No Festival de Sundance, a política está novamente em cartaz
Edição de 2025 do principal evento do cinema independente americano, que terá início três dias após a posse de donald Trump, destaca temas como censura a livros, o conflito israel-palestina e uma nova adaptação de 'O beijo da Mulher-Aranha'
Há um momento durante todo Festival de Cinema de Sundance, geralmente quando os fãs de cinema estão caminhando penosamente pela neve fria e granulada em Park City, Utah, quando se perguntam: por que eles fazem isso em janeiro?
E ainda assim, temas atuais — na maioria das vezes de natureza política — têm reflexo não apenas nos filmes exibidos na montanha, mas também nos eventos pela cidade.
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Em janeiro de 2009, multidões se reuniram para assistir à posse de Barack Obama. Em janeiro de 2017, 4 mil frequentadores do festival, incluindo Charlize Theron, Kristen Stewart e Chelsea Handler, marcharam pela Main Street no dia seguinte à posse de Donald Trump.
No ano seguinte, em meio a uma considerável tempestade de neve, Jane Fonda, Gloria Allred e Tessa Thompson reuniram manifestantes com discursos inflamados para coincidir com o aniversário de um ano da presidência do republicano.
A edição de 2025 do Sundance estreará em 23 de janeiro, três dias após Trump tomar posse pela segunda vez, e a programação sugere que a política está na mente dos cineastas deste ano.
Na série documental de cinco partes "Bucks County, USA", Barry Levinson e Robert May analisam de perto duas garotas de 14 anos, melhores amigas apesar de suas crenças políticas opostas, que vivem no epicentro da divisão política do país.
O documentarista Sam Feder estava filmando em Washington na semana passada para "Heightened scrutiny", sobre o advogado da American Civil Liberties Union, Chase Strangio, e sua batalha perante a Suprema Corte pelos direitos dos transgêneros.
"The librarians", de Kim A. Snyder, acompanha os esforços de trabalhadores no Texas, Flórida e outros estados para proteger a democracia em meio a uma onda de proibições de livros, enquanto "2000 meters to Andriivka", de Mstyslav Chernov (de "20 dias em Mariupol") acompanha um pelotão ucraniano em uma missão para libertar uma vila estratégica.
Dois filmes abordam o conflito israelense-palestino de ângulos diferentes: "Coexistence, my ass!" acompanha a comediante israelense Noam Shuster-Eliassi enquanto ela desafia o público quando "a coexistência ilusória pela qual ela passou a vida trabalhando começa a soar como uma piada de mau gosto".
E o fictício "All that's left of you", de Cherien Dabis, conta a história de três gerações de palestinos e como o deslocamento forçado de um avô leva, décadas depois, ao confronto de seu neto com soldados israelenses em um protesto na Cisjordânia.
"Sempre olhamos para nossos artistas para compartilhar seus pontos de vista e para que eles inspirem a conversa" diz Kim Yutani, diretor de programação do Sundance.
"À medida que montamos a programação, é sempre sobre o equilíbrio e esse é o nosso trabalho. Deixamos as conversas nas mãos dos artistas e é isso que esperamos que surja, de uma forma realmente produtiva e interessante"
Para equilibrar os temas mais pesados, há um pouco de celebridades e leveza.
O festival descreve "Bubble & Squeak" estrelado por Himesh Patel, Steven Yeun e Dave Franco, como um filme sobre "contrabando de repolhos para uma nação onde repolhos são proibidos".
"If I had legs I'd kick you", distribuído pela A24, é estrelado por Rose Byrne, A$AP Rocky, Conan O'Brien e Danielle Macdonald, a partir da trama de "uma mulher que está lidando com a misteriosa doença de seu filho, seu marido ausente, uma pessoa desaparecida e um relacionamento cada vez mais hostil com seu terapeuta".
Há também o retorno de uma dupla de cineastas que apareceu em Sundance décadas atrás. Justin Lin, mais conhecido pela franquia "Velozes e furiosos", estará de volta a Park City, 23 anos depois de ter exibido "Better luck tomorrow", filme que deu início à sua carreira, no festival.
Seu novo filme, "Last days", foca nos esforços de um missionário fictício para fazer proselitismo de uma tribo isolada na Ilha Sentinela do Norte, no Oceano Índico.
E Bill Condon ("Dreamgirls: Em busca de um sonho) estará de volta à neve 26 anos após estrear "Deuses e monstros", filme estrelado por Ian McKellen que rendeu ao cineasta um Oscar de melhor roteiro adaptado.
Seu novo filme, o musical "Kiss of the Spider Woman" (romance do argentino Manuel Puig já adaptado por Hector Babenco em 1985 como "O beijo da Mulher-Aranha", estrelado por Sônia Braga), traz Jennifer Lopez como Aurora, a mulher de fantasia imaginada por um prisioneiro interpretado pelo ator queer Tonatiuh, com Diego Luna fazendo seu companheiro de cela.
Ambos os filmes estão buscando distribuição — assim como a maioria dos filmes estreando tanto na competição de ficção quanto nas de documentários, e, em sua maioria, de diretores fazendo suas estreias no Sundance.
"Reunimos um grupo de filmes que falam e iluminam o legado e a missão sempre presentes em Sundance, que é a descoberta" comenta Eugene Hernandez, diretor do festival, acrescentando que 41% dos diretores de longa-metragem são estreantes.
"Este é um ano de descobertas, assim como os últimos 41 anos deste festival"
Em paralelo, Sundance se prepara para dizer adeus à sua sede em Park City.
Embora uma nova casa ainda não tenha sido escolhida, o festival sairá da estação de esqui para um dos três novos locais: Salt Lake City (com exibições auxiliares ainda ocorrendo em Park City); Boulder, Colorado; ou Cincinnati, a partir de 2027.
O local escolhido será determinado no final do inverno ou início da primavera.