A força e ascensão da cena LGBTI+ no brega
Em celebração ao Mês do Orgulho LGBTI+, a Folha de Pernambuco traz entrevistas com Eliza Mell e Byanka Nicoli
Nos últimos dois anos, a exaltação ao masculino, à corporalidade negra e à figura central em cantores homens do brega, principalmente no brega-funk, pode ser acompanhada de perto quando analisamos números, visibilidade e retorno midiático. Assim como em outras expressões culturais que nascem da periferia, o gênero também tem sido palco para a diversidade de gênero e sexualidade. Essa movimentação pode ser vista de múltiplas formas: nas redes sociais, nos palcos e nas plataformas de streaming. Em celebração ao Mês do Orgulho LGBTI+, a Folha de Pernambuco traz entrevistas com duas vozes importantes para este movimento: Eliza Mell e Byanka Nicoli.
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O “gogó” e a força de Eliza Mell
Foto: Emília Mell/Divulgação
A pernambucana Eliza Mell, de 42 anos, tem a força, voz e personalidade necessárias que compõem uma diva clássica do R&b norte-americano. Não é estranho ela já ter citado Mariah Carey, Whitney Houston e Beyoncé como referências, nesta e em entrevistas anteriores. As semelhanças podem ser sintetizadas no canto cheio de melismas em “ânsia”, música pela qual ela ficou conhecida ao liderar a banda Brega.com, no início dos anos 2000. Contudo, no retorno ao estrelato da música popular pernambucana, há mais ou menos quatro anos, ela teve uma surpresa: sua figura de “diva” e seu clássico foram adotados pela comunidade LGBTI. “Até os bares que só iam héteros, a gente foi notando um acolhimento pela comunidade”, conta Eliza.
O processo foi uma recomeço para ela, tanto na carreira quanto na exposição da sexualidade. Enquanto cantava, ia sendo cada vez mais acolhida pelo público das festas e boates voltadas à sigla. Lésbica assumida, hoje é casada com a fotógrafa Emília Mell, de 28 anos, que também a acompanha na jornada. “Ela é maravilhosa. A doida e a braba da relação sou eu, né (risos)? Ela é massa, cuida de mim, muito tranquila. Eu encontrei muito apoio na família de Emília. A família dela é maravilhosa, e hoje como não tenho pai e mãe, tenho a mãe dela como a minha”, enfatiza a cantora, que celebra o momento com dois filhos: uma menina, de 11 anos, e um menino, de 5.
Desde que viralizou com o vídeo “Tem gogó?” - em uma resposta, na época, à cantora Michelle Melo -, Eliza Mell constrói uma carreira sólida com a girlband Amigas, junto às cantoras Dayanne Henrique e Dany Myler. Populares nos palcos e nas redes sociais, as artistas frequentemente usam suas vozes em apoio à comunidade, principalmente periférica. “Minha relação com as meninas e a banda é maravilhosa, tenho muito apoio. Eu desejo que as pessoas que me acompanham e fazem parte da comunidade sejam felizes, ponham a cara na rua para a gente fechar. Infelizmente, nem todo mundo encontra apoio e suporte, mas eu desejo que as pessoas não tenham medo mais”, ressalta Eliza Mell à comunidade que apoia e dá suporte a seu trabalho.
A voz do WhatsApp, Byanka Nicoli
Há quase três anos, a vida de Byanka Nicoli, 30, mudou por causa de vazamentos de áudios de um grupo em participava com amigos no WhatsApp. Eram materiais bem humorados sobre sua rotina - entre ser trabalhadora de uma fábrica e estudante de Enfermagem -, festas, sermões nos amigos e a relação com a mãe. "Amanhã vai ser babado, viado. A piscina de Nininha gera, viu? Rafael vai cantar e a entrada é R$ 12. Só GLS. Só vai quem curte", bradava em um dos primeiros virais a circular pela internet. Em um curto espaço de tempo, a mulher, até então de rosto desconhecido, era uma das vozes mais reproduzidas nos celulares pernambucanos.
Não demorou muito para o rosto de Byanka Nicoli ser reconhecido. A mulher trans, de Nazaré da Mata, na Mata Norte de Pernambuco, passou a ser conhecida em rede nacional, com milhares de seguidores em suas redes sociais. Em seguida, foi chamada para a música e também participar de shows. Tem gravações, como “Bichinha Maluca”, com Lekinho Campos; “Marinas”, com MC Lia; e “Elas estão enlouquecendo”, em parceria com Johnny Hooker. “Nesse tempo, já viajei a convite para São Paulo, Fortaleza, João Pessoa, Natal, Salvador, Maceió (entre outras..)”, conta Nicoli à Folha.
Após o sucesso inicial, Byanka continua sendo fenômeno. No Instagram, rede em que tem mais força, acumula mais de 240 mil seguidores. Lá, expõe a rotina, conversa com os fãs e faz propaganda para empresas locais e nacionais. Além disso, ela é figura marcada na cena do brega e do forró. Priscila Senna, Tayara Andreza, As Amigas, Amigas do Brega, MC Troia e Saia Rodada foram alguns dos que já a apresentaram no palco para os seus fãs. Ela frisa o fato de ser uma representante do movimento, que vem do interior do Estado, e está ocupando outros espaços. “Eu quero dizer que nós existimos, nós vamos resistir e existir sempre. Nunca faltou, sempre tem! E ninguém vai entender nada. E elas falam mal, viu? E grite seu nome!”, ressalta com seus famosos bordões.