Elza Soares morre no Rio de Janeiro, aos 91 anos
A página oficial da cantora Elza Soares publicou, na tarde desta quinta-feira (20), uma nota de pesar pelo falecimento da artista. Segundo informa a página, ela morreu de "causas naturais", às 15h45, em sua casa no Rio de Janeiro. Curiosamente, Elza Soares faleceu na mesma data que seu ex-marido Mané Garrincha, que morreu no dia 20 de janeiro de 1983.
"É com muita tristeza e pesar que informamos o falecimento da cantora e compositora Elza Soares, aos 91 anos, às 15 horas e 45 minutos em sua casa, no Rio de Janeiro, por causas naturais. Ícone da música brasileira, considerada uma das maiores artistas do mundo, a cantora eleita como a Voz do Milênio teve uma vida apoteótica, intensa, que emocionou o mundo com sua voz, sua força e sua determinação. A amada e eterna Elza descansou, mas estará para sempre na história da música e em nossos corações e dos milhares fãs por todo mundo. Feita a vontade de Elza Soares, ela cantou até o fim”, diz a nota assinada por Pedro Loureiro, Vanessa Soares, familiares e Equipe Elza.
Biografia - Elza Soares (1930 - 2022)
Com a vida marcada por um série de tragédias e muita resiliência, Elza Soares se tornou um símbolo da luta contra o machismo e o racismo. Sua história de vida e o espaço de destaque que conquistou na música brasileira deram relevância à sua voz.
Elza Gomes da Conceição nasceu em 23 de junho de 19430, em uma família muito humilde com dez irmãos, na favela da Moça Bonita, atualmente Vila Vintém, no bairro de Padre Miguel. Ainda pequena mudou-se para um cortiço no bairro da Água Santa, onde foi criada.
Quando era pré-adolescente foi obrigada pelo pai a abandonar os estudos e casar-se com Lourdes Antônio Soares, um amigo de seu pai conhecido como Alaordes, que havia tentado abusar de Elza - o pai acreditava que "a honra de sua filha só estaria limpa com o casamento".
Elza sofreu muito neste matrimônio arranjado, por conta da violência doméstica e sexual a qual era constantemente submetida. Aos quinze anos de idade, ela passa por outro grande trauma: seu segundo filho morreu de fome.
Com o marido doente, acometido por tuberculose, passou a trabalhar como encaixotadora e conferente na fábrica de sabão Véritas, no Engenho de Dentro. Elza também trabalhou em um manicômio, o Instituto Municipal Nise da Silveira (atual Museu de Imagens do Inconsciente), onde não só conseguia um salário mas também um pouco de comida, que ela furtava pouco antes do local ser fechado e os funcionários voltarem para casa.
Com a recuperação do marido, um ano depois, ele a proibiu de trabalhar fora novamente, e Elza voltou a ser dona de casa. Aos dezoito anos, oficializou seu matrimônio, passando a assinar Elza da Conceição Soares, seu sobrenome artístico posteriormente.
Em 1950, sua filha recém nascida Dilma foi sequestrada. O casal que tomava conta da menina enquanto Elza trabalhava sumiu com a neném de um ano de idade. Foram trinta anos de busca, com policiais e detetives à procura. Elza, sempre triste e angustiada, só reencontrou a filha já adulta, que não sabia de nada. Com o tempo, se aceitaram como mãe e filha. Como o crime prescreveu, o casal não foi preso. Mesmo com revolta e dor, perdoou os sequestradores de sua filha, já que a criaram muito bem.
