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Príncipe Harry vai depor contra jornal, e família real se prepara para novas controvérsias

Caçula do rei processa o Mirror por supostamente ter grampeado seu telefone nos anos 2000, e será o primeiro integrante de sua família a prestar depoimento desde o século XIX

Príncipe HarryPríncipe Harry - Foto: Ben Stansall / POOL / AFP

O longo e amargo imbróglio do príncipe Harry com os tabloides britânicos terá um novo capítulo nesta semana: o filho rebelde do rei Charles III prestará depoimento em um tribunal londrino na terça-feira (6), parte do processo que move contra o grupo editorial Mirror. O duque de Sussex, título real do 5º na linha de sucessão ao trono, acusa a publicação de ter grampear seu celular há mais de uma década.

Um filho da Casa de Windsor prestar depoimento é por si só um marco: será o primeiro integrante da realeza britânica a fazê-lo desde o século XIX. E seus parentes não devem gostar muito disso.

Harry pode enfrentar perguntas embaraçosas sobre sua vida pessoal antes de conhecer sua mulher, Meghan, além de indagações sobre sua relação com outros integrantes da família real. Desde que o casal abandonou suas funções reais em 2020, mudou-se para a Califórnia, deu uma explosiva entrevista à apresentadora Oprah Winfrey acusando parentes de racismo e lançou uma autobiografia e uma docussérie na Netflix. A má relação com o rei Charles III e o príncipe William é notória.

Historicamente, membros da realeza britânica preferiram selar acordos para resolver seus problemas judiciais a se submeterem ao escrutínio de um tribunal. William, por exemplo, optou por esta via após acusar o News Group, conglomerado do magnata australiano Rupert Murdoch, de grampear seu telefone, recebendo "uma grande quantia de dinheiro", afirmou seu irmão mais novo em documentos apresentados à Justiça no início deste ano, referentes a um caso paralelo.

Quem também optou por um acordo foi o príncipe Andrew, o terceiro dos quatro filhos da rainha Elizabeth II, mas para escapar do banco dos réus. Em fevereiro do ano passado, pagou dezenas de milhares de dólares para a advogada Virginia Giuffre, à época com 38 anos. O nobre era acusado de ter abusado sexualmente da mulher há mais de duas décadas, quando ela tinha apenas 17 anos.

Até o momento, Harry não dá indícios de que planeja desistir de suas acusações contra o Mirror, e parece transformar a cruzada contra os tabloides britânicos em uma das bandeiras da sua vida pública. Ele diz responsabilizar os jornais pela morte de sua mãe, a princesa Diana, em um acidente em 1997 após ser perseguida por fotógrafos.

Além do Mirror, Harry processa o News Group, responsável pelos jornais The Sun e The Times, e contra a editora responsável pelo Daily Mail. O príncipe também processa o Ministério do Interior britânico, o Home Office, por remover sua proteção policial após ele e Meghan romperem com a monarquia.

Em uma carta para os editores dos tabloides em abril de 2020, o casal acusou os veículos de irresponsabilidade, afirmando que destroem a vida das pessoas "sem razão alguma, além de o fato das fofocas obscenas impulsionarem a receita publicitária".

O processo contra o Mirror é focado nas acusações de que o jornal grampeou o celular de Harry, além dos aparelhos de seu irmão, assessores e de uma ex-namorada durante o início dos anos 2000. O príncipe é um dos quatro reclamantes — entre eles dois atores que participaram da popular série de televisão britânica, Coronation Street.

Advogados do Grupo Mirror afirmam que Harry e os outros três co-autores esperaram demais para apresentar o processo, referente a incidentes que ocorreram entre 1991 e 2011. O Mirror admitiu em 2014 que grampeou os aparelhos, e em fevereiro do ano seguinte publicou uma desculpa em sua primeira página aos prejudicados pela ação.

O julgamento promete ser um espetáculo midiático, pondo os holofotes na vida de solteiro do príncipe antes de casar e ter filho — ele e Meghan tem um menino, Archie, de 4 anos, e uma menina, Lilibet, de 2 anos. Entre os nomes nos autos está o de sua ex-namorada, Chelsy Davy.

Em um documento, David Sherborne, um dos advogados do príncipe, disse que detalhes obtidos das mensagens de voz que Harry deixou para Davy geraram matérias invasivas, que prejudicaram o relacionamento dos então namorados.

Em uma ocasião, houve uma série de ligações estranhas para o celular de Davy em setembro de 2009. Dentro de alguns dias, dois jornais do Grupo Mirror publicaram as manchetes "Chelsy's Harry'd Enough" — um trocadilho do nome do príncipe com a a expressão "Chelsy's Had Enough", algo como "Chelsy está de saco cheio" — e "Chelsy Breakup 'Was on Cards'", ou "A separação de Chelsy é provável". Ambos discutiam as minúcias do rompimento iminente do relacionamento.

Apesar de tomarem medidas extremas para manter os detalhes de suas vidas privadas sob sigilo — medidas que incluíam fazer Davy viajar com um pseudônimo — o advogado de Harry afirmou que repórteres com frequência apareciam nos lugares onde o casal combinava de se encontrar.

"Isso fez com que o casal perdesse a confiança em vários amigos e pôs o relacionamento sob intensa pressão", escreveu Sherborne, afirmando que a situação causou "grande angústia e vergonha" no príncipe. As preocupações, afirmou a defesa, incluíam também questões de segurança.

Além de argumentar que Harry demorou demais para abrir o processo, o Mirror questiona a acusação de que hackeou o celular de Davy. Os advogados do tabloide afirmam que as ligações estranhas provavelmente foram feitas para que a mulher comentasse as notícias de que o fim do relacionamento do casal era iminente.

Em 2009, funcionários de um outro jornal, o News of the World, de Murdoch, receberam penas de prisão por grampear telefones. De acordo com os advogados do Mirror, isso por si só faz ser improvável que os jornalistas corressem o risco de interceptar as ligações de Harry ou sua então namorada.

O depoimento de Harry também pode ser comprometedor para Piers Morgan, que antes de se tornar uma figura notória na televisão britânica, foi editor do Daily Mirror de 1995 a 2004, período em que os grampos supostamente ocorreram. Morgan há anos nega qualquer envolvimento em atividades irregulares ou ordens para que pautas baseadas em tais materiais fossem produzidas.

Os advogados do príncipe, por sua vez, dizem ser improvável que os grampos ocorressem sem o consentimento de Morgan, que se tornou nos últimos anos um crítico ferrenho de Harry e Meghan. Quando perguntado recentemente por um repórter da emissora ITV sobre o julgamento, ele afirmou:

— Eu não irei aceitar receber aulas sobre invasão de privacidade do príncipe Harry, alguém que passou os últimos três anos cruel e cinicamente invadindo a privacidade da família real para seu vasto ganho comercial, e falou um monte de mentiras sobre ela — disse ele.

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