. Alguns deles são presos, mais especificamente os bombeiros negros.
Episódio por episódio, “Station 19” sai das sombras de sua original e cria roupagem própria, com direito a protestos do #VidasNegrasImportam e contra a violência policial. O assunto não morre em uma cena, o tema é importante e gera consequências até o último momento da temporada. No final de alguns episódios, nomes são expostos nos créditos, pessoas que cederam suas histórias para o programa. É a vida real nas telas, literalmente. O programa enriquece e traz reflexões que grudam na mente. Onde estamos e onde queremos chegar?
Covid-19
E se o objetivo é trazer cenas emocionantes, “Grey’s Anatomy” sabe exatamente como se faz. Dentro da realidade da pandemia, a série evidencia todos os seus pontos fortes que fizeram a popularidade do programa ser o que é. Homenagear os profissionais da saúde é um dos objetivos dos novos episódios. É impossível assistir aos episódios sem relacionar a qualquer notícia vista no telejornal ou nas redes sociais.
Todas as narrativas são apresentadas: o vírus se espalha rapidamente, não há tratamento eficaz nem vacinas, falta respiradores, número de mortes aumenta, principalmente entre pessoas pobres e negras – sim, o racismo também está aqui, com menos profundidade que no derivado, mas com novos aspectos para debate, principalmente sobre questões de classe social –. Também há pacientes negacionistas, aqueles que acreditam que o vírus é criação do governo, um artifício para que os médicos ganhem mais dinheiro.
Alguns médicos perdem entes queridos, outros são infectados e internados, como é o caso da nossa protagonista Meredith Grey (Ellen Pompeo). A partir dai, acompanhamos a saga de sua luta pela sobrevivência ao mesmo tempo em que temos vislumbres do que se passa na sua cabeça em uma experiência de quase morte, uma praia onde ela reencontrará antigos personagens já mortos nas temporadas anteriores.
Morte e Nostalgia
Dentro deste arco é trabalhada a falta de respiradores, a necessidade de intubação e a triste realidade de que não são todos que voltam depois disso. Assiste à temporada pode trazer de volta às angústias que vivemos na vida real.
Também é nesse aspecto que “Grey’s” traz um pouco de afago. George O’malley (T.R. Knight), Mark Sloan (Eric Dane) e Lexie Grey (Chyler Leigh) retornam para conversar com Meredith sobre vida e morte. O sentimento de saudade no público ajuda a deixar o recado, aqueles que amamos nunca nos deixam de fato. Mensagem importante em tempos tão difíceis.
Talvez o ápice esteja na aparição de Derek Shepherd. Ele e Meredith protagonizaram um dos grandes romances da TV americana, por isso talvez – diferente dos personagens citados a cima – sua volta tenha durado vários episódios. Decisão justificável, mas não a ideal. Os diálogos não duravam tanto, apenas o suficiente para dar o gostinho no público até o episódio final. Em exagero, o método ficou cansativo, irritante. Ainda assim, o fã raiz que acompanha a séries desde o começo reclama, mas no fundo ama.
Entre mortes chocantes, despedida de personagens antigos, retornos improváveis, temas importantes e uma boa dose de emoção, “Grey’s Anatomy” usou todas as armas para provar que ainda consegue arrancar nossas lágrimas. Mais do que isso, mostra que sempre tem mais a dizer e nós estamos sempre dispostos a ouvir.
“Grey’s Anatomy” já tem data de retorno. Sua 18ª temporada chega em 30 de setembro, nos Estados Unidos. Já sua derivada, “Station 19”, estreia a quinta temporada no mesmo dia. Até a publicação desta coluna, não há data para o lançamento de novos episódios nos serviços de streaming no Brasil.
*Fernando Martins é jornalista, escritor e grande entusiasta de produções televisivas. Criador do Uma Série de Coisas, escreve semanalmente neste espaço. Acesse o Portal, Podcast e redes sociais do Uma Série de Coisas neste link.
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