"Nunca mais nos separamos": Xande de Pilares fala da amizade com Anderson Leonardo, do Molejo
O cantor, de 51 anos, realizava tratamento contra câncer inguinal, considerado raro, e estava sob supervisão médica em UTI de hospital. O artista morreu na última sexta-feira
O cantor Xande de Pilares foi um entre as dezenas de amigos que acompanham o velório de Anderson Leonardo, do Molejo, realizado neste domingo. O sambista morreu na última sexta-feira em decorrência de um câncer, o qual lutava desde 2022. No início desta tarde, o artista falou da amizade de décadas que tinha com Anderson, quando se conheceram em Pilares, bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro.
Com os lábios trêmulos, Xande lembrou da relação que tinha com Anderson desde a infância.
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— Quando fui morar em Pilares, eu tinha 11 anos. Ele foi a primeira pessoa que conheci. Eu sempre gostei de brincar, e ele entrou no meio da molecada e nunca mais nos separamos. Depois ele começou a tocar cavaquinho, eu também comecei — disse, emocionado. — Quando saía um disco, a gente disputava quem aprendia mais rápido. Eu, às vezes, levava um dia ou dois. O Anderson aprendia em meia hora.
Fãs, parentes e amigos se despedem do cantor no Cemitério Jardim da Saudade, em Sulacap, Zona Oeste do Rio, onde o velório é realizado desde as 11h, quem compareceu presta homenagens ao sambista e destaca seu legado para a música no país. O cantor Mumuzinho falou sobre o amigo e ídolo e dos aprendizados.
— O Anderson era um pilar do samba e do pagode. O Anderson e o Molejo deixam um legado absurdo. Ele fez parte de uma geração que formou muitos artistas que pegaram um pouco do conhecimento dele. Acabei de chegar de viagem e não podia deixar de prestar minha homenagem. Eu queria ter aprendido mais com ele. Ele era a alegria em pessoa — conta Mumuzinho.
Mumuzinho também enviou uma das coroas de flores como forma de homenagem. O cantor ainda lembrou da proximidade que tinha com Anderson e do que significa a perda do artista, aos 51 anos.
— Ainda não caiu a ficha. Um cara que vai deixar muita saudade. Sou muito grato, aprendi muito com ele. Ele era muito generoso — diz. — O Anderson sempre foi a mesma pessoa. Mesmo no auge do sucesso, sempre foi um cara simples.
Anderson, que morreu em decorrência de um câncer na última sexta-feira, o qual enfrentava desde 2022, foi lembrado como uma pessoa alegre e cheia de projetos na música. O grupo, que estourou com hits lembrados — cantados e dançados — até hoje.
Integrantes do Molejo e da produção do grupo também participam do velório. Ao lado dos amigos, Andrezinho falou sobre Anderson, tanto na rotina do trabalho como na relação de amizade construída há décadas, desde a infância.
— Todos nós não queríamos estar nesse lugar, nesse momento, com essa situação. Molejo é sinônimo de alegria, muito mais representado pelo nosso cantor, o Anderson. A situação é um pouco, realmente, difícil, mas a gente tem que, óbvio, mesmo na adversidade, sempre lembrar que o Molejo é um grupo que leva alegria para as pessoas, para o público que gosta das músicas. E o Anderson é a representatividade disso num contexto geral. Então, nós estamos tristes. Todos nós com o coração apertado, nossos familiares, nossos fãs, todos nós do grupo, pessoal de equipe, toda a produção, mas não podemos deixar de lembrar que o Anderson é a alegria personalizada. Como pessoa ele conseguiu transmitir isso com a gente, no trabalho que nós desenvolvemos juntos desde o início — conta Andrezinho.
Projeto inédito a ser lançado
Nascido e criado na Zona Norte do Rio, Anderson viveu cercado pelo samba. Um de seus melhores amigos de infância era Andrezinho, filho do ex-diretor de bateria da Mocidade Independente de Padre Miguel, Mestre André.
No começo dos 90, Anderson e Andrezinho (surdo e vocal) assumiram a banda criada por Bira — produtor musical e pai do cantor — e se juntaram a Claumirzinho (pandeiro e vocal), Lúcio Nascimento (percussão e vocal), Robson Calazans (percussão e vocal) e Jimmy Batera (bateria). Orientados por Bira — que mais tarde também produziria grupos como Revelação, Exaltasamba, Pixote —, misturaram o samba-pop e bem-humorado dos Originais do Samba com as inovações introduzidas no samba de raiz pelo grupo Fundo de Quintal.
