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Em alta na cultura pop, "fubangas" superam estigma e viram símbolo de empoderamento nas redes

Com a cantora Anitta e a Roxelle da novela "Volta por cima" como referências, tendência consagra roupas justas e visual maximalista: "Desafia um mundo padrão e polido", diz influencer adepta do estilo

A cantora Charli XCX e Anitta, e Bruna Marquezine como Lurdinha, em "Salve Jorge"A cantora Charli XCX e Anitta, e Bruna Marquezine como Lurdinha, em "Salve Jorge" - Foto: Redes Sociais/Reprodução/Divulgação

Adepta de saias justas, decotes profundos e maquiagem vistosa, a modelo, empresária e influencer Marcela Carrasco se apresenta em seus vídeos como fubanga — um termo capaz de gerar tanto preconceito quanto entusiasmo.

Durante décadas, ele foi usado de forma depreciativa e discriminatória, para rotular mulheres “descuidadas”, “malvestidas”, “vulgares” e “cafonas”.

Mas, para Marcela e parte de seus 460 mil seguidores nas redes, a gíria deu a volta por cima e virou sinônimo de ousadia, confiança e empoderamento.

A paulista, de 28 anos, é uma das principais vozes do fubangacore, uma tendência que se espalhou na web e na cultura pop, exaltando o estilo e a personalidade de mulheres hiperbólicas.

Entre os ícones atuais dessa onda, estão a cantora Anitta e a personagem Roxelle, da novela “Volta por cima”, da TV Globo.

Interpretada pela atriz Isadora Cruz, a personagem samba na cara da sociedade com seus figurinos maximalistas, que incluem collants cavados, botas jeans e muitas roupas transparentes.

"A fubanga desafia um mundo padrão e polido" diz Marcela, que trata o fubangacore como um movimento tanto estético quanto político.

"Ela está ganhando força nas redes porque vai contra o esperado, abraça a sua própria identidade e quer ser valorizada pelo que ela é. Eu, por exemplo, fiz tudo da minha maneira para chegar aonde cheguei, e por isso quero me vestir como eu quero, me empoderar como eu quero e ser gostosa como eu quero"

Periguetes precursoras
Como referência, a empresária cita algumas personalidades que “vivem suas estéticas e não estão nem aí”, como a cantora inglesa Charlie XCX ou a atriz e modelo ítalo-americana Julia Fox.

Já no Brasil ela aponta as famosas periguetes das novelas dos anos 2000, como a Bebel de “Paraíso tropical” (2007) e a Lurdinha de “Salve Jorge” (2012) — interpretadas, respectivamente, por Camila Pitanga e Bruna Marquezine.

Elas promoviam o “orgulho fubanga” de maneira precursora, muito antes de ele virar modinha.

Responsável pelos looks de Bebel e Lurdinha, a figurinista titular da TV Globo Natália Duran ajudou a moldar o imaginário desse arquétipo feminino na cultura brasileira.

Ela era assistente de figurino em “Quatro por quatro” (1994), quando a Babalu de Leticia Spiller popularizou os shorts jeans e os croppeds estampados.

Vinte anos depois, a profissional está à frente da identidade visual de Roxelle em “Volta por cima”.

"Muitas novelas revisitaram esse estilo de mulher, mas nunca da mesma maneira" diz Natália, que ainda tem no currículo periguetes como a Rakelli de “Beleza pura” (2008) e a Suelen de “Avenida Brasil” (2012).

"Cada fubanga se veste de forma única, construindo a sua própria identidade. O que todas têm em comum é pegar peças que você acha que vão ficar horríveis e, no fim, fica lindo. É um estilo muito latino, que evoluiu até chegar na Anitta, a rainha das fubangas"

Garimpo em camelôs
Quando criou o visual da personagem Bebel, em 2007, Natália buscou inspiração em nichos como o pole dance.

O guarda-roupa inteiro da romântica garota de programa foi garimpado nos camelôs de Copacabana, conta a figurinista.

Não por acaso, as cenas de Bebel em “Paraíso tropical” viralizaram no TikTok, e novas gerações ressignificaram a personagem como símbolo de empoderamento.

