Chico Buarque: leia trecho de "Bambino a Roma", novo romance do autor
Título entrou em pré-venda no aniversário do autor e será lançado dia 1 de agosto
O novo romance de Chico Buarque, “Bambino a Roma”, é inspirado em sua infância italiana. Em 1953, o pai de Chico, Sérgio Buarque de Hollanda, autor de “Raízes do Brasil”, foi convidado para dar aula na Universidade de Roma. A família viveu por lá até 1960.
Um comunicado da Companhia das Letras, que edita o livro, afirma que “Bambino a Roma” se equilibra “entre a lembrança e a imaginação”. “Nesse passeio delicado, vislumbres da relação com o pai, a mãe e os irmãos somam-se às experiências formativas projetadas por um narrador às voltas com o passado”, diz o texto.
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Trecho
...Rever a sala de visitas tal como era, sem tirar nem pôr, me dá uma tremedeira nas pernas.
Meus olhos se enchem de lágrimas vendo os afrescos da Capela Sistina no papel de parede da sala inteira.
Quando criança eu pouco me detinha naquele am biente, nunca me sentei em seus sofás de veludo e suas poltronas rococó. Eu morria de medo daquelas figu- ras nuas e seminuas, principalmente as do teto. O teto traz A Criação de Adão, e onde os dedos de Adão e Deus quase se tocam ainda está fixada a canopla do lustre que Nadine acendeu. Agora ela abre as janelas, cata copos e cinzeiros no chão, deita garrafas nos sacos de lixo e some lá para dentro. Da porta de entrada reconheço as laterais da sala, que representam cenas da vida de Moisés e de Jesus Cristo, e ao fundo avisto um vestígio do telefone de parede marcando o papel de parede que retrata o Dia do Juízo Final. Se o resto do apartamento estiver igualmente preservado, logo à esquerda estará o lavabo e à sua frente o corredor - que leva ao escritório, à porta da casa de Nero e aos sucessivos quartos até a cozinha e a área de serviço.
No entanto, não consigo arredar pé daquele umbral, não consigo ultrapassar o batente da porta escancarada. Meu corpo oscila, recuo, me pego a andar para trás. Sinto que é a minha mãe me puxando pela gola.