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Literatura

Médica paraense Izabella Cristo vence primeira edição do Prêmio Caminhos de Literatura

Romance escolhido é protagonizado por mulher que vai para a UTI com o filho após parto

Prêmio Caminhos da LiteraturaPrêmio Caminhos da Literatura - Foto: reprodução

Dias atrás, a médica Izabella Cristo desligou o telefone chateada. Notícias ruins no trabalho. Minutos depois, o celular voltou a tocar. Ela não reconheceu o número, mas atendeu mesmo assim. “Ou é spam ou é BO”, pensou.

Do outro lado da linha, um homem se apresentou como Henrique Rodrigues e perguntou se ela era “Izabella Cristo” (o que ela estranhou porque todos a conhecem por seu outro sobrenome, Cunha) e se já tinha algum romance publicado.

Foi aí que a ficha começou a cair. Aquele era o escritor Henrique Rodrigues, criador do Prêmio Caminhos de Literatura, no qual ela havia se inscrito. E Izabella Cristo era seu nome literário. Rodrigues ligava para avisar que ela vencera a primeira edição do concurso. Izabella não segurou as lágrimas.

“Mãezinha”, o romance vencedor, será publicado pela Dublinense. É a história de uma mulher que, após um parto prematuro, acaba em uma unidade de terapia intensiva junto com o filho. Por ser médica, a personagem acredita estar no controle da situação, mas descobre a angústia que é estar no papel de paciente.

Ao Globo, Cristo adiantou que a narrativa é “ácida” e narrada na segunda pessoa. A protagonista dirige-se a si mesma alternando entre o você e o tu (muito usado pelos paraenses).

Assim como sua protagonista, Izabella é paraense e médica, especializada em cirurgia do aparelho digestivo e coloproctologia.

— De manhã estou abrindo barriga e de noite abrindo livro — brinca ela, que hoje vive em São Paulo.

“Mãezinha” originalmente se chamava “Mãe de UTI” e foi escrito durante a pós-graduação em escrita criativa que Izabella cursou no Instituto Vera Cruz, na capital paulista.

Antes do prêmio, ela andava cogitando a autopublicação devido à dificuldade de acessar as editoras. Agora, prestes a ser publicada, descreve o Caminhos da Literatura como “uma oportunidade única, uma grande honra”.

Ao todo, o Prêmio Caminhos de Literatura teve 342 inscrições. Eram elegíveis obras de autores residentes do Brasil, maiores de 18 anos e que nunca tivessem publicado um romance. Uma comissão formada por seis pessoas, como a curadora da Flip Ana Lima Cecilio e o escritor Carlos Eduardo Pereira, selecionou as 20 melhores obras.

A escolha do vencedor ficou a cargo dos escritores Marcelo Moutinho e Micheliny Verunschk. “Mãezinha” chamou atenção de Moutinho “pelo trabalho cuidadoso com a linguagem e pela maturidade narrativa da autora, que transita entre a ironia e a crueza, lançando mão de diferentes registros: verbetes, cartas, apontamentos”, diz ele.

O curador elogia o romance de Cristo como “incrivelmente bem escrito e com temática muito relevante”. E acrescenta que, ao relevar uma paraense, o prêmio pode “estimular escritoras do Norte a ocuparem mais a cena literária brasileira”.

Rodrigues era responsável pelo Prêmio Sesc (que revelou vários talentos da literatura brasileira) até o início deste ano, quando foi demitido após acusar a instituição de tentativa de censura e de boicotar a promoção do livro “Outono de carne estranha”, de Airton Souza, que havia vencido o concurso e narra o amor e o sexo entre garimpeiros. Ele afirma que “garantir a liberdade expressiva dos participantes” é uma das “diretrizes” do Caminhos de Literatura.

“Mãezinha” será lançado oficialmente em maio do ano que vem, na edição comemorativa de 20 anos do Festival Literário Internacional de Poços de Caldas. Mas Izabella começa sua vida de escritora já no mês que vem. No dia 17 de novembro, ela participa de uma mesa sobre prêmios literários na Festa Literária Internacional de Pernambuco (Fliporto), em Olinda. Além da publicação do romance, o Prêmio Caminhos de Literatura inclui uma mentoria coordenada por Rodrigues sobre carreira e mercado literário. A vencedora já sabe que dúvidas pretende tirar com o curador:

— Quero aprender a me vender sem me vender — diz ela, que assume ter dificuldades para usar as redes sociais profissionalmente.

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