Já, para elaborar Roxelle, Natália mergulhou na moda do subúrbio, o habitat — geográfico e espiritual — da personagem.

Alguns dos itens mais representativos são um top de couro vermelho (descolado em um brechó), collants anos 1980 no estilo “capa de disco da Xuxa” e muitas botas (um símbolo “megafubanga”, de acordo com a figurinista).

Por fim, não podia faltar o choker (espécie de gargantilha), um acessório clássico das fubangas de Natália.

"Essas personagens ajudam a mudar a conotação negativa e machista do termo fubanga" defende a figurinista. 

"A Claudia Souto (autora de “Volta por cima”) fez da Roxelle uma mulher romântica, empreendedora, cheia de sonhos. Ela é uma garota confiante, mas que não quer sacanear os outros. Tudo isso tira a fubanga da vulgaridade e a coloca no lugar do amor"

O mix de fubanguismo e romantismo está presente em “Intocável”, novo single da cantora Monik da Moda (nascida Monik Carraschi Nogueira), sobre uma jovem confiante que sofre com a falta de iniciativa de seu interesse amoroso.

“Intocável, eu sou assim/ Vestido curto e saia jeans/ O que eu tô bonita é exagero”, canta a paranaense, de 24 anos, que coloca a mulher fubanga no centro das atenções.

“Dizem que eu eu sou a protagonista/ Então por que você não vê?”, indaga ao crush a artista, que no clipe da canção veste cropped prateado e saia jeans na balada.

Para Monik, o fubangacore surgiu como uma resposta à clean girl, que por muito tempo dominou sozinha as convenções com seu visual básico e minimalista.

"Acho que houve um cansaço dessa busca pela perfeição que representava a clean girl" avalia a cantora, que também é estudante de moda. 

"A fubanga admite que é imperfeita. Ela não tem o cabelo milimetricamente arrumado, mas está superbem com isso e se acha o máximo do mesmo jeito. Como vários artistas estão aderindo ao estilo, o movimento hypou"

Britney e Furacão 2000
Monik acredita que diversos fatores tornam o fubanguismo cultural um “ato político”:

"Quando a fubanga bate no peito e diz que vai usar a roupa que quer e não a que está na moda, rompe com o consumo desenfreado e adere à sustentabilidade. Fora que a fubanga também é muito bem resolvida sexualmente, e a gente sabe o preconceito que existe contra mulheres que gostam de expressar sua sexualidade"

Para a analista de moda Paula Accioly, a fubanga é uma versão atualizada das estéticas vigentes dos anos 2000 e 2010, desde a cena pop americana (representada por cantoras como Britney Spears, Chistina Aguilera e Hillary Duff) aos looks dos bailes funks da Furacão 2000.

"O retorno de estéticas de décadas passadas em releituras é algo recorrente na moda e acontece por diversas razões, muitas vezes provocadas por gatilhos" explica ela.

"No caso das fubangas, percebemos indicadores interessantes, como a curiosidade natural das novas gerações, potencializada pela exposição nas redes sociais, por estilos de décadas passadas. Assim, se uma tendência até pouco tempo atrás era considerada cafona ou brega, o mindset agora é outro: pode ser considerada hipster, cool e hype"

Marcela Carrasco aponta uma interseção entre o fubangacore e o brat, gíria de língua inglesa que batizou o último álbum de Charli XCX e se tornou fenômeno viral em 2024.

A palavra, que originalmente designava uma pessoa desobediente, petulante ou teimosa, passou a representar uma atitude segura, independente e despreocupada após o sucesso do disco de Charli.

Na letra do single “360”, a cantora britânica assume suas imperfeições e se nega a ser uma “garota modelo”. “Eu fiz tudo do meu próprio jeito e venci”, entoa ela.

"O fubangacore e o brat se encontram nesse jeito de ser rebelde e no desinteresse em agradar os outros" diz Marcela. "A fubanga até pode ser mais sexy e empoderada, mas as duas tendências se conectam na provocação de não seguir regras"

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