Brasileiros em Cannes protestam contra Bolsonaro: 'Fora, gângster genocida'
Equipes de quatro filmes brasileiros no festival fizeram uma faixa com mensagem contra o governo e as mortes na pandemia
"Brasil: 530.000 mortos. Fora, gângster genocida". Estas foram as palavras de ordem numa imensa faixa vermelha erguida em protesto contra o governo brasileiro nesta noite de sexta (9) no Festival de Cannes.
Organizada pelas equipes de quatro obras brasileiras em exibição na cidade francesa neste ano, a manifestação foi feita logo após a exibição do filme "O Marinheiro das Montanhas", do diretor cearense Karim Aïnouz --que em 2019 ganhou em Cannes o principal prêmio da competição Um Certo Olhar, com "A Vida Invisível".
Aïnouz, no discurso de apresentação que fez antes do início da sessão, também expressou seu descontentamento com a situação atual do Brasil: "a democracia brasileira está em condição crítica, vivendo com a ajuda de aparelho". Ele completou que há inúmeras produções audiovisuais paralizadas no país "num ato calculado do governo genocida".
Leia também
• Spike Lee chama Bolsonaro de gângster na abertura do Festival de Cannes
• Cannes volta em formato presencial com cineastas consagrados
Os protestos, tanto no início quanto no final da sessão, foram recebidos em meio a gritos de "Fora genocida" e palmas das centenas de espectadores que lotavam a sala em que o filme de Aïnouz foi exibido.
A intenção de protestar contra a má gestão da pandemia pelo governo Bolsonaro apareceu assim que foi anunciada a seleção de curta-metragens do festival, conta Ricardo Mordoch.
Ele é produtor de "Céu de Agosto", um dos dois selecionados para a competição pela Palma de Ouro dessa modalidade, ao lado de "Sideral". Um terceiro filme brasileiro, "Cantareira", está sendo exibido na seção Cinéfondation, dedicada a curtas universitários.
"Fizemos um grupo de conversa numa rede social e começamos a nos articular, porque nos sentiríamos muito desconfortáveis se viéssemos a Cannes sem protestar, nesse momento de horror por que passa o Brasil", disse ele.
Mordochi diz que o foco do protesto são as mais de 500 mil mortes provocadas pela Covid-19, mas que haveria motivos suficientes para que cada um dos cerca de 20 membros das três equipes "denunciasse um descalabro específico". "A pandemia é a mais urgente e mais impactante, mas há tragédias na cultura, na educação, no meio-ambiente, em todos aspectos", afirma.
Sob investigação em uma CPI no Congresso, o governo Bolsonaro é suspeito de ter falhado no combate à pandemia no Brasil em várias áreas.
Segundo advogados, suspeitas como a de descaso na aquisição das vacinas, tentativa de alterar a bula da cloroquina para que o medicamento fosse prescrito como tratamento da Covid-19 e a formação de um "gabinete paralelo" para aconselhamento do presidente podem embasar acusações criminais.
Outro episódio apontado por advogados é o da falta de oxigênio em Manaus, caso seja provado que houve má gestão do governo federal. Bolsonaro também tem criticado a adoção de medidas para controlar o contágio, como o uso de máscaras ou a restrição de circulação, além de levantar dúvidas sobre a importância da imunização e promover aglomerações.
Na cultura, sua gestão tem se caracterizado pelo corte de linhas de financiamento e a paralisação de recursos destinados à área, o que levou insegurança à indústria audiovisual, da qual uma parte protesta agora em Cannes.