Música e eleições: como se faz um jingle de sucesso para campanha
Candidatos têm investindo para conquistar cadeiras nas prefeituras e câmaras municipais neste ano: o brega-funk e a piseiro
Eleições, especialmente as municipais, não são movidas por um consenso. Mas no pleito de 2020, esquerda e direita, rivais históricos e bandeiras políticas de distintas filosofias se uniram em centenas de cidades brasileiras por causa de uma música. O jingle genérico “O Homem Disparou”, da banda pernambucana Vilões do Forró com César Araújo, tem entoado as campanhas políticas de diferentes partidos, consolidando-se como o maior sucesso das eleições deste ano. A música, que é uma pisadinha, sintetiza o estilo que os candidatos têm investindo para conquistar cadeiras nas prefeituras e câmaras municipais neste ano: o brega-funk e a piseiro, dois dos gêneros musicais mais populares do País, segundo as plataformas digitais.
O sucesso da banda pernambucana, originada em Arcoverde, no Sertão, veio como uma estratégia para superar a crise causada pela pandemia. O fechamento de casas noturnas e o cancelamento de eventos deixaram o empresário Patrício da Costa, que tem o escritório no Recife, sem solução para gerar renda. Como sabia que era ano de campanha eleitoral, o paraibano decidiu fazer um disco com músicas genéricas para candidatos, já que o período que antecedeu o dia 27 de setembro não permitia que fossem divulgadas músicas em apoio político a concorrentes.
Como resultado, saiu a primeira música “Nunca foi sorte, sempre foi Deus”, que veio aquecer o próximo sucesso “O Homem Disparou”. “Gravamos um clipezinho, com esperança de sobreviver com o jingle e acabamos estourando. Já usamos a música em mais de 200 municípios brasileiros. Minas Gerais, Goiás, Pará e Maranhão são os estados que mais pediram uma versão da música”, conta Patrício, que nasceu na Paraíba, mas mora no Recife há 20 anos, local que sedia a empresa e uma casa de shows. O sucesso foi tão grande, que tem embalado vídeos nas redes sociais do candidato democrata Joe Biden, nas eleições dos Estados Unidos. A música ainda conta com a versão “A mulher disparou” para usar em campanhas femininas.
o_homem_disparou.mp4 pic.twitter.com/N4hzXByXaE — Bob Nunes (@bobdaslabaredas) November 4, 2020
História
Apesar da iniciativa ser inédita - usar uma música genérica para embalar campanhas eleitorais -, ela segue os princípios básicos de um jingle político. Esse tipo de estratégia é utilizada há pelo menos 90 anos, popularizando-se com as campanhas de Getúlio Vargas nos anos de 1930, em conquista de votos brasileiros. “Hinos, marchas, sambas e músicas carnavalescas predominaram entre os gêneros musicais mais utilizados pelos jingles políticos das décadas de 30 a 60. O uso de intérpretes e compositores famosos na elaboração de jingles políticos também foi corriqueiro neste período, alguns deles faziam suas obras declaradamente outros utilizavam de artifícios como pseudônimos”, diz o cientista social e professor da UFBA Luiz Carlos Lourenço, no artigo “Jingles Políticos estratégia, cultura e memória nas eleições brasileiras”.
De lá para cá pouco mudou. Se em meados do século passado eram utilizadas músicas de Carnaval, hoje, os principais jingles são ditados pelas plataformas digitais. Gêneros como o brega-funk, pisadinha e frevo são os mais utilizados nestas eleições. “O mercado de jingle político, na minha opinião, mudou pouco nesses anos. A tendência é sempre se procurar a sonoridade que está na moda. Me lembro que no auge de Xuxa e o ilariê na década de 80”, conta Nando Lobo, que atua na produção de jingles, trilhas e spots no mercado publicitário há 40 anos.
“Sempre faço o jingle em cima das informações que as agências me passam. Algumas vezes já vem uma sugestão de letra contendo as ideias centrais da campanha, o número do candidato, o slogan, mas no final sempre tenho a liberdade para a criação, levando em consideração o conhecimento do cliente de seu eleitorado”, enfatiza Nando, afirmando que paródias não são a melhor saída para uma campanha de sucesso.