“Tell Me a Story” se aproxima da realidade ao excluir magia dos contos de fadas
Alguns pais costumam colocar suas crianças para dormir contando histórias infantis. Mais tarde, quando estão aprendendo a ler, os filhos são incentivados através de contos como Branca de Neve e Dumbo – como foi o caso de quem escreve esta coluna. Na fase adulta, o amadurecimento mostra que a vida real é bem diferente do que é mostrado nas fábulas, mas lobos e bruxas podem ser identificados em nossa sociedade de maneira adaptada. A nova série da CBS, “Tell Me a Story”, com Kevin Williamson (The Vampire Diaries) como produtor executivo, contextualiza os contos de fadas nos dias atuais de maneira interessante.
O trabalho de Williamson difere de várias outras versões já vistas pelo público e talvez pela lógica de identificação e aproximação, possa causar uma impressão mais positiva na audiência, já que ele apresenta uma versão contemporânea e realista dos contos infantis, o oposto, por exemplo, do que é mostrado por Edward Kitsis e Adam Horowitz em “Once Upon a Time”, onde a magia e o sobrenatural dialogam com a vida moderna.
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Na nova aposta da CBS, o foco se divide em três contos clássicos: Chapeuzinho Vermelho, João e Maria e Os Três Porquinhos. A abertura tem um estilo de ilustração que lembra as das Fábulas de Esopo e salienta a intenção de Williamson ao colocar os protagonistas das histórias fugindo de lobos e bruxas, mostrando que eles deixam para trás a inocência das produções da Disney e entram na realidade conturbada da vida adulta entre prédios e outdoors na cidade grande.
Quando pensamos nesses clássicos, é fácil distinguir os mocinhos e os vilões. Os personagens desenvolvidos em “Tell Me a Story” vão por um caminho alternativo do percorrido na maldade e sanguinolência que existe nas versões originais de Perrault (criador de Chapeuzinho Vermelho) e dos irmãos Grimm (João e Maria).
Na série, os três porquinhos passam de vítimas para vilões. O trio de assaltantes usam máscaras de porco para roubar uma joalheria, mas as coisas fogem do controle e uma mulher é morta. No arco, um dos criminosos é interpretado por Paul Wesley. O ator acabou de sair de “The Vampire Diaries” interpretando Stefan Salvatore e consegue se distanciar do papel que o deixou bastante popular entre os jovens. Seu personagem na série da CBS é perseguido pelo marido da vítima, interpretado por James Wolk (Zoo) fazendo alusão ao lobo do conto. Veja o trailer:
A narrativa segue em estilo Mise en abyme, uma vez que as histórias estão interligadas. A Chapeuzinho Vermelho da série, por exemplo, frequenta a mesma boate em que um dos assaltantes trabalha. Ela também tem um stalker que podemos vincular à figura de lobo e é interessante observar nesse arco as possibilidades de quem está seguindo quem. Aliás, a atriz também faz parte do universo de “The Vampire Diaries”, fãs da série vampiresca a reconhecem por Davina (Danielle Campbell), no spin-off “The Originals”.
As referências estão por todo lugar. A jovem Kayla (Campbell), ao contrário da protagonista das histórias infantis, não tem um relacionamento saudável com sua avó (Kim Cattrall, de Sex and the City) e a cor vermelha está sempre se fazendo presente: seja em objetos no quarto, na roupa ou no caminho que faz do colégio para casa – que não é da floresta para a casa da avó, tá? –, por vezes sendo observada. O clichê está garantido no relacionamento secreto de Kayla com seu professor, no estilo Arya e Ezra em “Pretty Litte Liars”.
Se na literatura dos irmãos Grimm, João e Maria são abandonados pelos pais, na série, Gabe (Davi Santos) e Hannah (Dania Ramirez) continuam com esse trauma. Quer “doce” melhor para um adulto do que um valor exorbitante de dinheiro? Quando Gabe entra em conflito corporal com um empresário rico após um happy hour com bebidas e drogas, Hannah rouba uma mala de dinheiro do local e tenta proteger o caçula a todo custo. Para nível de informação, Gabe trabalhar como stripper na mesma boate que Eddie, o barman que faz parte do assalto.
Para quem não dá a mínima para Paul Wesley no elenco – fato que com certeza ajuda a série a despertar o interesse da audiência saudosa pelos irmãos Salvatore – o tema é um prato cheio para as mentes nostálgicas que cresceram ouvindo histórias infantis, mas que não tem mais 10 anos de idade. “Tell Me a Story” cumpre seu papel quando expõe a realidade de uma sociedade contemporânea que se afasta do maniqueísmo, onde ora somos porquinhos indefesos, ora lobos sedentos guiados por um senso de justiça quase sempre questionável.
Fernando começou a assistir a séries de TV e streaming em 2009 e nunca mais parou. Atualmente ele acompanha mais de 200 produções e já assistiu mais de 6 mil episódios. A série mais assistida - a favorita - é 'Grey's Anatomy', à qual ele reassiste com qualquer pessoa que esteja disposta a começar uma maratona. Facebook: Uma série de Coisas. Instagram: @umaseriedecoisas. Twitter: @seriedecoisas_ Blog: Uma Série de Coisas.
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