Cinema de rua: retomada aponta resgate da história no Estado
Em Pernambuco, 101 cinemas de rua já existiram em seu auge, apontando uma descentralização da arte fora da capital
Há quatro gerações, o prédio branco que ocupa a lateral da Praça João Pessoa, no bairro do Carmo, passa despercebido por transeuntes e turistas que frequentam o Sítio Histórico de Olinda. Fundado há 109 anos, sob o nome de Cine Theatro Variedades, o atual Cine Olinda está fechado há 40 anos. Com a ideia de retomar as atividades da casa, a Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) enviou ofício à Prefeitura de Olinda com uma proposta para assumir a gestão do equipamento cultural, no início deste mês. A sinalização de retorno do cinema reacende a importância que salas de exibição e cine teatros públicos tem na descentralização da sétima arte na Região Metropolitana do Recife.
No ofício, o presidente da Fundaj, Antônio Campos, esclarece que, se for do interesse da gestão municipal, a instituição viabilizará estudos técnicos e financeiros para o projeto do cinema. “A Fundaj tem tradição de 20 anos em gestão de cinema, com dois em funcionamento e tendo assumido, recentemente, o Cinema do Porto Digital, que abrirá ao público em dezembro. Temos equipe especializada para assumir esse desafio”, disse o presidente em nota. A carta foi endereçada ao prefeito da cidade, Professor Lupércio, e ao secretário de Patrimônio e Cultura, João Luis da Silva Júnior.
O cinema, inclusive, foi o mote do movimento sociocultural Ocupe Cine Olinda, em 2016. Durante três meses, militantes e movimentos sociais reivindicaram a retomada do equipamento público, que estava abandonado. Durante o período, foram desenvolvidas atividades culturais, que integravam cinema, cineclubes, espetáculos teatrais e de dança, além de debates sobre a recuperação do cinema de rua no Estado. Em 2018, a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) chegou a lançar um edital para a requalificação do espaço, orçada pela instituição em R$ 1.627.866,17, mas não passou dessa etapa.
Em nota, a Fundarpe informou que está disposta a auxiliar a Fundaj na recuperação do cinema, que é tombado a nível federal. "Sobre o Cine Olinda, patrimônio tombado em nível federal e de propriedade da prefeitura local, a Fundarpe ressalta a importância cultural do equipamento para o município e vê como positiva a proposta levantada pela Fundaj para financiar o restauro, a requalificação, bem como a gestão do cinema. A Fundarpe acrescenta ainda que está à disposição para compartilhar as informações e dados técnicos do Cine Olinda que dispõe.", diz a nota.
Legado
A recuperação do cinema olindense é um passo para entender a importância desses equipamentos. Em 1968, Pernambuco possuía 101 cinemas ativos em todo o seu território. Alguns deles, localizados na então zona metropolitana, servindo como diversão para as populações afastadas do Centro da Capital. Um deles é o Cine teatro Samuel Campelo, no Centro de Jaboatão dos Guararapes, que ficou sem funcionar durante duas décadas. “Eu assumi em fevereiro deste ano, mas durante todo o ano passado pude acompanhar as atividades desenvolvidas no cine. Em 2019, tivemos um público total de 34.612 mil pessoas, que acompanharam oficinas de teatro, de música, de dança e as exibições de filme no local”, conta o supervisor do equipamento, Carlos Lira.
O equipamento público foi retomado pela Prefeitura de Jaboatão, em 2015, após o fechamento nos anos 2000. Hoje, o Sesc Piedade faz a administração do cinema, desenvolvendo atividades com a comunidade local, “Nas segundas e quartas-feiras tínhamos exibições de cinema. Duas gerações não puderam frequentar o teatro na sua faixa de idade. Então, nesta retomada, tínhamos um pouco de dificuldade para trazer esse público de volta”, explica Carlos.
Outro equipamento retomado foi o Cinema da UFPE, no Centro de Convenções (Cecon) da Universidade Federal de Pernambuco. Pronta no fim do ano passado, a sala de exibição é a primeira da Zona Oeste do Recife, com o propósito de atingir a comunidade acadêmica e os bairros do entorno do campus. “Começamos com uma programação experimental, gratuita, e aderindo a festivais que já aconteciam na Cidade. Paramos depois da pandemia, mas temos uma premissa de programação, que é a prioridade do cinema nacional e outras cinematografias exploradas no cinema comercial”, enfatiza a coordenadora do Cinema da UFPE, Manuela Costa.