No velório, Andrezinho falou sobre o projeto inédito, ainda sem data de lançamento, gravado no ano passado com participações especiais.
— "Paparico do Molejo" que nós gravamos. Gravamos com participações, vários amigos que foram criados com a gente, criados com o Anderson, como Xande de Pilares, Dudu Nobre, Thiaguinho. Tivemos um problema de logística no dia oficial da gravação com a chuva, tempestade. Passamos para o segundo dia e todos os artistas se prontificaram a ficar para poder participar do segundo dia de gravação, e, graças a Deus, foi muito bom — lembra Andrezinho.
Ao lado dos demais integrantes do grupo, que acompanham o velório, ele falou sobre a espera para lançar o trabalho inédito:
— É um projeto que nós estamos guardando com o maior carinho do mundo para quando estiver tudo bem certinho, tudo bem tranquilo, no momento certo vai ser colocado para todo mundo curtir também. Porque era um sonho dele fazer o "Paparico do Molejo", e nós conseguimos fazer. Daqui a pouco estará nas ruas aí para todo mundo curtir — diz.
Em fevereiro do ano passado, a página oficial do Molejo no Facebook compartilhou um trecho da gravação do projeto. O texto da publicação destacou o imprevisto por conta do tempo chuvoso no dia anterior e a conclusão do trabalho com todo o apoio recebido.
"Ainda em êxtase depois de tudo que passamos no dia que reservamos para gravação e por motivo da tempestade que caiu em Niterói não foi possível realizar nossa gravação, mas Deus sabe todas as coisas e nos deu um sábado lindo para ser eternizado", diz trecho da publicação.
Bira, em cadeira de rodas e visivelmente abalado, cumprimentou os fãs e falou com a imprensa durante o velório.
— Para mim, que sou pai, perder um filho… estou muito abatido — diz. — A gente está muito baqueado. Não é fácil. É uma perda muito grande. Um dos maiores artistas do país partiu, mas deixou um bom legado. Vamos agora agilizar para lançar o projeto "Paparico", para que não caia no esquecimento.
O trabalho foi gravado no início do ano passado, enquanto Anderson estava em tratamento contra o câncer. Ao menos 13 artistas participam com releituras e músicas inéditas.
— O Anderson sempre será um artista muito virtuoso. Ele teve a ideia de fazermos esse trabalho, parece que já estava se preparando — diz o pai do cantor.
Fãs fazem homenagens
O velório do cantor Anderson Leonardo é realizado no Cemitério Jardim da Saudade, em Sulacap, Zona Oeste do Rio, desde as 11h deste domingo (28). O artista morreu nesta sexta-feira (26), aos 51 anos, por consequência de um câncer na região inguinal.
Apesar do sol forte e das altas temperaturas, antes do início do velório, uma fila já se formava do lado de fora da capela, com pessoas prestando homenagens e cantando músicas do grupo. Algumas até imitavam coreografias.
Entre os fãs que puxavam o coro e as palmas estava Rosane Brito Gomes, de 57 anos, moradora de Pedra de Guaratiba, também na Zona Oeste da cidade, para acompanhar o velório.
— O Anderson é meu amor. Eu conhecia os meninos da banda, já até me botaram no palco. Eu sou fã desde que eles eram pequenos, nos anos 90, quando eu frequentava os bailes e as rodas de samba — conta a carioca. — Ele iria querer música e alegria nesse momento. Agora ele está no andar de cima cantando e tocando o cavaquinho dele.
O fã Reginaldo Reis, de 61 anos, que acompanhou o grupo Molejo desde o início da carreira, trouxe flores para a despedida do ídolo.
— É um domingo triste, uma despedida dura. Mas vamos seguir vivendo, sem solidão — afirmou.
Um dos grupos mais famosos e irreverentes do pagode dos anos 1990, o Molejo estourou grandes hits em todo o país, como "Cilada", "Caçamba", "Brincadeira de Criança", "Dança da Vassoura", "Paparico" e "Clínica Geral".