Novos emojis refletem mudanças sociais, incluindo homem trans grávido e mãos com 25 tons de pele
Pesquisador diz que emojis refletem a sociedade. Popularidade das figuras vai de traduções da bíblia a leituras sexuais
Se você vem acompanhando o choque geracional em torno do termo cringe, já sabe que a Geração Z cancelou o emoji da risadinha com lágrimas — muito usado entre os millennials — e o substituiu por símbolos como a caveira (para dizer algo como “morri”). Emojis devem ser usados de forma irônica ou a pessoa é anciã, ou melhor, cringe, de acordo com a ditadura adolescente do TikTok. Mas os que entendem o peso que essas representações gráficas têm nas novas formas de comunicação avisam que, mais do que nunca, é preciso deixar esse embate restrito a gladiadores virtuais para se concentrar na evolução dos emojis. A troca de figurinhas importa.
Cada vez mais populares num mundo em que precisamos expressar ideias e emoções virtualmente, claramente e sucintamente, os ícones coloridos são um reflexo de uma era sem tempo para textão. Estudo da Adobe mostrou que 88% dos usuários globais sentem mais empatia por quem usa emojis. Só no Facebook são postados cinco bilhões de emojis por dia. Sempre que eles mudam de cara — e os teclados verão uma renovação significativa nos próximos meses — a discussão sobre a relevância dos pictogramas ganha força. Ser cringe ou não é o de menos.
Uma série de novos emojis acaba de ser aprovada pelo Unicode Consortium, organização do Vale do Silício que aprova os ícones para padronização nos sistemas operacionais iOS e Android. Qualquer pessoa pode enviar sugestões de um novo emoji, mas quem bate o martelo uma vez por ano é o Unicode, formado por representantes dos gigantes da tecnologia. O novo conjunto (versão 14.0) tem 838 novos caracteres, entre eles 37 emojis inéditos que agora serão implementados pelas empresas para que estejam disponíveis até o fim do ano.
Entre as opções de gravidez, por exemplo, não há mais a limitação de gênero. O Unicode aprovou a figura de um homem trans e de uma pessoa não binária grávidos. Carinhas da realeza também vão contar com diferentes representações étnicas, além do gênero neutro, para ir além do “príncipe” e da “princesa”. A diversidade foi bastante expandida no ícone do aperto de mão, com 25 opções de tons de pele. A lista e suas possíveis mensagens — o novo emoji do coral vai certamente ilustrar as conversas sobre aquecimento global — já estão atualizadas na Emojipedia, catálogo on-line das figurinhas.
"A nova lista é incrível, principalmente se considerarmos o tempo e o esforço gastos no processo de seleção numa pandemia. Os novos emojis são um grande reflexo de como as coisas evoluíram quando se trata de diversidade e inclusão", comemora Melissa Thermidor, diretora de Programas da Open University e membro da Emojination, organização criada há cinco anos para brigar por maior representatividade da linguagem eletrônica.
O lema do Emojinajon é: “Emoji para o povo, pelo povo”. Entre as campanhas vitoriosas do grupo está a aprovação do emoji com hijab para simbolizar os 550 milhões de mulheres muçulmanas que usam o véu no planeta. Até 2017 esse símbolo de identidade religiosa não poderia ser usado num smartphone. Só entrou no Unicode depois que uma saudita de 15 anos, Rayouf Alhumedhi, inconformada por não poder usar nos chats uma figura com a qual se identificasse, lançou a candidatura do desenho.
"Os emojis refletem as mudanças na sociedade, nossas aspirações e o que queremos comunicar", reconhece o professor Mark Brill, da Escola de Games, Filme e Animação da Universidade de Birmingham, lembrando que durante a pandemia a Apple adaptou o emoji da seringa, removendo a gota de sangue para representar a vacina. "São uma forma de comunicação universal legítima. Vieram para ficar".
Nascido no final da década de 90 no mercado japonês, o emoji se transformou em padrão global digital em 2010, quando o Unicode disponibilizou a primeira lista padronizada. Em 2015, o emoji “chorando de rir” foi escolhido a “palavra” do ano pelo Dicionário Oxford. No mesmo ano vieram as novas representações de gênero para incluir famílias homoafetivas. Desde então o fenômeno só cresceu, independentemente dos comportamentos geracionais nas redes. Até a Bíblia já ganhou tradução com emojis, e nos e-mails corporativos não é mais tabu usar as carinhas.
Para Brill, não é surpresa ver emojis servindo de munição para uma batalha entre diferentes faixas etárias. Os símbolos são naturalmente apropriados de diferentes maneiras por comunidades distintas. O emoji da berinjela é um exemplo clássico da figura inocente que acabou ganhando conotação sexual na cultura digital — coisa que talvez os mais velhos ainda não tenham entendido.
"Essas divisões entre gerações sempre existiram. Quando eu era adolescente, não queria ouvir as músicas que meus pais ouviam. Hoje as redes sociais são só mais uma arena para esse embate", acredita Brill, que pesquisa os emojis há uma década.
Além dos inevitáveis confrontos — alguns divertidos, convenhamos — estudiosos se debruçam sobre as representações gráficas como um meio poderoso de expressão emocional. Campos distintos de pesquisa, da ciência da computação à linguística e à psicologia, vêm avaliando como os emojis aumentam nossa capacidade comunicativa não verbal. Já podemos, portanto, defini-los como arma política?
"Não diria que é uma ferramenta política, mas um reflexo de identidades, o que é necessário. Emojis são onipresentes e, como tal, devem refletir a sociedade. Representação é importante e as pessoas querem ser vistas", diz Melissa Thermidor, do Emojination, que gostaria de ver na próxima leva o ícone do submarino, que tem vários significados, entre eles, “afundar”.