"Afropaty": expressões usadas por Brunna Gonçalves e Ludmilla definem empoderamento da mulher preta
Termos foram criados pelo casal e passaram a ser adotados por outras mulheres
“Troco de cabelo, igual troco de roupa”. Bailarina e empresária, Brunna Gonçalves se apresenta assim em seu perfil no Instagram, seguido por mais de seis milhões de pessoas. Ela e a cantora Ludmilla, com quem é casada desde 2019, são meninas superpoderosas, daquelas que influenciam multidões nas redes sociais e nos palcos. Exercem seu poder com um jeito de ser sem amarras, e sempre apontando tendências. Na moda, agora encarnam dois lados da mesma moeda, a do empoderamento da mulher preta: são a afropaty e a nega doce. Bruna (que “troca de cabelo, igual troca de roupa”) joga no primeiro time. Já Ludmilla faz o outro tipo.
Afropaty é o estilo adotado por mulheres pretas que gostam de se vestir de forma mais delicada, usando laces (uma espécie de peruca), sem abrir mão da criatividade — e nem do salto, é claro. As negas doces, por outro lado, esbanjam atitude, mas não deixam de lado o conforto street, a moda das ruas, que tem como acessórios principais a calça larga, o tênis e tranças no cabelo.
Um casal acompanhado por onde vai, Brunna e Ludmilla aparecem constantemente juntas. Diante das câmeras, cada uma brilha no seu estilo. Lud prefere roupas mais despojadas e lenços, enquanto Brunna gosta de vestidos justos, monocromáticos e saltinhos.
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"Nesse calor do Rio, a dica é usar shortinho e cropped. Abusar da transparência também está valendo. Para ser afropaty no carnaval vale usar muito brilho", ensina Brunna.
O estilo afropaty vem de mais longe do que se imagina. Hilary, Vivian e Ashley Banks, personagens da série americana “Um maluco no pedaço”, exibida nos anos 1990, foram pioneiras referências de mulheres negras empoderadas social e financeiramente. Naquela década, o trio fez belo contraponto à comédia “As patricinhas de Beverly Hills” (1995), estrelada pela louríssima atriz Alicia Silverstone.
Como bem-vindo sinal dos tempos, o estilo afropaty chegou aos dias de hoje dando menos bola para a riqueza e mais atenção ao crescimento, ao sucesso, sem perder a ternura.
"O termo afropaty vai além de roupa de grife, bolsinha, saltos. Acho que diz mais sobre expressar o direito enquanto mulher preta e mostrar seu lugar de poder. Eu não conhecia o termo até ver um vídeo de uma menina explicando na internet, e me usando como exemplo. Fui estudar e super me identifiquei. Amo. A Lud também super se identificou quando foi chamada de nega doce. Com certeza, independentemente do estilo, essa troca vem sendo construída para valorizar a beleza preta", diz Brunna.
Ela exercita seu estilo eclético e ousado em produções de look e no brechó Peça rara, de moda circular (orientado por práticas sustentáveis) que abriu, inspirado nas culturas pop e afro.
"Lá fora, essa prática é muito forte. Amei a ideia e mergulhei de cabeça. Está dando certo porque a moda circular está super em alta. É possível ter estilo afropaty economizando e usando boas peças e com preços acessíveis. Todo mês eu monto uma arara minha na loja, com roupas que usei no BBB ou peças ainda na etiqueta", revela.
Representação
Você pode até achar que, para Brunna e Lud, hoje, as coisas são mais fáceis, mas as irmãs e influenciadoras Mariana e Ana Flávia Lobo, que desde 2020 usam as redes sociais para falar da cultura da mulher preta, afirmam que a tendência chegou para ficar. Crias de Campo Grande, na Zona Oeste, elas garantem que termos como afropaty e nega doce contribuem para ressignificar a beleza e a força da mulher preta.
"Tínhamos pouca representação da beleza preta. Era difícil entender se a gente encaixava em algum grupo. Olhava as garotas da revista ou das redes sociais e pensava que elas não tinham nada a ver comigo. De um tempo para cá, a gente tem visto esse movimento de pessoas que pegam a cultura afro e trazem isso para a moda. A afropaty é uma forma de trazer esse estilo mais menina para as mulheres pretas. Que durante muito tempo eram vistas de forma sexualizada, e não estilosa", conta Ana Flávia, que atraiu mais de 300 mil seguidores no Instagram e, curiosamente, se identifica com o estilo nega doce.
Misturar também vale
Mariana cursou Serviço Social na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e Ana Flávia estudou Direito na UFRJ. Sempre muito próximas, as duas irmãs já sentiram juntas na pele a cobrança de estar num lugar de não pertencimento.
"No começo, era difícil saber qual estilo seguir. Mas essa tendência nos ajudou a criar uma identidade", afirma Mariana.
A nega doce tem sempre dois curingas no armário: calça larga com cropped. No lugar da tiara no cabelo, prefere boné ou óculos escuros. Bebe cervejinha gelada, enquanto a afropaty curte um gim.
"Tem dias que eu quero usar uma calça mais larga e um saltinho. E está tudo bem. Misturar os dois estilos também está valendo. O importante é ver mulheres pretas se amando e se reconhecendo umas nas outras", decreta Ana Flávia.