Discografia
Se acaso você chegasse (Odeon, 1960)
A bossa negra (Odeon, 1960)
O samba é Elza Soares (Odeon, 1961)
Sambossa (Odeon, 1963)
Na roda do samba (Odeon, 1964)
Um show de Elza (Odeon, 1965)
Com a bola branca (Odeon, 1966)
O máximo em samba (Odeon, 1967)
Elza, Miltinho e samba (Odeon, 1967)
Elza Soares, baterista: Wilson das Neves (Odeon, 1968)
Elza, Miltinho e samba - vol. 2 (Odeon, 1968)
Elza, carnaval & samba (Odeon, 1969)
Elza, Miltinho e samba - vol. 3 (Odeon, 1969)
Samba & mais sambas (Odeon, 1970)
"Maschera negra / Che meraviglia" (compacto simples / lançado na Itália, 1970)
Elza pede passagem (Odeon, 1972)
Sangue, Suor e Raça (Odeon, 1972) - c/ Roberto Ribeiro
Elza Soares (Odeon, 1973)
Elza Soares (Tapecar, 1974)
Nos braços do samba (Tapecar, 1975)
Lição de vida (Tapecar, 1976)
Pilão + Raça = Elza (Tapecar, 1977)
Senhora da terra (CBS, 1979)
Elza negra, negra Elza (CBS, 1980)
"Som, amor trabalho e progresso / Senta a púa" (compacto simples / RGE, 1982)
"Alegria do povo / As baianas" (compacto simples / Recarey, 1985)
Somos todos iguais (Som Livre, 1985)
Voltei (RGE, 1988)
Trajetória (Universal Music, 1997)
Carioca da Gema - Ao vivo (1999)
Do cóccix até o pescoço (Maianga, 2002)
Vivo feliz (Tratore, 2003)
Beba-me - Ao vivo (Biscoito Fino, 2007)
A Mulher do Fim do Mundo (Circus, 2015)
Deus É Mulher (Deckdisc, 2018)
Planeta Fome (Deckdisc, 2019)
Coletâneas
Grandes Sucessos de Elza Soares (Tapecar, 1978)
Salve a Mocidade (Tapecar, 1997)
Meus Momentos – Volumes 1 & 2 (EMI Brasil, 1994)
Elza Soares – Raízes do Samba (EMI Brasil, 1999)
Sambas e mais sambas - vol. 2 (Raridades) (EMI Brasil, 2003)
Deixa a nega gingar - 50 anos de carreira (EMI Brasil, 2009)
Casamento com Garrincha
Elza conheceu o craque do Botafogo e seleção brasileira Garrincha em 1962, e os dois iniciaram um romance, mesmo sendo ele casado. Após um ano juntos, ela pediu para que ele tomasse uma decisão: ou assumiria ela, ou ela o abandonaria. Meses depois, ele veio procurá-la, afirmando ter saído de casa e desquitado-se da esposa.
Começaram a namorar, mas sem revelar nada a imprensa, sabendo da provável repercussão negativa. Quatro anos depois do namoro, em 1966, decidiram morar juntos. Poucos meses depois, oficializaram a união, quando passou a assinar Elza Gomes da Conceição dos Santos. Para fugirem do assédio da imprensa, venderam a casa no Rio, e Elza mudou-se com os filhos e o marido para São Paulo. A perseguição chegou a tal ponto que Elza foi impedida pela multidão de realizar um show na Mangueira e teve de sair disfarçada para escapar do público.
Ainda no Rio, Elza e Garrincha foram passar uns dias no sítio de Adalberto, então goleiro do Botafogo. Uma noite, ao ouvir tiros, Elza correu pela casa e levou um tombo, após o qual descobriu que havia perdido um bebê que ela nem sabia que estava esperando. Na nova casa onde moravam, na Ilha do Governador, Elza e Garrincha sofriam ataques anônimos como pedras arremessadas contra a residência. O primeiro ataque invasivo foi realizado pelo DOPS em 20 de junho de 1964, que entrou na casa da família à noite, rendeu todos os moradores, revirou o interior do imóvel e executou o mainá de estimação de Garrincha.
Elza nunca soube o real motivo da invasão, mas suspeita de sua amizade com Juscelino Kubitschek e/ou do fato de ter se juntado a vários outros artistas para gravar uma música pró-João Goulart. Os ataques foram aumentando e a família de Elza passou a receber cartas e ligações telefônicas com xingamentos e ameaças. Na mesma época, Elza gravou o samba "Eu Sou a Outra", cuja letra enfureceu ainda mais a imprensa e a opinião pública; radialistas quebravam o disco com a canção no ar, uma medida comum na época para expressar descontentamento com uma nova música.
Mudaram-se para uma casa no Jardim Botânico, mas as ameaças e os ataques se intensificaram, culminando em uma aparente tentativa de sequestro, da qual conseguiram escapar, e um atentado a tiros contra a casa deles. Quando o empresário Franco Fontana convidou Elza para uma temporada na Itália, a família se mudou para Roma.
Com a morte da esposa anterior de Garrincha, Elza decide adotar as seis filhas do jogador, que vão morar com ela, Garrincha e seus filhos. Em uma viagem ao Rio para gravar um disco, Elza descobre estar grávida de Garrincha. Em 9 de julho de 1976, nasce Manoel Francisco dos Santos Júnior, apelidado de Garrinchinha.
Garrincha havia prometido a Elza que pararia de beber caso ela lhe desse um menino, mas ele quebrou a promessa logo após o nascimento. Um dia, Elza o flagrou alcoolizado segurando o filho deles por uma perna e ameaçando jogá-lo escada e decidiu deixá-lo, mesmo sabendo que era tudo uma brincadeira.
Em 1982, após dezesseis anos de matrimônio, o casamento de Elza e Garrincha chegou ao fim, por conta de constantes agressões físicas, ciúmes doentios, traições e humilhações, onde o alcoolismo de Garrincha tornou-se insuportável. Em 1983, Garrincha morreu de cirrose hepática. Mesmo separada, Elza sofreu muito, e teve que consolar o filho pequeno, que não entendia a ausência do pai. Manteve outros relacionamentos após o divórcio, mas não quis casar-se novamente.